UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL ESCOLA DE ENFERMAGEM MESTRADO EM ENFERMAGEM DEBORA DALEGRAVE CORPOREIDADE DO SER ADOLESCENTE COM CÂNCER NA PERSPECTIVA DA SEXUALIDADE Porto Alegre 2013 DEBORA DALEGRAVE CORPOREIDADE DO SER ADOLESCENTE COM CÂNCER NA PERSPECTIVA DA SEXUALIDADE Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, Mestrado Acadêmico, da Escola de Enfermagem da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, como requisito final para obtenção do título de Mestre em Enfermagem. Linha de Pesquisa: Fundamentos e Práticas de Enfermagem em Saúde da Mulher, Criança e Adolescente. Orientadora: Maria da Graça Corso da Motta Porto Alegre 2013 Dedico este meu trabalho à minha família, em especial ao meu pai Edio, que foi um exemplo de perseverança na luta contra o câncer. AGRADECIMENTOS O destino une e separa as pessoas. Mas nenhuma força é tão grande para fazer esquecer pessoas que, por algum motivo, um dia nos fizeram felizes. Assim, não poderia deixar de agradecer a todos os anjos que estiveram comigo nesta caminhada, oferecendo apoio e coragem, mas, principalmente, ajudando a tornar possível a realização deste sonho. Primeiramente, gostaria de agradecer a Deus e a Mãe Três Vezes Admirável de Schoenstatt por terem me escolhido como filha predileta do seu amor e carinho, mostrandome o caminho que devo trilhar e dando-me força e coragem para seguir em frente em busca dos meus objetivos e sonhos. Foi Ele que soou no meu coração este desejo, esta vontade de ajudar, de proclamar aos quatro ventos a maravilha que é amar, sem medir esforços, a vida e ao ser humano. Um agradecimento especial à minha Família, principalmente aos meus pais Edio e Maria e à minha irmã Daniela, que nunca mediram esforços para a minha felicidade e realização dos meus sonhos. É difícil encontrar palavras para expressar o amor e a gratidão que dedico a vocês, minha base, meu sustento e minha vida. Um agradecimento distinto ao meu PAI, obrigada por ser tão especial para mim, e por ser esse pai com tantas qualidades; obrigada por ter me ensinado a amar sem medidas e por se esforçar sempre para me fazer feliz e realizar os meus sonhos. Felizmente, posso dizer com muito orgulho que o senhor é um exemplo a ser seguido por sua força de vontade, fé e determinação, por não ter se deixado enfraquecer pelo câncer, lutando bravamente durante dois anos e meio; essas lembranças estarão sempre vivas em minha memória. Além dos meus pais, gostaria de prestar uma pequena homenagem à vó Conda e à tia Célia, agradecendo-lhes pelo tanto que foram e são importantes para mim, por toda a ajuda e incentivo no decorrer deste caminho, muito obrigada. Ao meu amor Regis, que acompanhou esta trajetória e acreditou no meu ideal, a você que me escutou e incentivou em todos os momentos, vivenciado comigo, passo a passo, todos os detalhes deste trabalho, ajudando-me, dando-me todo o apoio que necessitava nos momentos difíceis, todo carinho, respeito, por ter “aturado” os momentos de estresse, e por tornar minha vida cada dia mais feliz. Obrigada pelo carinho e compreensão, pelo entendimento e força. A ti, meu eterno amor e gratidão. Agradeço aos meus verdadeiros Amigos, em especial à “Tropa de Elite”, e a minha prima Graciela pelo carinho, sorriso, desabafos, choros e, por muitas vezes, devido à distância, estarem em pensamentos transmitindo a segurança, a força e a coragem de que precisava. E aos presentes por entenderem muitas vezes a minha ausência, por me auxiliarem quando precisava, por me animarem quando o desânimo batia à minha porta e, principalmente, pela alegria em saber que posso contar com vocês em todos os momentos. Agradeço aos Docentes do Programa de Pós-graduação em Enfermagem da UFRGS, em especial à minha orientadora, professora Doutora Maria da Graça Corso da Motta, pelo apoio e inspiração no amadurecimento dos meus conhecimentos e conceitos que me levaram a realização deste sonho. Muito obrigada por todos os ensinamentos, por todas as alegrias e vitórias que conquistei ao longo deste período. Muito obrigada pelas Amizades que construí no decorrer desses dois anos – em especial à Helena, Aline, Graciela, Alaíne, Caroline, Greice e Daniane por terem acreditado em mim, por todos os ensinamentos; obrigada pelo convívio, afago e pelo consolo quando necessário tenham a certeza que guardarei vocês para sempre em meu coração. Por fim, gostaria de expressar minha sincera gratidão aos Adolescentes que participaram da realização desta pesquisa, sem vocês nada disso seria possível. Vocês fizeram acreditar que quando vivemos com amor é possível alcançar nossos ideais, obrigada pela participação, carinho; tenho a certeza de que juntos construímos um grande caminho. Estendo o meu agradecimento a toda a Equipe da Unidade de Internação Oncológica Pediátrica do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, por todo o incentivo e ajuda, por realmente terem acreditado na minha pesquisa. Enfim... meu singelo agradecimento a todas as pessoas que ajudaram direta ou indiretamente para a realização de mais esta etapa de minha vida. "Quando amamos e acreditamos do fundo de nossa alma, em algo, nos sentimos mais fortes que o mundo, e somos tomados de uma serenidade que vem da certeza de que nada poderá vencer a nossa fé. Esta força estranha faz com que sempre tomemos a decisão certa, na hora exata e, quando atingimos nossos objetivos ficamos surpresos com nossa própria capacidade." (Paulo Coelho) RESUMO Trata-se de estudo da linha de pesquisa Fundamentos e Práticas de Enfermagem em Saúde da Mulher, Criança, Adolescente e Família, vinculado ao Grupo de Estudos do Cuidado à Saúde nas Etapas da Vida (CEVIDA) do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Escola de Enfermagem da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). O objetivo foi conhecer as percepções do ser adolescente com câncer sobre a corporeidade na perspectiva da sexualidade. Visando mostrar a união de dois conceitos, amplamente desmistificados em prol de uma finalidade, que é conhecer a visão dos adolescentes sobre seu corpo e a sua sexualidade. A metodologia norteadora da pesquisa foi pautada em um estudo qualitativo, com abordagem