Buscando convergências entre valores e práticas pedagógicas : o ensino de ciências em um ciclo de pesquisa-ação na escola em uma prisão

Abstract

As constantes violações de direitos humanos nas penitenciárias do Brasil contribuem para a reprodução das desigualdades e para o aumento dos casos de violência na sociedade. Nesse cenário opressor, ações educativas, ainda que não sejam isoladamente a solução paras as inúmeras contradições desse sistema, podem exercer um papel fundamental na emancipação dos sujeitos privados de liberdade e, consequentemente, contribuir para a promoção de uma sociedade menos violenta e desigual. Inserido nesse contexto, a presente dissertação descreve as primeiras ações de uma pesquisa-ação que busca a incorporação de valores emancipatórios nas práticas educativas do Núcleo Estadual de Educação de Jovens e Adultos Nelson Mandela, da Penitenciária Estadual de Canoas. Essa investigação foi dirigida pela seguinte questão de pesquisa: Que ações podem contribuir para a incorporação de valores alinhados com uma educação emancipatória às práticas pedagógicas desenvolvidas para pessoas em privação de liberdade? Para alcançar esse objetivo, foram mobilizados os ideais freireanos de educação, legitimados pelo pesquisador e pelos educadores da escola, e a pesquisa-ação de John Elliott, cuja estratégia se fundamenta na constante avaliação crítica da prática; no debate horizontal e amplo entre os membros do grupo participante; na mobilização de novas aprendizagens relevantes ao contexto; e na proposição e implementação de novas ações. Embora o surgimento da pandemia de COVID-19 tenha afetado fortemente o andamento da pesquisa, de modo que ainda não conseguimos finalizar o primeiro ciclo de atividades, foi possível a realização parcial de ações com o grupo docente da escola, com a finalidade de promover a adoção de práticas interdisciplinares e emancipatórias no retorno das aulas presenciais, quais sejam: a implementação de um trabalho colaborativo com estudantes da UFRGS por meio de um projeto de extensão; realização de dezenas de encontros virtuais para discussões teóricas e práticas a respeito de tópicos relacionados à educação em prisões, e de estratégias pedagógicas; e o desenvolvimento de um Recurso Educacional Aberto (REA) interdisciplinar, que aborda de forma crítica as dimensões científica, tecnológica e social a respeito do tema “Alimentação”, que está alinhado à filosofia do Conhecimento Livre, e que integra elementos emancipatórios. Nesse REA, foram construídas uma apostila com textos introdutórios a respeito do tema; e uma horta portátil automatizada, com a intenção de trazer a materialidade de novas visões de mundo e vivências, que provoquem o afastamento, mesmo que temporário, entre o educando e a sua realidade imediata. Os resultados parciais desse primeiro ciclo de pesquisa-ação indicam que, apesar de ainda não termos implementado as atividades construídas nas aulas da escola, o diálogo entre escola e universidade no delineamento de práticas interdisciplinares pautadas por REA e dirigidas por ideais freireanos se mostrou frutífera para que valores alinhados com uma educação emancipatória fossem incorporados às ações planejadas na escola em uma prisão.

The constant violations of human rights in prisons in Brazil contribute to the reproduction of inequalities and to the increase in cases of violence in society. In this oppressive scenario, educational actions, although not alone the solution to the numerous contradictions of this system, can play a fundamental role in the emancipation of subjects deprived of liberty and, consequently, contribute to the promotion of a less violent and unequal society. Inserted in this context, the present dissertation describes the first actions of a action research that seeks the incorporation of emancipatory values in the educational practices of the Núcleo Estadual de Educação de Jovens e Adultos Nelson Mandela, of the Penitenciária Estadual de Canoas. This investigation were guided by the following research question: What actions can contribute to the incorporation of values aligned with an emancipatory education to the pedagogical practices developed for people in deprivation of liberty? To achieve this goal, we mobilize the freirean ideals of education, legitimated by the educators of the school, and John Elliott's action research methodology, whose strategy is based on constant critical evaluation of practice; in the horizontal and broad debate among the members of the participating group; in mobilizing new context-relevant learning; and in proposing and implementing new actions. Although the emergence of the COVID-19 pandemic has strongly affected the progress of the research, so that we have not yet been able to complete the first cycle of activities, it was possible to partially carry out actions with the school's teaching group, in order to promote adoption of interdisciplinary and emancipatory practices in the return of in-person classes, namely: the implementation of a collaborative work with the UFRGS students through an extension project; dozens of virtual meetings for theoretical and practical discussions about topics related to education in prisons, and pedagogical strategies; and the development of an interdisciplinary Open Educational Resource (OER), which critically addresses the scientific, technological and social dimensions of the theme “Food”, is in line with the philosophy of Open Knowledge, and integrates emancipatory elements. In this OER, a booklet with introductory texts on the subject was built; and an automated portable vegetable garden, with the intention of bringing the materiality of new worldviews and experiences, which cause a separation, even if temporary, between the student and his immediate reality. The partial results of this first cycle of action research indicate that, although we have not yet implemented the activities built in the school's classes, the dialogue between school and university in the design of interdisciplinary practices guided by OER and guided by Freirean ideals proved to be fruitful, so that values aligned with an emancipatory education were incorporated into the actions planned in a prison school.