Terapia de aconselhamento nutricional combinada à estimulação transcraniana por corrente contínua (ETCC) na compulsão alimentar : um ensaio clínico randomizado

Abstract

Introdução: O Transtorno de Compulsão Alimentar (TCA) associa-se a alterações no processamento de recompensas, incluindo déficits em áreas frontais como o Córtex Pré-Frontal Dorsolateral (DLPFC). O tratamento de referência é a Terapia Cognitivo Comportamental (TCC), a qual visa identificar padrões de pensamentos, hábitos e crenças disfuncionais que influenciam de forma negativa o comportamento e as emoções. No entanto, esta técnica apresenta limitações no que tange a magnitude de seu feito, particularmente em determinados domínios do comportamento. Dentre as hipóteses levantadas, estaria um efeito teto de seu impacto no resultado do tratamento. Tendo em vista isso, acredita-se que a associação de técnicas neuromodulatórias, como a Estimulação Transcraniana por Corrente Contínua (ETCC) possa amplificar a resposta terapêutica. Portanto, delineou-se um ensaio clínico randomizado cego em paralelo controlado com uso simulado, a fim de avaliar o efeito combinado da terapia de aconselhamento nutricional (TAN) à ETCC nos sintomas do TCA, parâmetros de excitabilidade cortical avaliados pela Estimulação Magnética Trasncraniana (Transcranial Magnetic Stimulation- TMS) e parâmetros de controle inibitório, avaliado pelo Go/no-Go task. Métodos: Foram incluídas pacientes do sexo feminino com diagnóstico de TCA moderado, com idade entre 18 e 65 anos e IMC ≥ 25 Kg/m². Estas foram randomicamente designadas para um dos quatro grupos: (1) ativo (a)-ETCC; (2) a-ETCC + TAN; (3) Sham (s)-ETCC + TAN; (4) Terapia de Aconselhamento Nutricional (TAN). O protocolo de ETCC domiciliar foi realizado com corrente de 2mA por 20min, com aplicação da estimulação anódica no Córtex Pré-frontal Dorsolateral (DLPFC) esquerdo e o eletrodo catódico no DLPFC direito. Foram realizadas 28 sessões de ETCC domiciliar, sendo uma sessão diária durante os cinco dias de semana por 5 semanas e após uma sessão semanal durante três semanas. A TAN ocorreu de modo virtual, com duração de 8 semanas, sendo realizada uma sessão por semana. O período de acompanhamento foi estipulado em 8 semanas após a conclusão do tratamento. O desfecho primário era a gravidade dos sintomas de compulsão alimentar, aferidos pela Escala de Compulsão Alimentar Periódica (ECAP) e de forma secundária investigaram-se fatores importantes na psicopatologia alimentar, como medidas de excitabilidade cortical e controle inibitórias, avaliado pela Inibição Intracortical Curta (SICI), aferido pela TMS e pelo Go/no-Go task, respectivamente, além de escalas que avaliam craving, comportamento alimentar, medidas antropométricas, como peso e medida de viés de atenção, avaliado através do visual probe task. Resultados: No estudo 1, foi publicado o protocolo do Ensaio Clínico Randomizado (ECR). No estudo 2, não encontramos efeito superior do tratamento combinado sobre os desfechos estudados, alimentares e eletrofisiológicos. No entanto reportamos que os quatro grupos obtiveram uma melhora da gravidade da compulsão alimentar através do tempo, não diferindo entre tratamentos. Mudanças na excitabilidade cortical foram encontradas apenas no grupo a-ETCC, quando comparado medidas basais e finais, no entanto sem diferenças entre os grupos. Da mesma forma reportadas mudanças gerais de melhora através do tempo nos questionários de craving e de psicopatologia alimentar, mas sem diferenças entre os grupos. Já no estudo 3 encontramos efeito da terapia combinada no aumento do viés de atenção em um nível consciente de processamento, o que pode indicar uma provável melhora na capacidade de processamento dos estímulos relacionados à recompensa. Conclusão: Este é um dos ECR pioneiros que investigam o efeito sinérgico da ETCC e da TAN. Apesar de nosso pequeno tamanho amostral, este estudo contribui com o conhecimento na área mostrando um importante efeito tanto da TAN quanto da terapia combinada na fisiopatologia que rege o transtorno.

Introduction: Binge Eating Disorder (BED) is associated with changes in reward processing, including deficits in frontal areas such as the Dorsolateral Prefrontal Cortex (DLPFC). The reference treatment is Cognitive Behavioral Therapy (CBT), which aims to identify thought patterns, habits and dysfunctional beliefs that negatively influence behavior and emotions. However, this technique has limitations regarding the magnitude of its achievement, particularly in certain domains of behavior. Among the hypotheses raised, there would be a ceiling effect of its impact on the outcome of the treatment. In view of this, it is believed that the association of neuromodulatory techniques, such as Transcranial Direct Current Stimulation (tDCS) can amplify the therapeutic response. Therefore, a parallel-blind, sham-controlled randomized clinical trial was designed to evaluate the combined effect of nutritional counseling therapy (NHS) and tDCS on BED symptoms, cortical excitability parameters evaluated by Transcranial Magnetic Stimulation (TMS) and inhibitory control parameters, evaluated by the Go/no-Go task. Methods: Woman diagnosed with moderate BED, aged between 18 and 65 years and BMI ≥ 25 kg/m² were included. These were randomly assigned to one of four groups: (1) active (a)-tDCS; (2) a-tDCS+ NCT; (3) Sham (s)-tDCS + NCT; (4) Nutritional Counseling Therapy (NCT). The home-based tDCS protocol was performed with a current of 2mA for 20min, with the application of anodic stimulation in the left Dorsolateral Prefrontal Cortex (DLPFC) and the cathodic electrode in the right DLPFC. Twenty-eight tDCS sessions were held, one session during the five days of the week for 5 weeks and after that there was a weekly session for three weeks. The NCT took place virtually, one session per week, lasting 8 weeks. The follow-up period was set at 8 weeks after completion of treatment. The primary outcomes were the severity of binge eating symptoms, measured by the Binge Eating Scale (BES) and the inhibitory parameter of cortical excitability - Short Intracortical Inhibition (SICI), evaluated by Transcranial Magnetic Stimulation (TMS) and, secondarily, important factors in eating psychopathology were investigated, such as measures of cortical excitability and inhibitory control, assessed by Short Intracortical Inhibition (SICI), measured by TMS and by the Go/no-Go task, respectively, in addition to scales that assess craving, eating behavior, anthropometric measurements, such as weight and attention bias, assessed using the visual probe task. Results: In study 1, the Randomized Clinical Trial (RCT) protocol was published. In study 2, we did not find a superior effect of the combined treatment on the studied outcomes, dietary and electrophysiological. However, we report that the four groups achieved an improvement in the severity of binge eating over time, not differing between treatments. Changes in cortical excitability were found only in the a-tDCS group, when comparing baseline and final measurements, however without differences between groups. In the same way, general changes in improvement over time were reported in the craving and eating psychopathology questionnaires, but without differences between groups. In study 3, we found an effect of combined therapy in increasing attention bias at a conscious level of processing, which may indicate a probable improvement in the ability to process reward-related stimuli. Conclusion: This is one of the pioneering RCTs investigating the synergistic effect of tDCS and NHS. Despite our small sample size, this study contributes to knowledge in the area by showing an important effect of both NHS and combined therapy on the pathophysiology that governs the disorder.