fenomenológica, a qual permitiu abranger a realidade visível e compreender os fenômenos e processos que estão atualizados no cotidiano do adolescente com câncer. A pesquisa teve como loco o Hospital de Clinicas de Porto Alegre, na Unidade de Internação Oncológica Pediátrica. Contando com a participação de seis adolescentes, com idade de 14 a 18 anos, a coleta das informações ocorreu por meio do Método Criativo Sensível, a partir das dinâmicas: Espelho Mental, Texto Coletivo, Adolescer e Chuva de Palavras, no período de julho de 2012. Optou-se pela utilização da hermenêutica, como método de interpretação das informações, estabelecendo quatro categorias: Imagem corporal e modo de ser-no-mundo; Sexualidade: limites e possibilidades; Da negação ao aceite; e Lições de Vida: a corporeidade existente. Frente a isso, esse estudo revelou a facticidade da doença, e o seu existir para além da doença, a partir do olhar compreensivo, demonstrando a riqueza do mundo vivido pelos adolescentes, propiciando reflexões profundas, a atenção e a ação que exercem sobre si mesmos para preservar e cultivar a vida de maneira responsável, autônoma e livre, tornandoos protagonistas de seu cuidado permanente, como seres no mundo. Bem como, a sexualidade pode ser observada em diferentes situações e expressões, o que comprova que os adolescentes com câncer mantêm dentro de si a essência de serem adolescentes no mundo. Sob o olhar da enfermagem, este estudo veio ao encontro de qualificar o cuidado, estabelecendo um vinculo, conhecendo e redescobrindo o processo do adolescer no cuidado à saúde do adolescente com câncer. Palavras-Chave: Câncer; Adolescente; Corporeidade e Sexualidade . RESUMEN Este estudio contempla la línea de investigación Fundamentos y Prácticas de Enfermería en Salud de la Mujer, Niño y Adolescente, perteneciendo al Grupo de Estudio sobre Salud Etapas de Cuidado de Vida (CEVIDA) Programa de Postgrado en Enfermería, Escuela de Enfermería de la Universidad Federal de Rio Grande do Sul (UFRGS). Su principal objetivo fue conocer las percepciones del ser adolescente con cáncer sobre la corporeidad en la perspectiva de la sexualidad. Visando mostrar la unión de dos conceptos, ampliamente desmitificados en prol de una finalidad, que es conocer la visión de los adolescentes sobre su cuerpo y su sexualidad. La metodología norteadora de la investigación fue pautada en un estudio cualitativo, con abordaje fenomenológico, la cual permitió comprender la realidad visible y comprender los fenómenos y procesos que están actualizados en el cotidiano del adolescente con cáncer. La investigación tuvo como loco el Hospital de Clínicas de Porto Alegre, en la Unidad de Internación Oncológica Pediátrica. Contando con la participación de seis adolescentes, entre 14 y 18 años, la colecta de las informaciones ocurrió por medio del Método Creativo Sensible, a partir de las dinámicas: Espejo Mental, Texto Colectivo, Adolecer y Lluvia de Palabras, en el periodo de julio de 2012. Se optó por la utilización de la hermenéutica, como método de interpretación de las informaciones, estableciendo cuatro categorías: Imagen corporal y modo de ser en el mundo; Sexualidad: límites y posibilidades; De la negación al endoso; y Lecciones de Vida: la corporeidad existente. Frente a eso, ese estudio reveló la facticidade de la enfermedad, y su existir para además de la enfermedad, a partir de la mirada comprensiva, demostrando la riqueza del mundo vivido por los adolescentes, propiciando reflexiones profundas, la atención y la acción que ejercen sobre sí mismos para preservar y cultivar la vida de manera responsable, autónoma y libre, haciéndolos protagonistas de su cuidado permanente, como seres en el mundo. Además, la sexualidad se puede observar en las diferentes situaciones y expresiones, lo que demuestra que los adolescentes con cáncer mantener dentro de sí mismos la esencia de ser adolescentes en el mundo. Bajo la mirada de la enfermería, este estudio vino al encuentro de calificar el cuidado, estableciendo uno vinculo, conociendo y redescubriendo el proceso del adolecer en el cuidado a la salud del adolescente con cáncer. Palabras-Llave: Cáncer; Adolescente; Corporeidad y Sexualidad. ABSTRACT This study contemplates the search line Fundamentals and Practices of Nursing in Women's Health, Child and Adolescent, the Study Group on Health Care Life Stages (CEVIDA) Program Graduate in Nursing, School of Nursing, Federal University of Rio Grande do Sul (UFRGS). Its main goal was to understand the perceptions of being a teenager with cancer on the corporeality in view of sexuality. Aiming to show the union of two concepts, largely demystified towards a purpose, which is to know the perceptions of adolescents about their bodies and their sexuality. The guiding methodology to the research was based on a qualitative study with a phenomenological approach, which allowed to cover the visible reality and understand the phenomena and processes that are updated daily in adolescents with cancer. This one, investigated the corporeity of being an adolescent with cancer in the perspective of sexuality. The research had as focus the Hospital de Clínicas de Porto Alegre, in the Inrternment Unit of Pediatric Oncology. Counting to the participation of six teenagers, aged 14 to 18 years, the collection of information occurred through the creative Sensitive Method, starting with the following dynamics: Mental Mirror, Collective Text, Get an adolescent and Rain of Words, from July 2012. It was chosen for the use of hermeneutics as a method of interpretation of information, establishing four categories: Body image and way of being in the world; Sexuality; Limits and possibilities; From denial to acceptance; and Lessons of Life: the existing corporeity. Because of that, this study revealed the facticity of the disease, and its existence beyond the disease, from the comprehensive look, demonstrating the wealth of the world experienced by adolescents, providing deep reflection to the attention and the action exerted on themselves to preserve and cultivate life with responsibility, autonomous and free, making them protagonists of their permanent care, as human beings in the world. As well, sexuality can be observed in different situations and expressions, which proves that teens with cancer maintain within themselves the essence of being teenagers in the world. Under the look of nursing, this study came to qualify the care, establishing a link, knowing and rediscovering the process of adolescence in health care for adolescents with cancer. Key-words: Cancer, Teen, corporeity and Sexuality. LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1 – Riqueza das informações ..................................................................................... 