A interseccionalidade na agenda governamental do município de São Paulo : análise a partir das políticas públicas de soberania e segurança alimentar e nutricional de 2013 a 2023

Abstract

O levantamento sobre a Insegurança Alimentar e Nutricional (InSAN) do município de São Paulo (MSP) demonstrou que a parcela de pessoas em maior vulnerabilidade é aquela que sofre ao mesmo tempo opressões de gênero, raça e classe, a partir do recorte interseccional. A interseccionalidade introduzida no contexto norte-americano, foi amplamente explorada no Brasil por Lélia Gonzalez. Ao abordar as opressões de forma integrada, a interseccionalidade é um instrumento essencial para formulação de políticas públicas que enfrentam desigualdades estruturais. Assim, se reconhece o desafio do MSP em formular e implementar políticas de SSAN considerando a interseccionalidade. Para que essa abordagem esteja efetivamente incorporada às políticas municipais, é fundamental que o tema seja incluído na agenda de políticas públicas. Na teoria de formação de agenda de políticas públicas de John Kingdon, mudanças ocorrem quando os fluxos de problemas, soluções e político convergem, abrindo janelas de oportunidade para tal mudança. Este estudo teve como objetivo mapear políticas públicas de SSAN no MSP entre 2013 e 2023, analisando como a interseccionalidade é incorporada à agenda municipal; especificamente, mapearam-se as políticas públicas municipais de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional de 2013 a 2023; identificou-se como a SSAN entrou nas agendas pública e governamental de SP; e analisou-se o tratamento dado à interseccionalidade dentro das políticas públicas de SSAN. Em termos metodológicos, foi realizada pesquisa documental, levantamento de dados secundários, entrevistas semiestruturadas com pessoas relacionadas à prefeitura municipal, observação participante na conferência municipal de SAN de 2023 e registro em diário de campo. Os resultados apontam que, durante a gestão Haddad (2013-2016), a SSAN ganhou força ao ser incorporada à agenda eleitoral pela participação social e, posteriormente, incorporada em políticas e ações, enfrentando disputas e avanços durante esse processo. Já na gestão Doria (2017-2018), a tentativa de introduzir uma farinata como solução para a população em situação de rua causou controvérsia e só foi barrada graças à atuação do Conselho Municipal de Segurança Alimentar, que mobilizou a opinião pública e a agenda midiática. Sob a gestão Covas (2018-2021), muitas produções, como planos, foram lançadas, e a gestão foi apontada como sensível ao tema da SSAN. Já na gestão Nunes (2021-2024) houve um esforço para consolidar as ações de SSAN na recém-criada Secretaria Executiva de Segurança Alimentar e Nutricional e Abastecimento, ao mesmo tempo em que se ampliou o apoio à agricultura. A interseccionalidade está presente em conselhos e órgãos municipais voltados à SSAN, sensibilizando gestores e políticas para as formas de opressão imbricadas, contudo, permanece como em ações pontuais dentro de agendas mais amplas, já que é possível afirmar que a interseccionalidade se faz presente na agenda decisória de algumas políticas, mas não é um tema central na governamental. O MSP apresenta avanços significativos em políticas interseccionais, mas enfrenta desafios para ampliar sua abrangência e garantir direitos básicos a mais pessoas.

The municipality of São Paulo (MSP) is recognized for its magnitude and territorial diversity, which creates certain complexities in implementing public policies related to Food and Nutrition Sovereignty and Security (FNSS). This vastness also increases the vulnerability of specific social groups. The assessment of Food and Nutrition Insecurity in the municipality revealed that the most vulnerable population is composed of those facing overlapping oppressions based on gender, race, and class, according to an intersectional perspective. Intersectionality, introduced in the North American context and widely explored in Brazil by Lélia Gonzalez, is an essential tool for developing public policies aimed at addressing structural inequalities. Thus, the challenge for MSP lies in formulating and implementing FNSS policies while considering intersectionality. To effectively incorporate this approach into municipal policies, it is crucial to include the topic in the public policy agenda. According to John Kingdon's agenda-setting theory, changes occur when the streams of problems, solutions, and politics converge, opening windows of opportunity for transformation. This study aimed to map FNSS public policies in MSP from 2013 to 2023, analyzing how intersectionality has been incorporated into the municipal agenda. Specifically, it mapped municipal FNSS policies from 2013 to 2023, identified how FNSS entered the public and governmental agendas of São Paulo, and examined how intersectionality has been addressed within FNSS policies. Methodologically, the study employed documentary research, secondary data collection, semi-structured interviews with municipal government representatives, participant observation at the 2023 Municipal Food Security Conference (MFSC), and field diary records. The results indicate that, during Fernando Haddad's administration (2013–2016), FNSS gained prominence through social participation, eventually being incorporated into policies and actions despite facing challenges and advancements. During João Doria's administration (2017–2018), the proposal to introduce farinata as a solution for the homeless population sparked controversy and was only halted due to the actions of the Municipal Council for Food Security, which mobilized public opinion and the media agenda. Under Bruno Covas's administration (2018–2021), several initiatives, including action plans, were introduced, and the administration was perceived as sensitive to FNSS issues. During Ricardo Nunes's administration (2021–2024), efforts focused on consolidating FNSS initiatives within the newly created Executive Secretariat for Food and Nutrition Security and Supply, alongside increased support for urban agriculture. Intersectionality is present in municipal councils and bodies related to FNSS, raising awareness among policymakers about overlapping forms of oppression. However, it remains limited to specific actions within broader agendas. While intersectionality appears in the decision-making agenda of some policies, it has not become a central theme in the governmental agenda. MSP has made significant progress in developing intersectional policies but continues to face challenges in expanding their scope and ensuring basic rights for a larger number of people.