"Desconforto na caserna" : a Comissão Nacional da Verdade (CNV) e o retorno dos militares como protagonistas políticos no Brasil (2008-2016)

Abstract

Esta tese analisa a conjuntura da Comissão Nacional da Verdade (CNV) e o retorno dos militares como atores políticos relevantes (2008-2016). A hipótese central é que houve uma “janela de oportunidade” aos militares para se colocarem como “tutores da democracia”, embora, estruturalmente, tenham participado de todos os golpes, insurreições e revoltas na República brasileira. Este ressurgimento foi bem retratado nos três principais jornais da imprensa tradicional, que utilizei como fontes primárias: Jornal Folha de São Paulo, Jornal O Globo e Jornal Estado de São Paulo. O objetivo central foi analisar a relação entre a conjuntura da Comissão Nacional da Verdade e a estrutura na qual fazem parte os atores militares. O trabalho adotou uma metodologia processual e histórica, analisando matérias jornalísticas, qualitativamente, no antes, durante e depois da CNV. E, de como foi abordada a visão do governo de então e as vozes militares nas fontes primárias. O achado, de maneira consensual, foi que a Lei da Anistia não deveria ser alterada, inclusive em muitas falas da presidente Dilma Rousseff, que havia sido presa e torturada pela ditadura militar. A correlação de forças em favor da esquerda não conseguiu, naquela conjuntura, a anulação da Lei da Anistia, que impediu qualquer punição aos violadores de direitos humanos. Em resumo, a pesquisa contribuiu para reafirmar que a Lei da Anistia se tornou um consenso, tanto nas forças da esquerda, quanto na imprensa tradicional, representada por três grandes jornais de circulação nacional, e nos próprios militares, que temiam algum tipo de “revanchismo”, embora aparecessem discursos de “desconforto na caserna” com a CNV. Ou seja, como “tutores da democracia”, os atores militares exercem o papel acima do próprio estado democrático de direito, vetando ou apoiando políticas públicas de maneira estrutural.

This thesis analyzes the context of the National Truth Commission (CNV) and the return of the military as relevant political actors (2008-2016). The central hypothesis is that there was a “window of opportunity” for the military to position themselves as “guardians of democracy”, although, structurally, they participated in all coups, insurrections and revolts in the Brazilian Republic. This resurgence was well portrayed in the three main newspapers of the traditional press, which I used as primary sources: Jornal Folha de São Paulo, Jornal O Globo and Jornal Estado de São Paulo. The main objective was to analyze the relationship between the context of the National Truth Commission and the structure of which the military actors are part. The work adopted a procedural and historical methodology, analyzing journalistic articles, qualitatively, before, during and after the CNV. And, how the vision of the government at the time and the military voices were addressed in the primary sources. The consensus was that the Amnesty Law should not be changed, including in many statements by President Dilma Rousseff, who had been arrested and tortured by the military dictatorship. The correlation of forces in favor of the left failed, at that time, to annul the Amnesty Law, which prevented any punishment for human rights violators. In short, the research helped to reaffirm that the Amnesty Law had become a consensus, both among the left and in the traditional press, represented by three major national newspapers, and among the military itself, who feared some kind of “revenge”, although there were speeches of “discomfort in the barracks” with the CNV. In other words, as “guardians of democracy”, the military actors exercise a role above the democratic rule of law itself, vetoing or supporting public policies in a structural way.