37 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................... 12 2 OBJETIVO...................................................................................................................... 16 3 REVISÃO DE LITERATURA ....................................................................................... 17 3.1 CÂNCER: BREVE CONTEXTUALIZAÇÃO ............................................................... 17 3.2 CONSTRUINDO A CORPOREIDADE DO SER ADOLESCENTE COM CÂNCER ... 21 3.3 O CUIDADO DE ENFERMAGEM AO SER ADOLESCENTE COM CÂNCER NO QUE TANGE A VIVÊNCIA DE SUA SEXUALIDADE .................................................... 25 4 METODOLOGIA ........................................................................................................... 28 4.1 TIPO DE PESQUISA..................................................................................................... 28 4.2 CONTEXTO DA PESQUISA ....................................................................................... 29 4.3 INFORMANTES DA PESQUISA ................................................................................. 30 4.4 COLETA DAS INFORMAÇÕES .................................................................................. 31 4.5 INTERPRETAÇÃO DAS INFORMAÇÕES .................................................................. 34 4.6 ASPECTOS ÉTICOS ..................................................................................................... 36 5 RESULTADOS ............................................................................................................... 37 5.1 IMAGEM CORPORAL E MODO DE SER-NO-MUNDO ............................................ 37 5.2 SEXUALIDADE: LIMITES E POSSIBILIDADES ....................................................... 48 5.3 DA NEGAÇÃO AO ACEITE ........................................................................................ 53 5.4 LIÇÕES DE VIDA: A CORPOREIDADE EXISTENTE ............................................... 58 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................................... 61 REFERÊNCIAS ................................................................................................................. 66 APÊNDICE A – DIÁRIO DE CAMPO............................................................................. 74 APÊNDICE B – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO ........... 75 APÊNDICE C – IDENTIFICAÇÃO DOS INFORMANTES .......................................... 77 ANEXO A – DINÂMICA DO ESPELHO MENTAL ....................................................... 78 ANEXO B – DINÂMICA DO TEXTO COLETIVO ........................................................ 79 ANEXO C – DINÂMICA DO ADOLESCER ................................................................... 80 ANEXO D – DINÂMICA CHUVA DE PALAVRAS ....................................................... 81 ANEXO E – PARECER DA COMISSÃO DE PESQUISA DA ESCOLA DE ENFERMAGEM DA UFRGS – COMPESQ .................................................................... 82 ANEXO F – PARECER DO COMITE DE ÉTICA DO HOSPITAL DE CLÍNICAS .... 83 12 1 INTRODUÇÃO Vislumbrar a trajetória ao encontro da corporeidade do ser adolescente com câncer, por meio da vivência e interpretação acerca da temática, na esfera individual, familiar e social, envolve fatores relacionados ao processo de adolescer. Esse processo, além de ser prazeroso, é dinâmico, pois cada um é, na sua essência única, um ser com relações e características próprias, permeadas por valores e crenças culturais que norteiam os modos de pensar, agir e conduzir situações do seu cotidiano. Ao mesmo tempo, os adolescentes são repletos de surpresas, sonhos, medos, anseios e dúvidas em relação às modificações e características dessa fase de seu desenvolvimento humano. Além disso, por conta de sua maneira de ver e vivenciar a sua vida necessita de um olhar mais sensível e atencioso. Este estudo significou adentrar nesse mundo permeado de improbabilidades, estereótipos e sofrimentos. Foi uma oportunidade para refletir sobre a complexa experiência do adoecer do ser adolescente com câncer, além de permitir o incremento de novas propostas que visem à qualidade de vida, de acordo com a realidade de cada sujeito sensível. Assim, surgiu o interesse de desvelarem-se algumas das minhas inquietações pessoais e profissionais no que tange a corporeidade do ser adolescente. Essas inquietações surgiram durante toda minha formação acadêmica, por meio de projetos de extensão com adolescentes “saudáveis”, os quais se preocupam com a sua imagem corporal, modificações e transformações próprias desta fase da vida. A opção por estudar os adolescentes com câncer deve-se ao fato de eles pertencerem a um grupo, em sua maioria, inviabilizados pelas praticas de saúde. A convivência diária com um familiar oncológico possibilitou a percepção das mudanças e alterações que esta doença acarreta. Contudo, emergiu um questionamento: como um adolescente, que está passando por uma fase de tantas modificações, atravessa mais estas provações? Durante a adolescência, este indivíduo encontra-se em uma fase evolutiva, na qual constrói a sua individualidade e personalidade, preparando-se para o exercício pleno de sua autonomia, com muitas expectativas no que diz respeito ao corpo adulto, capacidade reprodutiva, identidade sexual, responsabilidade, independência, maturidade emocional e escolha profissional. Frente a essa condição humana, na qual o adolescente encontra-se comprometido, o câncer torna-se um empecilho, dificultando o seu processo de adolescer. Diante