As articulações da cisheteronorma na privação de liberdade de meninas infratoras

Abstract

A presente dissertação tem como propósito compreender como a cisheteronormatividade se (re)articula nos contextos de privação de liberdade de meninas infratoras e como, nesses espaços, ela é performada em articulação com outros marcadores sociais da diferença como geração, raça e classe. Ao complexificar a análise a partir desse enquadramento teórico, interrogo os modos de inscrição de jovens em um sistema de privação de liberdade a partir de múltiplos caminhos e variados arranjos. Trata-se de uma pesquisa etnográfica desenvolvida no Centro de Atendimento Feminino (CASEF) do RS que, a partir da realização de observações participantes, entrevistas etnográficas e oficinas de produção de história, provocou a construção de cinco narrativas ficcionais de trajetórias de vida de adolescentes em conflito com a lei. A análise está disposta em três capítulos. No primeiro, apresento os percursos metodológicos, descrevendo o caminho desde a entrada na instituição até os desdobramentos do campo a partir das atividades desenvolvidas. No capítulo dois, as trajetórias são contadas com atenção aos marcadores sociais de diferença que as atravessam, bem como aos acontecimentos que balizam as histórias, considerando de que modo esses dois registros contribuem para se produzir uma vida mais ou menos precária. Por fim, no último capítulo, a narrativa se acentua e aprofunda, especialmente, no funcionamento institucional e no que pretende a socioeducação voltada a meninas em conflito com a lei. O estudo permitiu identificar a produção de vulnerabilização perante o Estado como não dissociada das exigências de gênero, tendo em vista que a precarização dos corpos é maximizada a partir da sua não conformação às regulações da cisheteronorma. Por causa ou consequência disso, a ressocialização a que se propõe a socioeducação feminina é pautada dentro de um regime de feminilização.

This dissertation aims to understand how the cis-heteronormativity (re)articulates itself in the contexts of deprivation of freedom of offending girls and how, in these spaces, it is performed in articulations with other social markers of difference as generation, race and class. By complicating the analysis from this theoretical framework, I question the ways of enrolling young people in a deprivation system based on multiple paths and varied arrangements. This is an ethnographic research developed at the Centro de Atendimento Socioeducativo Feminino (CASEF) in Rio Grande do Sul, which, based on participant observations, ethnographic interviews and history production workshops, led to the construction of five fictional narratives of adolescents' life trajectories in conflict with the law. The analysis is arranged in three chapters. In the first one, I present the methodological paths, describing the path from the entrance to the institution to the unfolding of the field from the developed activities. In chapter two, the trajectories are told with attention to the social markers of difference that cross them, as well as to the events that mark the stories, considering how these two registers contribute to produce a more or less precarious life. Finally, in the last chapter, the narrative is accentuated and deepened, especially, in the institutional functioning and in what socio-education aims at girls in conflict with the law. The study allowed to identify the production of vulnerability to the State as not dissociated from the gender requirements, considering that the precariousness of the bodies is maximized from their nonconformity to the regulations of the cisheteronorma. Because of or as a consequence of this, the resocialization proposed by the female socioeducation is based on a system of feminization.