Política de drogas e mortes violentas : de onde vem o tiro? uma análise sobre as possíveis relações entre mortalidade e as práticas de controle formal na cidade de Canoas/RS

Abstract

A sociedade brasileira tem convivido com altíssimos níveis de mortes violentas relacionadas ao que chamamos de “guerra às drogas”, legitimada pelo paradigma da atual política de drogas (Lei 11.343, de 23 de agosto de 2006). Em Canoas/RS, entre 2004 e 2018, mais de um quarto das vítimas de mortes violentas apresentaram algum registro decorrente dessa lei. O objetivo desse trabalho foi identificar a relação dessas mortes com as práticas de controle formal. Por meio de análises estatísticas descritivas e multivariadas, foram comparadas as Leis 3.468/76 e 11.343/06, considerando as tipificações por uso, posse e tráfico, presentes no histórico criminal das vítimas. Assim, como a identificação dos espaços territoriais onde elas residiam, foram autuadas pelas tipificações dessas leis e materializadas nas mortes violentas. A regressão logística binária ajudou na identificação das chances de terem sido assinadas num intervalo menor de tempo em relação a terem sido mortas num período maior. Os resultados demostraram que, ao longo dos anos, houve uma mudança no perfil criminal das vítimas, cuja intensificação das incriminações por tráfico marcou a presença da vigente legislação entre os antecedentes, concentrando-se, principalmente, em determinados espaços onde as vítimas residiam e foram mortas. Além disso, a intensificação da autuação por drogas apresentou-se como um fator que aumentou as chances de a morte ocorrer num intervalo de tempo de até dois anos, entre a última autuação por drogas e a letalidade violenta. Mesmo assim, considera-se que a relação entre os fenômenos se apresenta de forma transversal, ou seja, recorrem de incidentes que vinculam as drogas às causas letais, cujo perfil criminal das vítimas, suas características sociais e territoriais são fatores que tem incidido nessa relação, além do controle repressivo e punitivo sofrido por determinados grupos da sociedade.

Brazilian society has been living with very high levels of violent deaths related to the "war on drugs," which is legitimized by the paradigm of the current drug policy – Law 11.343, 2006). In Canoas/RS, between 2004 and 2018, more than a quarter of the victims of violent deaths presented some record resulting from this law. The objective of this research was to identify the relationship of these deaths with formal control practices. Through descriptive and multivariate statistical analysis, the Laws 3.468/76 and 11.343/06 were compared considering their typifications by use, possession and drug trafficking among the victims' criminal records. Thus, as it was sought to identify the territorial areas where they resided, were charged by the typifications of these laws and materialized in the violent deaths. Binary logistic regression assisted in identifying the chances of victims, charged by those laws, having been assassinated in a shorter time range in relation to having been assassinated in a longer period. The results showed that over the years there was a change in the criminal profile of the victims, whose intensification of trafficking incriminations marked the presence of the current legislation; concentrating mainly in certain spaces where the victims resided and were killed. In addition, the intensification of drug charges presented itself as a factor that increased the chances of the death occurring within a time range of up to two years between the last drug charge and the violent lethality. Even so, it is considered that the relationship between the phenomena is presented in a transversal way, in other words, recurring from incidents which link drugs to lethal causes, whose criminal profile of the victims, their social and territorial characteristics are factors that highlight this relationship, in addition to the repressive and punitive control over certain groups of society.