disso, o câncer é visto como um fator desorganizador em função do qual o adolescente sofre uma ruptura significativa no seu processo de crescimento e 13 desenvolvimento, precisando redimensionar-se como ser-no-mundo1 (MOTTA, 2004). A doença e a hospitalização geram ansiedade e desorganização na percepção, compreensão e emoção do seu ser em relação ao mundo, a suas expectativas e sonhos. Assim, esse indivíduo modifica sua maneira de ser, ver e sentir esse mundo, numa perspectiva individual, familiar e social, na qual a confirmação do diagnóstico e, posteriormente, a terapia a ser utilizada e o sucesso ou não do tratamento fazem surgir uma expectativa particular para cada membro envolvido neste processo. A vulnerabilidade2 desta faixa etária requer um cuidado mais amplo e sensível, sendo que os agravos desse sintoma são determinados pelo processo de crescimento e desenvolvimento, bem como as características psicológicas peculiares dessa fase da vida, além do contexto social em que o sujeito está inserido. Tudo isso coloca o adolescente na condição de maior suscetibilidade às mais diferentes situações de risco (KOBAYASHI, 2006). Assim, os profissionais da área da saúde precisam tentar compreender as particularidades e necessidades de cada ser humano envolvido no processo para que, posteriormente a essa interação, proporcionem um cuidado efetivo junto aos adolescentes que necessitam de atenção especial. Dessa forma, esta pesquisa veio ao encontro de um cuidado que considera e valoriza as pessoas envolvidas, promovendo o esclarecimento de dúvidas e a busca da compreensão e articulação das possíveis ações sobre a sexualidade e a sua visão de corporeidade nesta etapa do desenvolvimento humano. Ressalta-se o olhar para sexualidade, pois a identidade constitui-se como fator central do gênero, tendo-se em vista a identificação como processo constante de mudança, e também nas suas implicações para a experiência da vida sexual. A sexualidade é algo que se constrói e se aprende, sendo parte integrante do desenvolvimento da personalidade, capaz de interferir no processo de aprendizagem, na saúde mental e física do indivíduo (BRÊTAS, 2004). 1 Expressão utilizada na visão da fenomenologia, a qual, em sua raiz etimológica, significa “o que se mostra”, “o que aparece à luz”, “cujo ser consiste, neste seu mostrar-se”, e de “logos”, que significa “discurso esclarecedor” TERRA et al., 2006). 2 O conceito de vulnerabilidade está relacionado à chance que o indivíduo possui de se expor a determinado evento e adoecer, sendo esse o resultado de um conjunto de aspectos de ordem individual, coletiva, contextual que acarretam maior ou menor susceptibilidade aos agravos, simultaneamente, à possibilidade de recursos para o seu enfrentamento. A esse conceito, articulam-se três componentes: Individual: relaciona-se com o tipo de informação que a pessoa tem, a qualidade e a capacidade de assimilar essa informação e de incorporá-la em seu cotidiano, tendo a possibilidade de transformá-la em ações de proteção; Social: obtenção das informações, as possibilidades de metabolizá-las e o poder de incorporá-las a mudanças práticas, as quais não dependem somente do indivíduo, mas do conjunto de acessos e possibilidades para usufruir seu potencial de escolha. Programático: modo de efetivar uma escolha, ou seja, a existência dos meios voltados para garantir e otimizar a necessidade (AYRES et al., 2003). 14 Ao falar-se de saúde mental e física do adolescente, não pode-se deixar de estudar o corpo, que é o elo do homem com o mundo. A percepção da corporeidade é complemento para a compreensão do ser-no-mundo, sendo que, no corpo doente, desapareceu o poder de projetar diante de si um mundo sexual, tornando o contato estreito, produzindo um sentimento vago e nunca suficiente para “acionar” a conduta sexual (MERLEAU-PONTY, 2006). Assim, a sexualidade passou a ser reconhecido como construção social, efeito dos padrões culturais num período cuja face social não é um fenômeno homogêneo, o que leva a considerar que há diferentes adolescências moldadas por processos sociais distintos (BRÊTAS et al., 2011). Atenta-se que quando se deseja ter uma atuação eficaz no cuidado à saúde, é aconselhável se desenvolver uma visão mais abrangente para a compreensão das demandas e das ações a serem desenvolvidas. No cuidado com o adolescente, está intrínseca uma maior mobilidade, sendo que as ações de saúde devem estar vinculadas à capacidade de se construírem ações conjuntas: adolescentes e serviços de saúde. Cada adolescente deve ser compreendido como um sujeito único, que, como irá observar no andamento deste estudo, se dispunha de acordo com a sua história de vida, seus valores e processos atuais de subjetivação. Assim, abdica a existência de uma adolescência universal e estática, passando a construir e reconstruir diferentes hábitos e culturas ao vivenciar uma experiência em comum: o adoecimento. Entretanto, cabe ao profissional envolvido desenvolver uma escuta sensível, para interpretar e observar todas as reações presentes. As dinâmicas de criatividade e sensibilidade desenvolvidas serviram como base para as reflexões, discussões coletivas, entre outros fatores, como o acolhimento e apresentação dos informantes do grupo, os elos de amizades construídos, os sorrisos antes encabulados, mas que se mostraram mais esperançosos e, enfim, a construção de um novo conhecimento, o qual faz refletir sobre as inúmeras vezes que reclamamos da vida, sendo que quem realmente teria motivo para isso, sorri. Sensibilizados do quanto o câncer interfere na saúde e na qualidade de vida das pessoas, impossibilitando-as, muitas vezes, para o trabalho, lazer e até para a sua vida sexual, considera-se importante ampliar o conhecimento nesta área, assim como as pesquisas com a visão do ser adolescente com câncer, tendo-se em vista que apenas algumas obras citam superficialmente o câncer em adolescentes, mas agrupado ao câncer infantil ou adulto. O objetivo de proceder diferentemente é uma tentativa de entender o mundo do adolescente, para então planejar e executar ações que possam favorecer a prevenção de agravos e a promoção da saúde dessa população específica. 