Avaliação neurofisiológica do nervo vago através da eletroneuromiografia laríngea : estudo normativo, correlação com os testes de avaliação dos distúrbios autonômicos e aplicabilidade na doença de Parkinson

Abstract

Os distúrbios do sistema nervoso autônomo são frequentes e incapacitantes. A sintomatologia geralmente inespecífica e a falta de critérios objetivos que permitam o diagnóstico inequívoco do comprometimento disautonômico contribui para a demora de atenção especializada e atraso diagnóstico, também pelo conhecimento insuficiente das ferramentas disponíveis para avaliação completa dessa patologia. O nervo vago é o principal responsável pela atividade parassimpática e exerce influência significativa na modulação do sistema cardioneurovascular, essencial na manutenção da homeostase corporal. Com o objetivo de contribuir para o diagnóstico dos distúrbios disautonômicos, propusemos a utilização da eletroneuromiografia laríngea quantitativa como uma nova ferramenta neurofisiológica, explorando a sua utilidade comparativamente a um conjunto de avaliações usualmente utilizados para aferição do funcionamento do sistema nervoso autônomo em indivíduos saudáveis e em pacientes com doença de Parkinson, uma das desordens neurodegenerativas mais frequentes e incapacitantes, cujo processo patológico se associa a disfunção do nervo vago. A bateria autonômica foi composta por testes da variabilidade da frequência cardíaca, testes cardiovasculares provocativos, teste da resposta cutânea simpático reflexa, avaliação pupilar clínica, e Escala de Avaliação dos Distúrbios Autonômicos na doença de Parkinson. Os parâmetros quantitativos de duração e amplitude dos potenciais da unidade motora da musculatura intrínseca da laringe nos indivíduos saudáveis foram semelhantes ao descrito por estudos prévios. Não houve diferença entre os músculos cricotireoideo e tireoaritenoideo, influência da lateralidade ou da idade dos indivíduos. A duração do músculo tireoaritenoideo foi significantemente menor no sexo feminino. A eletromiografia laríngea foi uma técnica segura e com boa tolerabilidade. Nos pacientes com doença de Parkinson, os parâmetros quantitativos da laringe foram semelhantes aos dos sujeitos saudáveis. Estes resultados são condizentes com as observações anatomopatológicas de que a neurodegeneração provocada pelo acúmulo de alfa-sinucleína na doença de Parkinson preserva o núcleo ambíguo, ocorrendo preferencialmente no núcleo dorsal motor do nervo vago. A avaliação autonômica evidenciou critérios para neuropatia autonômica incipiente em alguns indivíduos saudáveis e a maioria destes também apresentavam alterações neurofisiológicas da musculatura laríngea, achados que podem corresponder a distúrbios assintomáticos do nervo vago. Houve diferença significativa dos resultados dos testes autonômicos entre pacientes com doença de Parkinson e indivíduos saudáveis. Além disso, houve forte correlação dos achados eletromiográficos da musculatura laríngea com os testes do sistema nervoso autônomo tanto nos indivíduos saudáveis, como nos pacientes com doença de Parkinson. Concluímos que a eletromiografia laríngea pode ser uma nova ferramenta neurofisiológica, minimamente invasiva, capaz de otimizar a avaliação autonômica, possibilitando o diagnóstico de alterações patológicas precoces em indivíduos assintomáticos e nos pacientes acometidos por desordens do nervo vago.

Autonomic nervous system disorders are frequent and disabling. Symptoms are usually nonspecific and there are no objective criteria for an unequivocal diagnosis of dysautonomic impairment. Delayed specialized care postpones the diagnosis, as well as insufficient knowledge of the tools available for complete evaluation of this pathology. Vagus nerve is the main responsible for parasympathetic activity and exerts a significant influence on the modulation of the cardioneurovascular system, essential in maintaining body homeostasis. In order to contribute to the diagnosis of dysautonomic disorders, we proposed the quantitative laryngeal electroneuromyography as a new neurophysiological tool, exploring its usefulness compared to tests usually used to measure the functioning of the autonomic nervous system in healthy individuals and in patients with Parkinson's disease, one of the most frequent and disabling neurodegenerative disorders, whose pathological process is associated with vagus nerve dysfunction. The autonomic battery consisted of heart rate variability tests, provocative cardiovascular tests, reflex sympathetic skin response test, clinical pupillary assessment, and the Autonomic Disorders Assessment Scale in Parkinson's disease. Quantitative parameters of duration and amplitude of motor unit potentials of the laryngeal intrinsic muscles in healthy subjects were similar to those described by previous studies. There was no difference between the cricothyroid and thyroarytenoid muscles, as well as there was no influence of individuals' laterality or age. The duration of the thyroarytenoid muscle was significantly shorter in females. Laryngeal electromyography was a safe technique with good tolerability. In Parkinson's disease patients, laryngeal electromyographic findings were similar to healthy subjects. These results are consistent with anatomopathological observations that neurodegeneration caused by the accumulation of alpha-synuclein in Parkinson's disease spares the nucleus ambiguus, occurring preferentially in the dorsal motor nucleus of the vagus nerve. Autonomic evaluation showed criteria for incipient autonomic neuropathy in some healthy individuals and most of these also presented neurophysiological alterations of the laryngeal muscles, findings that may correspond to asymptomatic vagus nerve disorders. There was significant difference in the results of autonomic tests between Parkinson's disease patients and healthy subjects. In addition, there was a strong correlation between the electromyographic findings of the laryngeal musculature and the tests of the autonomic nervous system, both in healthy subjects and in patients with Parkinson's disease. We conclude that laryngeal electromyography may be a new, minimally invasive neurophysiological tool capable of optimizing the autonomic assessment, enabling the diagnosis of early pathological changes in asymptomatic individuals and patients affected by vagus nerve disorders.