Pelas lentes de Michel Foucault : reflexões sobre as práticas de promoção da saúde na atenção primária

Abstract

A Promoção da Saúde é um dos pilares de sustentação e operacionalização do Sistema Único de Saúde (SUS). Por estarem inseridos nos territórios de vida das pessoas, os serviços que compõem a Atenção Primária em Saúde (APS) se constituem como espaços privilegiados para a realização de práticas de Promoção da Saúde. A Enfermagem é uma das categorias profissionais que integra a equipe mínima da Estratégia Saúde da Família, que tem sido fundamental para a organização da APS no Brasil. Assim, em parceria com outros núcleos profissionais, a Enfermagem é responsável por protagonizar práticas de Promoção da Saúde nos territórios de atuação da APS. O objetivo desta Tese foi o de analisar as práticas de Promoção da Saúde na Atenção Primária em Saúde, a partir das teorizações foucaultianas. Para atingir o pretendido, realizei uma pesquisa de campo, descritiva, qualitativa, com inspiração genealógica. A coleta de dados empíricos foi realizada por meio de 23 entrevistas semiestruturadas, realizadas com trabalhadores da APS. A análise dos dados deu origem a quatro artigos, que sistematizam os resultados da pesquisa que, em linhas gerais, podem ser descritos assim: foi identificado um campo heterogêneo de práticas de Promoção da Saúde, que se constitui por meio da circulação de diferentes saberes e poderes; as práticas são permeadas por discursividades que se alinham à governamentalidade neoliberal e práticas que se colocam como contraconduta a tais discursividades; a análise das emergências e proveniências das práticas de Promoção da Saúde na APS apresenta como se constituiram e se modificaram as práticas de Promoção da Saúde, de acordo com as possibilidades históricas. O principal efeito das práticas de Promoção da Saúde na APS está associado à diminuição da medicalização e à adoção de elementos da Clínica Ampliada. Já as principais dificuldades decorrem da precarização das políticas públicas, oriundas das medidas de austeridade fiscal adotadas nos últimos anos. São descritas, como possibilidades a serem exploradas para potencializar a Promoção da Saúde na APS: o fortalecimento das atividades formativas no âmbito das unidades de saúde; a problematização dos Determinantes Sociais da Saúde e os métodos de fomento à participação; a coletivização das demandas em saúde; a valorização e reforço das conquistas e das ações coletivas; o resgate da cultura e de hábitos comunitários locais; e, o advocacy pela Promoção da Saúde. Aponta-se a possibilidade de construção de subjetividades, capazes de se constituírem como resistências e contracondutas à governamentalidade neoliberal, na micropolítica do trabalho realizado pelas equipes. A partir dos resultados apresentados, sustento a seguinte tese: a Promoção da Saúde é polissêmica, influenciada por diferentes vertentes epistemológicas e construída a partir de condições de possibilidades históricas. Os diferentes saberes que a constituem se colocam em uma arena de relações de poder, que se traduzem e, ao mesmo tempo, produzem práticas de saúde. Embora existam práticas hegemônicas, que representam os regimes de verdade da contemporaneidade, resistências e contracondutas à governamentalidade neoliberal também podem ser identificadas e têm potência para produzir outras práticas e diferentes modos de (re)existência na APS.

Health Promotion is one of the pillars of support and operation of the Unified Health System (SUS). As they are inserted in people's life territories, the services that make up Primary Health Care (PHC) are privileged spaces for carrying out Health Promotion practices. Nursing is one of the professional categories that integrate the team of Family Health Strategy, which has been fundamental for the organization of PHC in Brazil. Thus, in partnership with other professional centers, Nursing is responsible for taking the lead in Health Promotion practices in the areas where the PHC operates. The objective of this Thesis was to analyze the practices of Health Promotion in Primary Health Care, based on Foucault's theories. To achieve the intended purpose, I carried out a field research, descriptive, qualitative, with genealogical inspiration. The collection of empirical data was carried out through 23 semi-structured interviews, carried out with PHC workers. The data analysis gave rise to four articles, which systematize the research results that, in general terms, can be described as follows: a heterogeneous field of Health Promotion practices was identified, which is constituted through the circulation of different knowledge and powers; practices are permeated by discursivities that align with neoliberal governmentality and practices that stand as a counter-conduct to such discursivities; the analysis of the emergencies and provenances of Health Promotion practices in PHC presents how Health Promotion practices were constituted and modified, according to historical possibilities. The main effect of Health Promotion practices in PHC is associated with the decrease in medicalization and the adoption of elements from the Extended Clinic. The main difficulties stem from the precariousness of public policies, arising from the fiscal austerity measures adopted in recent years. The following are described as possibilities to be explored to enhance Health Promotion in PHC: the strengthening of training activities within the health units; the problematization of the Social Determinants of Health and the methods to encourage participation; the collectivization of health demands; the appreciation and reinforcement of achievements and collective actions; the recovery of local community culture and habits; and advocacy for Health Promotion. It points to the possibility of building subjectivities, capable of constituting resistance and counterconducts to neoliberal governmentality, in the micropolitics of the work carried out by the teams. Based on the results presented, I support the following thesis: Health Promotion is polysemic, influenced by different epistemological strands and built from conditions of historical possibilities. The different types of knowledge that constitute it are placed in an arena of power relations, which translate and, at the same time, produce health practices. Although there are hegemonic practices that represent contemporary truth regimes, resistances and counter-conducts to neoliberal governmentality can also be identified and have the power to produce other practices and different modes of (re)existence in PHC.