15 Com base nessas considerações, o problema de pesquisa que norteou esta investigação está baseado na seguinte questionamento: “Quais são as percepções da construção3 da corporeidade do adolescente com câncer acerca de sua sexualidade?”. A partir deste questionamento, pretendeu-se oferecer futuros subsídios para o aprimoramento do cuidado à saúde, com o objetivo de uma reflexão acerca da percepção como forma de expressão de vida de cada adolescente que trilha uma visão holística do ser humano. 3 Construção corporal da consciência de si e da expressividade relacional, vivendo o corpo como trabalho e lazer, como gesto, harmonia, arte e espetáculo. 0 homem é uma autoconstrução corporal, implica numa autocriação, em que não se supõe duas pegas anteriores, o homem e o mundo, mas a autoconstrução do que se chama ser-do-mundo, ou simplesmente existência humana (SANTIN,2003). 16 2 OBJETIVO Conhecer as percepções do ser adolescente com câncer sobre a corporeidade na perspectiva da sexualidade. 17 3 REVISÃO DE LITERATURA A revisão de literatura enfoca pontos do processo de adolescer, com vistas a embasar este estudo. Para tal fim, são abordados aspectos relacionados ao câncer: breve contextualização, as possibilidades de ser e viver a corporeidade do ser adolescente com câncer e o cuidado de enfermagem. 3.1 CÂNCER: BREVE CONTEXTUALIZAÇÃO A palavra câncer tem sua origem no latim, a qual significa caranguejo, pois as semelhanças devem-se às veias intumescidas que envolvem o tumor, semelhante às patas do animal. Desde a Antiguidade, ou seja, em meados de 1200 a.C., em papiros egípcios, já se encontram referências a respeito dessa patologia, mas foi somente em 1838 que essa definição foi concedida, sendo definida como o aumento desordenado e autônomo de células, com competência para se espelharem de forma ilimitada e sem finalidades pelo organismo (SCOTT, 2002; DE VITA, HELLMAN, ROSENBERG, 2002). Nos dias atuais, apesar dos grandes avanços da Medicina no que se refere aos procedimentos realizados para o tratamento das doenças terminais, o câncer ainda é uma patologia que se reveste de estigmas, sendo quase sempre associado a uma sentença de morte. O câncer ocorre de forma inesperada em algum momento da vida, e a pessoa por ele acometida dificilmente encontra-se preparada para receber um diagnóstico que venha a interferir em seus hábitos, costumes, integridade física e ciclo biológico (SOUZA et al., 2009). Nesse aspecto, o câncer é o nome dado a um conjunto de mais de 100 doenças que têm em comum o crescimento desordenado de células que invadem os tecidos e órgãos, podendo espalhar-se para outras regiões do corpo. Dividindo-se rapidamente, estas células tendem a ser agressivas e incontroláveis, determinando a formação de tumores ou neoplasias malignas (BRASIL, 2011). O câncer é responsável por cerca de 13% de todas as causas de óbito no mundo. Frente a isso, compreender e controlar as doenças malignas requer conhecimentos científicos e experiências que vão desde informações sobre os complexos mecanismos de regulação molecular intracelular, até as escolhas individuais do estilo de vida. Também se exige uma gestão competente e o melhor uso dos recursos disponíveis para o planejamento, execução e avaliação das estratégias de controle da doença (INCA, 2009). 18 Nas últimas décadas, o câncer ganhou uma dimensão maior, convertendo-se em um evidente problema de saúde pública mundial. A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que, no ano de 2030, podem-se esperar 27 milhões de casos incidentes de câncer, 17 milhões de mortes por câncer e 75 milhões de pessoas vivas com câncer (INCA, 2011). No Brasil, as estimativas para o ano de 2012/2013 apontam a ocorrência de aproximadamente 518.510 novos casos da doença. Os tipos mais incidentes serão os cânceres de pele não melanoma, próstata, pulmão, cólon e reto, e estômago para o sexo masculino; e os cânceres de pele não melanoma, mama, colo do útero, cólon e reto, e glândula tireoide para o sexo feminino. Espera-se um total de 257.870 casos novos para o sexo masculino e 260.640 para o sexo feminino (INCA, 2011). Com base no Instituto Nacional de Câncer – INCA (2011), o principal componente na vigilância epidemiológica do câncer é representado pelo acompanhamento contínuo da incidência da doença regionalmente. Tal atividade é realizada por meio dos Registros de Câncer de Base Populacional (RCBP). No Brasil, existem atualmente 19 RCBP, os quais possuem informações consolidadas, isto é, pelo menos um ano de informação sobre casos novos (incidência), interligados por uma rede de 260 Registros Hospitalares de Câncer (RHC), na qual se consolida o sistema de morbidade que, por conseguinte, agrega-se ao sistema nacional de informações sobre mortalidade. Quando se refere à fase infanto-juvenil, verifica-se que, segundo dados do Instituto Nacional de Câncer, estima-se que a incidência dos tumores pediátricos no mundo varia de 1% a 3% do total de casos de câncer, sendo que o percentual no Brasil encontra-se em 3%, com estimativa para o ano de 2012 de 384.340 novos casos. Depreende-se, portanto, que ocorrerão cerca de 11.530 casos novos em crianças e adolescentes até 19 anos de idade (INCA, 2011). Assim como em países desenvolvidos, no Brasil, o câncer já representa a segunda causa de mortalidade proporcional entre crianças e adolescentes de 1 a 19 anos, para todas as regiões. A primeira causa está relacionada aos acidentes e à violência, sendo que o câncer é a primeira causa de morte por doença, após um ano de idade, até o final da adolescência. Dessa forma, as ações específicas do setor saúde, como organização da rede de atenção e desenvolvimento das estratégias de diagnóstico e tratamento oportunos, revestem-se de importância fundamental para o controle dessa situação e o alcance de melhores resultados (BRASIL, 2011). Paralelamente a isso, o progresso no desenvolvimento do tratamento do câncer infanto-juvenil foi espetacular nas últimas quatro décadas. Estima-se que em torno de 80% 19 dos adolescentes acometidos por esta patologia podem ser curados se diagnosticados precocemente e tratados em centros especializados (BRASIL, 2011). De acordo com Beltrão, Vasconcelos e