Cartografias narrativas do habitar-rua : uma reflexão sobre a dimensão pública do espaço urbano

Abstract

Inspirada na narrativa como perspectiva teórico-metodológica, esta dissertação busca problematizar a dimensão pública do espaço urbano a partir da narratividade das pessoas em situação de rua. Entendendo que o público é sempre plural, que está em permanente confronto e que toda a ordem política é baseada em alguma forma de exclusão, reconhece-se como necessária a escuta e o encontro com esse modo de viver na cidade, por se apresentar dissensual e à margem das ações de projeto e planejamento urbano. O ponto de partida do território da pesquisa é a região central de Porto Alegre, e o processo metodológico da cartografia define a conexão entre a experiência do pesquisador no espaço público e os participantes. Através do registro das cenas acompanhadas e dos encontros vivenciados com o habitar-rua, a narrativa intermedia a produção de conhecimento e a experiência em campo. Assim, a narratividade expressa pelas pessoas em situação de rua, corporificadas por suas ações de habitar, anunciam a heterogeneidade desse modo de vida na cidade provocando um conflito na dimensão pública do espaço urbano. Destaca-se ações da sociedade e dos agentes do Estado que buscam apagar a agência política dessa população, as dissonâncias entre as experiências urbanas de quem habita a rua e de quem habita uma residência como referência domiciliar, e o tensionamento na dicotomia público-privado. Como observações finais advindas do processo de pesquisa, realiza-se uma consideração à diferença, em que o habitar-rua revela um desafio às formas de pensar e planejar a cidade baseadas no estabelecimento da ordem e da resolutividade. Faz-se necessário reconhecer a rua como espaço possível à existência, o dissenso estabelecido no espaço público, a agência política e os direitos humanos da população em situação de rua.

Inspired by the narrative approach as a theoretical and methodological perspective, this dissertation aims to discuss the public extent of urban space through homeless people's narrativity. Considering the public plurality, their permanent struggles, also that the basis for every political system is somehow excludent, I regard it as necessary to listen to and be attentive to this way of inhabiting the city, since it comes as a dissensus, peripheral to the urban planning acts. The primary location for this research is Porto Alegre's inner city suburbs, while the methodological process for this cartography unfolds the connection between my experience on communal spaces and the subjects. Based on recordings of on site observations and interaction with their way of street-inhabiting, the narrative approach mediates both knowledge production and field experience. Hence, the voice expressed by stray people, embodied by their means of inhabiting, utters the heterogeneity of such way of living in the city, in addition to building a conflict on the public dimension of urban space as well. Remarkably, the actions performed by society and the state public officials that seek to erase these people's political voice, the contrast between the urban experience of those living on the streets and those living in a residence of their own, regarded as the standard one, also the growing tension of the public-private dichotomy. The last observations retrieved from this research bring about a consideration on diversity, when street-inhabiting exposes and challenges the resolutive, order-establishing ways of thinking and planning the city. It is imperative to recognize the dissensus in the public space, alongside with the political voice and human rights of the people inhabiting the streets.