"Elas morrem, mas continuam falando" : representações policiais da violência letal contra mulheres a partir da Lei do Feminicídio
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Data
2020Orientador
Nível acadêmico
Mestrado
Tipo
Assunto
Resumo
Esta pesquisa analisa as representações sociais da violência articuladas pelo aparato policial nas investigações de casos de violência letal contra mulheres a partir da Lei do Feminicídio, Lei 13.104/15, na cidade de Porto Alegre. O estudo quer entender de que forma essas representações informam as práticas policiais investigativas e permitem que certos casos sejam classificados como feminicídios e outros casos não. Para tanto, articula-se a violência na forma de representações sociais, interro ...
Esta pesquisa analisa as representações sociais da violência articuladas pelo aparato policial nas investigações de casos de violência letal contra mulheres a partir da Lei do Feminicídio, Lei 13.104/15, na cidade de Porto Alegre. O estudo quer entender de que forma essas representações informam as práticas policiais investigativas e permitem que certos casos sejam classificados como feminicídios e outros casos não. Para tanto, articula-se a violência na forma de representações sociais, interrogando a realidade por intermédio do que se pensa sobre ela. Conjuntamente, a teoria de Connell sobre a ordem de gênero é incorporada, permitindo apreender como relações de gênero colorem essas representações da violência. A pesquisa ocorreu de forma multi-situada em diferentes delegacias do município de Porto Alegre. Para a análise, foram utilizadas nove entrevistas semi-estruturadas com interlocutores desses espaços, as observações do diário de campo, e 36 inquéritos policiais de casos de violência letal contra mulheres que ocorreram após a promulgação da Lei. A partir dos dados, primeiro, revelaram-se disputas entre os interlocutores sobre as formas de investigar os casos de feminicídio, bem como consensos sobre a nova categoria criminal. Compreendeu-se que os interlocutores utilizam, principalmente, a representação do feminicídio clássico como sendo a violência dentro de relações da ordem da cathexis, sendo relações afetivoconjugais domésticas. Uma segunda representação articulada é a do feminicídio da rua, em que as vítimas seriam trabalhadoras sexuais. Para essas representações, a feminilidade da vítima assume uma centralidade. A análise dos inquéritos permitiu verificar que as principais perguntas para testemunhas, bem como as principais evidencias do caso, são relacionadas à vítima. Com isso, há certos tipos de feminilidade que mais facilmente permitem representar a violência no termo do feminicídio. Por outro lado, os casos não classificados como feminicídios são representados pela violência urbana. Nesses casos, a feminilidade das vítimas é apagada, sendo que os inquéritos tratam de dinâmicas do tráfico. Para tanto, a atenção é em reconstruir o acusado como um sujeito perigoso e uma ameaça à ordem social. Essas representações enfatizam a divisão entre o que se convencionou como tipos distintos de violências, apagando as possíveis conexões entre elas. Esta pesquisa propõe pensar o feminicídio como uma categoria que produz contrapontos nos seus usos pelo aparato policial. A introdução da categoria permitiu mudanças e questionamentos na atuação estatal e, ao mesmo tempo, reproduções de práticas e de lógicas que a categoria inicialmente buscava combater. ...
Abstract
This research analyzes social representations of violence articulated by the police apparatus in investigations of lethal violence against women cases under the Feminicide Law, Law 13.104/ 15) in the city of Porto Alegre. I aim at understanding how these representations inform investigative police practices and allow certain cases to be classified as feminicides and other cases not. Violence is articulated in the form of social representations, interrogating reality through what is thought abou ...
This research analyzes social representations of violence articulated by the police apparatus in investigations of lethal violence against women cases under the Feminicide Law, Law 13.104/ 15) in the city of Porto Alegre. I aim at understanding how these representations inform investigative police practices and allow certain cases to be classified as feminicides and other cases not. Violence is articulated in the form of social representations, interrogating reality through what is thought about it. Together, Connell's theory of gender order is incorporated, allowing us to understand how gender relations colour these representations of violence. The fieldwork took place in different police stations in the city of Porto Alegre from a multi-sited perspective. I analyzed nine semi-structured interviews with informants from these spaces, fieldwork notes, and 36 police inquiries regarding cases of lethal violence against women that occurred after the Law enactment. From the data, it was first revealed disputes among the interlocutors on the ways to investigate the cases of feminicide and some consensus on the new criminal category. Interlocutors use, mainly, the representation of classic feminicide as being violence within relations of the order of cathexis, being domestic affective-conjugal relations. Police officers also articulate a representation of street femicide, in which the victims are sex workers. For these representations, the victim's femininity takes center stage. The inquiries' analysis showed that the main questions for witnesses and the main evidence of the case are related to the victim. With that, there are certain types of femininity that more easily allow representing violence in the term of feminicide. On the other hand, cases not classified as feminicides are represented by urban violence. In these cases, the victims' femininity is erased, and the inquiries deal with the dynamics of drug trafficking. Therefore, the focus is on reconstructing the accused as a dangerous person and a threat to society. These representations emphasize the division between what was agreed as distinct types of violence, erasing the possible connections between them. This research proposes to think of femicide as a category that produces counterpoints in its uses by the police apparatus. The introduction of the category allowed changes and questions in the state's performance and, at the same time, reproductions of practices and logic that the category initially sought to combat. ...
Instituição
Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Instituto de Filosofia e Ciências Humanas. Programa de Pós-Graduação em Sociologia.
Coleções
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Ciências Humanas (7479)Sociologia (547)
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