Araújo (2011), nessa faixa etária, as neoplasias que mais agridem estão relacionadas ao sistema sanguíneo e tecidos de sustentação e, na maioria das vezes, são de natureza embrionária, constituídas de células indiferenciadas. Mas vale destacar que a maioria das suas causas ainda é desconhecida, o que difere dos tumores em adultos, os quais possuem expressivos fatores de riscos relacionados. Da mesma forma, um número significativo de casos de câncer pediátrico está associado a alterações genéticas, assim como seus sinais e sintomas podem ser confundidos com diversas patologias pediátricas (BRASIL, 2011). Assim, o câncer infanto-juvenil deve ser estudado separadamente do câncer do adulto, por apresentar diferenças nos locais primários, origens histológicas e comportamentos clínicos. Do ponto de vista clínico, os tumores pediátricos apresentam menores períodos de latência, em geral crescem rapidamente e são mais invasivos; porém, respondem melhor ao tratamento e são considerados de bom prognóstico (INCA, 2009). A associação entre fatores de risco e o câncer infanto-juvenil ainda não está totalmente estabelecida. Em geral, pouco se conhece sobre a sua etiologia, principalmente por sua raridade, o que limita o poder estatístico de alguns estudos. Em razão de seu curto período de latência, as exposições durante a vida intrauterina são o fator de risco mais conhecido na etiologia desse grupo de neoplasias (INCA, 2011). O câncer infantil pode envolver manifestações comuns a outras doenças desta faixa etária, como pode-se observar nas falas de Azevedo, Fentanes e Pereira (2006), os quais relatam o aparecimento de alguns sinais como palidez, massas palpáveis, dor óssea, febre de origem desconhecida e transtornos neurológicos. Esses sinais e sintomas presentes em diversas patologias podem camuflar e adiar o diagnóstico e tratamento da neoplasia. Por isso, é importante observar e estar atento a qualquer alteração que a criança/adolescente vier a sofrer. Conforme esclarecem Smeltzer e Bare (2002), o tratamento é baseado em três metas reais e alcançáveis: a erradicação completa da doença; o prolongamento da sobrevida e a contenção da célula cancerosa e/ou alívio dos sintomas associados. Corroborando com esta ideia, visualiza-se em Camargo e Kurashima (2007) que o tratamento nesta fase da vida apresenta dois objetivos: aumentar as taxas de sobrevida, minimizando os efeitos tardios do tratamento e reintegrar o adolescente na sociedade com qualidade de vida. 20 A Política Nacional de Atenção Oncológica, incorporada pela Portaria nº 2.048, de 3 de setembro de 2009, propõe o controle do câncer e considera vários componentes, desde as ações voltadas à prevenção, até a assistência de alta complexidade, integradas em redes de atenção oncológica, com o objetivo de reduzir a incidência e a mortalidade por câncer (INCA, 2009). Diante desse cenário, fica clara a necessidade da continuidade em investimentos no desenvolvimento de ações abrangentes para o controle do câncer, nos diferentes níveis de atuação, tais como: promoção da saúde, detecção precoce, assistência aos pacientes, vigilância, formação de recursos humanos, comunicação e mobilização social, pesquisa e gestão do Sistema Único de Saúde (SUS) (INCA, 2009). Essas ações são pautadas não somente na cura biológica, mas também no bem-estar e na qualidade de vida do adolescente e sua família, atos necessários para uma reabilitação de qualidade nesta fase repleta de significações. Desta forma, emergiram neste estudo as seguintes patologias que acometem os adolescentes:  Leucemia Linfóide Aguda (LLA) – A leucemia é uma doença maligna dos glóbulos brancos (leucócitos), geralmente de origem desconhecida, tendo como principal característica o acúmulo de células jovens anormais na medula óssea, que substituem as células sanguíneas normais. A medula é o local de formação das células sanguíneas e ocupa a cavidade dos ossos, sendo popularmente conhecida por tutano. Nela, são encontradas as células que dão origem aos glóbulos brancos, aos glóbulos vermelhos (hemácias ou eritrócitos) e às plaquetas. Essa leucemia (LLA) afeta células linfoides e agrava-se rapidamente, sendo o tipo mais comum em crianças pequenas, embora ocorra também em adultos (INCA, 2012). No Brasil, o seu percentual fica em torno de 29%, em que acomete mais a faixa etária de 1 a 4 anos de idade, com cerca de 31% dos casos, assemelhando-se aos resultados encontrados em países desenvolvidos (INCA, 2008).  Rabdomiossarcoma – tumor canceroso que se origina nos tecidos moles do corpo, incluindo músculos, tendões e tecidos conjuntivos. Os locais mais comuns para este tumor ser encontrado incluem a cabeça, pescoço, bexiga, vagina, braços, pernas e tronco. Rabdomiossarcoma também podem ser encontradas em locais onde os músculos esqueléticos estão ausentes ou muito pequenos, como na próstata, ouvido médio ou o sistema do ducto biliar. As células cancerosas associadas a esta doença podem se espalhar (metástase) para outras áreas do corpo. Existem dois tipos de Rabdomiossarcoma: o embrionário, que ocorre em crianças menores de 6 anos de idade; e o alveolar, recorrente em crianças mais velhas e é 21 responsável por cerca de 20 % de todos os casos. Esta doença afeta pessoas entre as idades de 2 a 25 anos de idade, mas pode ocorrer em qualquer idade. Por razões desconhecidas, o sexo masculino é o mais afetado (MORETTI; GUIMARRÃES; OLIVEIRA; SANJAR; VOEGELS, 2010).  Tumor de Ewing – compreende um espectro de neoplasias de células neuroectodérmicas primitivas, que são células embrionárias que migram da crista neural. Esses tumores acometem primariamente osso e tecido mole. Dependendo do grau de diferenciação neural, são denominados Sarcoma de Ewing quando se trata de um tumor indiferenciado, ou Tumor Neuroectodérmico Primitivo Periférico (PPNET), quando apresenta características de diferenciação neural. A localização mais comum é nos ossos, sendo 80% Sarcoma de Ewing e 20% PPNET. Na família de Sarcoma de Ewing, os ossos longos e chatos são igualmente acometidos (INCA, 2012).  