Señores Legítimos” : territorialização e disputas por terras nas reduções do Paraguai

Abstract

Dentre as muitas razões que contribuíram para o notável desenvolvimento alcançado pelas reduções do Paraguai, a organização de uma economia fundada sobre um modelo comunitário de trabalho coletivo estaria entre as mais importantes. Ainda durante o século XVII, este regime se assentaria em torno de três eixos fundamentais: a agricultura e a criação ganadeira, que serviam, prioritariamente, ao consumo de seus habitantes, e a produção da erva-mate, que, além de atender a demanda interna, constituía o principal item do comércio realizado por aquelas comunidades. O desenvolvimento deste modelo econômico implicaria na composição de uma estrutura agrária baseada em domínios territoriais comunitários. Assim, durante as primeiras décadas do século XVIII, quando sua organização já havia se consolidado, todas as reduções contavam com terras próprias para seus cultivos agrícolas, dispunham de campos para a criação ganadeira, e a grande maioria também possuía áreas de bosque nativo para a produção da erva-mate. Consideradas posses da comunidade, estas áreas eram devidamente delimitadas, e seu usufruto, reconhecido como prerrogativa exclusiva de seus moradores. Neste sentido, a exploração destas terras por habitantes de outras reduções era vedado, tomado como uma intrusão indevida, que, uma vez identificada, poderia, inclusive, ser motivo de desacordos e conflitos. Esta tese aborda a formação destes domínios territoriais, e seu desenvolvimento ao longo do tempo, mais precisamente, desde a fundação das primeiras reduções, até meados da década de 1730. Neste sentido, interessam-nos aspectos como as estratégias de apropriação territorial utilizadas naquele contexto, os fatores que estimularam estes processos de territorialização, a composição de limites sobre os domínios pertencentes a cada redução e as lógicas e instrumentos que legitimavam suas relações de posse. Além disso, esta pesquisa também aborda a emergência de disputas intercomunitárias envolvendo direitos de domínio sobre áreas específicas, interpelando as razões que motivaram estes litígios, os argumentos e dispositivos empregados pelas comunidades para defenderem seus direitos de posse, bem como, os meios e critérios adotados para a resolução destas contendas.

Among the many reasons that contributed to the remarkable development achieved by Paraguay's reductions, the organization of an economy based on a community model of collective work would be among the most important. Still during the 17th century, this regime would be based around three main axes: agriculture and cattle raising, which primarily served the consumption of its inhabitants, and the production of mate, which, in addition to meeting demand domestic, was the main item of trade carried out by those communities. The development of this economic model would imply the composition of an agrarian structure based on community territorial domains. Thus, during the first decades of the 18th century, when its organization had already been consolidated, all reductions had their own land for their agricultural crops, had fields for cattle breeding, and the vast majority also had areas of native forest for the yerba mate production. Considered community possessions, these areas were duly delimited, and their usufruct recognized as an exclusive prerogative of their residents. In this sense, the exploitation of these lands by inhabitants of other reductions was prohibited, considered an undue intrusion, which, once identified, could even be a reason for intercommunity disagreements and disputes. This thesis addresses the formation of these territorial domains, and their development over time, more precisely, from the foundation of the first reductions, until the mid-1730s. In this sense, we are interested in aspects such as the land appropriation strategies used in that context, the factors that stimulated these territorialization processes, the composition of limits on the domains belonging to each reduction and the logics and instruments that legitimized their relations of possession. Furthermore, this research also addresses the emergence of intercommunity disputes involving domain rights over specific areas, questioning the reasons that motivated these conflicts, the arguments and devices used by the communities to defend their tenure rights, as well as the means and criteria adopted to resolve these disputes.