Efeito do consumo programado de uma dieta rica em gordura sobre o comportamento alimentar e marcadores bioquímicos envolvidos no controle homeostático e hedônico do apetite em ratos adolescentes

Abstract

O período da adolescência representa a transição entre a infância e a vida adulta. A exposição a dieta rica em gordura (DRG) neste período é particularmente impactante, visto que nessa fase ocorrem intensos processos de maturação dos circuitos neurais, principalmente naqueles que regulam o comportamento e a ingestão alimentar. Como na adolescência a autonomia alimentar é estabelecida, a sensibilidade à recompensa favorece a procura por alimentos hiperpalatáveis, que se consumidos em excesso, podem provocar alterações duradouras ao longo da vida. Nesse sentido, a proposta deste estudo foi avaliar se o consumo programado de uma DRG por ratos, de ambos os sexos, no período da adolescência, afetaria o comportamento alimentar e os marcadores bioquímicos envolvidos nos centros de controle homeostático e hedônico do apetite. No dia pós-natal (DPN) 21, ratos da linhagem Wistar, machos e fêmeas, foram distribuídos aleatoriamente em quatro grupos experimentais: Controle (C) - os animais receberam dieta comercial (DC) ad libitum; Irrestrito (I) - os animais receberam DRG e DC ad libitum todos os dias do tratamento; Baixa Restrição (BR) - os animais tiveram acesso por 2 horas a DRG todos os dias da semana, além de receberem DC ad libitum e Alta Restrição (AR) - os animais tiveram acesso por 2 horas a DRG na segunda, quarta e sexta-feira, além de receberem DC ad libitum. O consumo alimentar de 2 e 22 horas foi monitorado por 21 dias consecutivos. As medidas murinométricas foram monitoradas semanalmente. Os animais foram eutanasiados para pesagem da gordura abdominal e retirada do plasma e de estruturas cerebrais (núcleo arqueado do hipotálamo – ARC, núcleo accumbens – NAC e córtex pré-frontal medial - mPFC), para análise de marcadores dopaminérgicos e medição dos níveis de IL-1β, IL-6 e TNF-α. O consumo alimentar aumentou com o passar das semanas. Nas 2 horas de alimentação programada o grupo BR ingeriu mais calorias, porém nas 22 horas posteriores, esse consumo tornou-se inferior aos demais grupos, indicando um mecanismo de compensação calórica. Não houve diferenças significativas entre o peso corporal, IMC e relação CA/CT. Em relação a sequência de saciedade, a análise dos parâmetros microestruturais mostrou que em 1 hora de ingestão alimentar, os grupos BR e AR consumiram mais calorias e apresentaram maior tamanho de refeição, que os demais grupos. Mostrou também que os machos dos grupos BR, AR e I e as fêmeas dos grupos I e BR apresentaram menor duração da refeição. E que os machos dos grupos BR, AR e I e as fêmeas dos grupos BR e AR exibiram maior taxa de alimentação. O que resultou na antecedência, atraso e interrupção do ponto de saciedade. Com relação ao conflito claro-escuro sem restrição alimentar, os grupos BR e AR exibiram um maior consumo calórico e menor latência para se alimentar. O mesmo ocorreu para conflito claro-escuro com 6 horas prévias de restrição alimentar, indicando que a motivação para consumir alimentos em um local aversivo não é dependente da fome e do medo. No NAC as fêmeas do grupo AR apresentaram menor imunoconteúdo de TH. Enquanto no mPFC, os machos do grupo BR exibiram elevado imunoconteúdo de D1R, D2R e TH, os machos do grupo I apresentaram mais TH e as fêmeas do grupo I também elevaram o imunoconteúdo de D1R. No ARC das fêmeas, os níveis de IL-1β e IL-6 foram menores no grupo AR, enquanto os machos não exibiram diferença significativa. O mesmo ocorreu com os níveis de TNF-α no ARC e NAC, e IL-6 no NAC, tanto para machos quanto para fêmeas. Juntas essas descobertas podem fornecer informações valiosas sobre os mecanismos comportamentais e bioquímicos envolvidos no desenvolvimento de transtornos alimentares durante a infância, auxiliando ainda no direcionamento de novos caminhos para melhorar as intervenções de tratamento, e não somente, como abrindo novos questionamentos acerca dos mecanismos fisiológicos envolvidos em sua regulação, principalmente no que se refere as citocinas pró-inflamatórias.

Adolescence represents the transition between childhood and adulthood. Exposure to a high-fat diet (HFD) during this period is particularly impactful, since during this phase there are intense processes of maturation of neural circuits, especially those that regulate behavior and food intake. As food autonomy is established in adolescence, sensitivity to reward favors the search for hyper-palatable foods, which, if consumed in excess, can cause lasting changes throughout life. In this sense, the purpose of this study was to assess whether the programmed consumption of a DRG by rats of both sexes during adolescence would affect eating behavior and the biochemical markers involved in the homeostatic and hedonic appetite control centers. On postnatal day (PND) 21, male and female Wistar rats were randomly assigned to four experimental groups: Controle (C) - the animals received commercial diet (CD) ad libitum; Irrestrito (I) - the animals received HFD and CD ad libitum every day of treatment; Baixa Restrição (BR) - the animals had access for 2 hours to HFD every day of the week, in addition to receiving CD ad libitum and Alta Restrição (AR) - the animals had access for 2 hours to HFD on Monday, Wednesday and Friday, in addition to receiving CD ad libitum. Food consumption at 2 and 22 hours was monitored for 21 consecutive days. Murine measurements were monitored weekly. The animals were euthanized for weighing of abdominal fat and removal of plasma and brain structures (arcuate nucleus of the hypothalamus - ARC, nucleus accumbens - NAC and medial prefrontal cortex - mPFC), for analysis of dopaminergic markers and measurement of IL-1β, IL-6 and TNF-α levels. Food consumption increased over the weeks. In the 2 hours of programmed feeding, the BR group ingested more calories, but in the following 22 hours, this consumption became lower than the other groups, indicating a calorie compensation mechanism. There were no significant differences in body weight, BMI and AC/CT ratio. In relation to the behavioral satiety sequence, the analysis of microstructural parameters showed that within 1 hour of food intake, the BR and AR groups consumed more calories and had larger meal sizes than the other groups. It also showed that males in groups BR, AR and I and females in groups I and BR had shorter meal durations. Males in groups BR, AR and I and females in groups BR and AR had a higher feeding rate. This resulted in the anticipation, delay and interruption of the satiety point. With regard to light-dark conflict without food restriction, groups BR and AR exhibited higher caloric intake and lower latency to feed. The same occurred for light-dark conflict with 6 hours of prior food restriction, indicating that the motivation to consume food in an aversive place is not dependent on hunger and fear. In the NAC, females in the AR group had lower TH immunocontent. While in the mPFC, males in the BR group showed high D1R, D2R and TH immunocontent, males in group I showed more TH and females in group I also showed higher D1R immunocontent. In the ARC of the females, the levels of IL-1β and IL-6 were lower in the AR group, while the males showed no significant difference. The same occurred with the levels of TNF-α in the ARC and NAC, and IL-6 in the NAC, for both males and females. Together, these findings may provide valuable information about the behavioral and biochemical mechanisms involved in the development of eating disorders during childhood, helping to direct new paths to improve treatment interventions, and not only that, but also opening up new questions about the physiological mechanisms involved in their regulation, especially with regard to pro-inflammatory cytokines.