Tumor Ósseo – O osteossarcoma é o mais comum dos tumores malignos primários dos ossos, incidindo, principalmente, em crianças e adultos jovens, podendo ocorrer em qualquer osso ou mesmo em partes moles; mas, na maioria das vezes, acomete o úmero, a tíbia proximal e o fêmur distal (INCA, 2012). Por isso, o processo de compreensão do mundo vivido implica de forma específica na descrição daquele fenômeno em sua existência – neste estudo, o câncer. Resgatando a sua contextualização, refletindo na experiência e no conhecimento das patologias que acometem esses adolescentes, esse movimento torna-se extremamente significativo. 3.2 CONSTRUINDO A CORPOREIDADE DO SER ADOLESCENTE COM CÂNCER “O adolescente, em contraposição à criança é um indivíduo que reflete fora do presente.” (J. Piagent) Compreender a corporeidade do ser adolescente com câncer requer uma visão mais ampla do próprio conceito de sexualidade e da forma como o adolescente vivencia essa fase da vida. Para Santin (2001), a corporeidade é a condição humana, ou seja, o modo de ser do homem. [...] Caracterizar o ser humano enquanto existência corporal não significa, entretanto, reduzi-lo ao estado de corpo físico ou material segundo o 22 conceito da ciência física, nem a idéia de um organismo vivo, definido pela biologia. A corporeidade se estende para além dos limites da física e da biologia. Ela alcança a esfera da consciência e do espírito; e, é bom lembrar, não exclui as possibilidades da transcendência. O que se pretende expor aqui é a não-aceitação de um corpo como recipiente de uma consciência ou de um espírito, mas entendê-lo dentro de um processo evolutivo cujo resultado é a compreensão de um corpo conscientizado e até espiritualizado (SANTIN, 2001, p. 123). Assim, o processo de adolescer é um período de mudanças intensas, repleto de transformações corporais, biológicas, psicossociais e espirituais, constituindo uma etapa decisiva por caracterizar-se como um momento de grandes transformações e descobertas, da busca constante pela conquista da independência, autonomia e da firmação da personalidade do adolescente (WAGNER.; CARPENEDO; MELO; SILVEIRA, 2005; ALMEIDA, CENTA, 2009). Além disso, caracteriza-se por diversas transformações, sendo as relacionadas ao campo da sexualidade as de maior repercussão. O aprendizado da sexualidade não se restringe à genitalidade, nem tampouco ao acontecimento da primeira relação sexual. Sua vivência engloba aspectos afetivos, eróticos e amorosos, relacionados à construção da identidade, à história de vida e a valores culturais, morais, sociais e religiosos de cada um (OLIVEIRA, CARVALHO, SILVA, 2008). Condorda-se com Wachs e Malavolta (2005, p.18) quando dizem ser o corpo “a primeira maneira de sermos no mundo. Pensar corporeidade e corpo – sujeito [...] justifica-se pelo fato de não termos um corpo, mas sim, sermos o nosso corpo”. Portanto, a expressão corporal está relacionada a toda uma significação da existência. Essa existência implica no reconhecimento das necessidades e características biológicas, psicológicas e sociais, as quais permeiam o processo de transição que marca a passagem da infância para a vida adulta. O adolescente é protagonista na construção do seu processo de vida pessoal e coletivo. Segundo critério cronológico proposto pela Organização Mundial de Saúde (OMS), essa é uma etapa da vida que vai dos 10 aos 20 anos incompletos. Durante esta etapa, subdividimos a mesma em adolescência inicial – dos 10 aos 13 anos, média – dos 14 aos 16 anos e final – dos 17 aos 20 anos (VITALLE, MEDEIROS, 2008). A concepção de corporeidade e do processo de adolescer possibilita que se mantenha o equilíbrio do conjunto, a noção ampliada do corpo, e as suas dimensões existentes, no que tange a sexualidade que, por sua vez, envolve gênero, identidade sexual, envolvimento emocional, amor e reprodução. A sexualidade é considerada como a energia da vida, experimentada ou expressa por meio de pensamentos, desejos, crenças, valores, atitudes, práticas, papéis e relacionamentos. Além disso, a sexualidade refere-se não somente às 23 capacidades reprodutivas do ser humano, mas envolve seu corpo, sua história, seus costumes, suas relações afetivas e sua cultura (ABRAMOVAY, CASTRO, SILVA, 2004). Assim, a sexualidade faz parte deste mundo de transformações e descobertas do adolescente e, quando acompanhada de uma doença oncológica, faz com que o adolescente vivencie outro mundo, permeado de ansiedade, medo e insegurança, podendo provocar desequilíbrios nesse processo. Isso pode ser visualizado nas ideias de Merleau Ponty, que mostra que os seres humanos são tanto objetos quanto sujeitos, sendo essencialmente corporificados, incorporados e, em certo sentido, identificados ao nosso corpo. Ou seja, não poderíamos ser parte do mundo se não fossemos criaturas corpóreas e, desta forma, objetos como qualquer outro. E como quaisquer objetos, reagiríamos às influências que as coisas exercem ao redor (MATTHEWS, 2010). Dessa forma, essas influências podem interferir significativamente neste campo, desde os aspectos psicológicos até o reprodutivo. Articular ações sobre as necessidades sexuais dos adolescentes durante o tratamento oncológico é importante para sua vida sexual e seus relacionamentos, mesmo quando as mudanças podem ser apenas temporárias. Conforme foi possível visualizar em estudos realizados acerca das percepções de pacientes com doença oncológica, constatou-se que a opção de dar voz aos pacientes com câncer proporciona a criação de vínculos entre a ação de profissionais de saúde e o pensar e fazer cotidianos da população (FABBRO, MONTRONE, SANTOS, 2008). Nesse sentido, verifica-se, nos ensinamentos de Merleau Ponty, que falar sobre a intencionalidade ou subjetividade é, portanto, falar sobre um modo de explicar o comportamento segundo características internas, que se direcionam essencialmente para certos objetos, que apresentam significados (MATTHEWS, 2010). Seguindo este pensamento, o adolescente com diagnóstico de câncer se vê envolto por sentimentos nem sempre percebidos pela equipe de saúde, como o medo da mutilação, da dor, da perda das funções e da morte, além, é claro, das interferências aparentes nas mudanças do corpo, ou seja, a sua preocupação com a imagem corporal. Tal preocupação está vinculada ao conceito de corpo saudável ou