O que fazer com os homens? : as práticas de intervenção com autores de violência

Abstract

As relações entre homens e violência são analisadas nesta dissertação a partir de uma intrincada rede de práticas discursivas. Tendo em vista os cenários econômicos, políticos e sociais por onde os homens constroem modos de ser e fazer uns aos outros, proponho uma análise dessa relação a partir das falhas que surgem no processo de construção da performatividade masculina e como essas falhas produzem maior ou menor grau de instabilidade ao “ser homem”. A violência, enquanto comportamento de resposta do homem que “falha” com a identidade idealizada é compreendida como uma das maneiras de lidar com as instabilidades da formação do gênero. Tendo em vista que os autores de violência devem ser responsabilizados pelos seus atos, este torna-se também um processo de responsabilização pela formação do gênero, em seus respectivos contextos. Com isso, proponho como campo de análise os grupos reflexivos de gênero, subsidiado por dois materiais audiovisuais, o filme brasileiro “O silêncio dos homens” e o filme estadunidense “The mask you live in”, onde diversos temas que perpassam à formação do gênero masculino são discutidos com homens e meninos participantes dos grupos, coordenadores de grupos e profissionais de diversas áreas. A análise das práticas discursivas sobre masculinidade e violência é feita por uma perspectiva de inspiração genealógica, trazendo os fundamentos teóricos da Teoria da Interpelação e da Teoria da Performatividade de Gênero. A metodologia utilizada consiste no recorte de depoimentos dos filmes que evidenciam momentos cruciais à formação do gênero para os homens entrevistados, considerando as práticas de violência ou exposição à elas como um dos critérios de seleção dos depoimentos. Os achados resultantes dessa análise indicam que quando a relação dos homens com as normas de gênero enfrentam “falhas” em uma produção idealizada, há uma intensificação das práticas de violência em detrimento de outras formas de lidar com a instabilidade desse processo. Já as intervenções promovidas com os grupos de homens e meninos têm demonstrado que o acolhimento coletivo e a reflexão sobre essas instabilidades fazem da “falha” uma abertura à estilização das normas de gênero e uma ampliação dos modos de se posicionar socialmente como homem.

The relationships between men and violence are analyzed in this dissertation based on an intricate network of discursive practices. Taking into account the economic, political and social scenarios in which men construct ways of being and doing for each other, I propose an analysis of this relationship based on the flaws that arise in the process of constructing male performativity and how these flaws produce greater or lesser degree of instability in “being a man”. Violence, as a man's response behavior that “fails” with the idealized identity, is understood as one of the ways of dealing with the instabilities of gender formation. Bearing in mind that perpetrators of violence must be held responsible for their actions, this also becomes a process of accountability for the formation of gender, in their respective contexts. With this, I propose gender reflective groups as a field of analysis, subsidized by two audiovisual materials, the brazilian film “O silêncio dos homens” and the american film “The Mask You Live In”, where several themes that permeate the formation of the genre masculine are discussed with men and boys participating in the groups, group coordinators and professionals from different areas. The analysis of discursive practices about masculinity and violence is carried out from a genealogically inspired perspective, bringing the theoretical foundations of the Theory of Interpellation and the Theory of Gender Performativity. The methodology used consists of cutting testimonies from the film that highlight crucial moments in the formation of the gender for the men interviewed, considering the practices of violence or exposure to them as one of the criteria for selecting the testimonies. The findings resulting from this analysis indicate that when men's relationship with gender norms faces “failures” in an idealized production, there is an intensification of violent practices to the detriment of other ways of dealing with the instability of this process. Interventions promoted with groups of men and boys have demonstrated that collective acceptance and reflection on these instabilities make “failure” an opening to the stylization of gender norms and an expansion of the ways of positioning oneself socially as a man.