bonito e aos padrões de estética, associando-os à imagem de poder e beleza. Tais inquietações podem vir se alterando, no decorrer do tratamento, devido às reações que o mesmo pode vir a provocar. Ao assumir-se como corpo “doente”, o adolescente precisa reaprender a ver, sentir, ouvir o seu próprio corpo, vencendo os desafios na recriação da realidade imposta pela doença. E ao falar de corpo, o referencial filosófico de Merleau Ponty (2006) destaca sua importância, sendo este o veículo do ser-no-mundo. Seguindo neste pensamento, Santin 24 (2001) afirma que o corpo é uma questão necessária para se existir no tempo e no espaço, pois com ele é possível sonhar, brincar e viver. A corporeidade torna-se condição humana, a maneira de ser do homem e a sua expressão corporal, ou seja, “a corporeidade caracteriza o especificamente humano da existência do homem, não significa que se reduza ao corpo individual. Ao contrário, a ideia de corporeidade implica uma vinculação, não só com os outros corpos, mas também com o mundo” (SANTIN, 2001, p. 124). O adolescente em busca de um novo papel no mundo em que vive passa por alguns lutos até chegar à identidade adulta: a perda do corpo infantil com toda a sua harmonia e o reconhecimento que possui desse corpo; a perda dos pais da infância, para o surgimento de novos pais, os quais não são mais considerados “heróis”; a perda da identidade e do papel social infantil (VITALLE, MEDEIROS, 2008). Considerando-se as características relacionadas à percepção de prazer que está presente desde a vida intrauterina, além das primeiras experiências e relações no mundo com o próprio corpo, a percepção do outro, as demandas, os desejos, as expectativas, os ideais, os conflitos, o prazer e o desprazer constituem marcas importantes que serão significativas e ressignificadas em diferentes momentos da construção da vida do sujeito. Assim, a imagem do corpo não se forma mais do confronto entre sujeito e objeto, mas da figura de uma mão que toca a outra mão, ou da circunstância de que o corpo é, ao mesmo tempo, vidente e visto (SANTIN, 2001). Deste modo, o adolescente vê-se imerso em novas situações e características, as quais podem trazer frustrações por se sentirem feios e desajeitados. Essas alusões podem ser elencadas nas falas de Heilborn (2006), que aborda a sexualidade como sendo universal aos seres humanos. No entanto, sua construção acontece de acordo com as significações que integram cada grupo social específico – neste caso, os adolescentes – sendo um processo essencial às múltiplas e diferentes socializações que os indivíduos experimentam na sua vida, com a família, escola, os meios de comunicação, entre outros. Em suma, a imagem corporal – a sua corporeidade – é a representação de como a pessoa se imagina, vê e sente. É a sua autoaceitação, desempenhando um papel importante na consciência de si, na sua autoestima e autovalorização. Diante disso, é necessário um suporte emocional especializado que deverá ser continuamente oferecido, visando o respeito e o cuidado, bem como, mostrando que a corporeidade é o estilo de viver. 25 3.3 O CUIDADO DE ENFERMAGEM AO SER ADOLESCENTE COM CÂNCER NO QUE TANGE A VIVÊNCIA DE SUA SEXUALIDADE “Não importa o que puder fazer, ou sonhe que possa fazer, comece. A audácia contém gênio, poder e mágica." (Goethe) A percepção a respeito do cuidado se faz muito além do cuidar como atividade ou tarefa realizada no sentido de tratar uma ferida, aliviar um desconforto. O cuidado deve ser visto como “uma forma de expressão, de relacionamento com o ser e com o mundo, enfim, como uma forma de viver plenamente”, por meio “de uma atitude ética em que seres humanos percebem e reconhecem os direitos uns dos outros. Pessoas se relacionam numa forma de promover o crescimento e o bem-estar da outra” (WALDON, 2001, p. 17, p. 43). Assim, a essência da atuação do profissional enfermeiro é a arte de cuidar, ou seja, estabelecer um cuidado sistematizado, holístico às pessoas que estão sob seus cuidados. Para isso, o enfermeiro lança mão de alguns instrumentos, como a comunicação, observação, habilidade manual e conhecimento científico. Além dos movimentos corporais no tempo e no espaço em direção ao outro, o profissional da saúde permite que seu corpo fale, que se expresse verbalmente, por gestos e corporalmente, para que componha na expressão a harmonia das relações interpessoais no processo de cuidado. Este corpo que fala e pensa, em prol do cuidado ao outro ser humano, se faz presente pela percepção, expressão, linguagem, mediante a intercorporeidade. Neste sentido, Siqueira et al. (2006) enfatizam que a comunicação é essencial ao cuidado; mas para isso, o profissional deve estar capacitado para reconhecer a influência mútua entre enfermeiro-paciente-família. É dessa forma que estabelece atitudes de sensibilidade e empatia entre os membros envolvidos. Essas atitudes possibilitam que o profissional enfermeiro desenvolva ações em conjunto, proporcionando o bem-estar dos membros envolvidos no processo de cuidado, desenvolvendo o estímulo da participação do cuidado, ultrapassando o cuidado técnico e científico, principalmente quando o mesmo ocorre em um ambiente que exige alta complexidade, como é o caso das Unidades de Internação Oncológica. Nesses locais, muitas vezes, o cuidar torna-se mecânico, favorecendo, em alguns momentos, o descomprometimento da equipe frente aos sentimentos dos pacientes e de seus familiares. Assim, há uma desvalorização do cuidado. 26 A abordagem do cuidado é fundamental, sendo preciso direcionar o olhar para o adolescente, aceitá-lo, visualizá-lo, reconhecer as suas possibilidades, limites e quais forças são capazes de mobilizar para se autocuidar. Portanto, este cuidado integral demanda uma atitude aberta e flexível dos profissionais, para que o mesmo se torne afetuoso, eficiente e eficaz (ISSI, SCHENKEL, LATUADA, 2006), entrelaçando a consciência de sua corporeidade, a qual resulta em mudanças na forma de pensar, sentir, agir em relação ao outro corpo. Ou seja, profissionais da área da saúde e adolescentes devem voltar seu pensar para um agir partilhado, que exige o sair de si em direção ao outro, de modo que todas as preocupações, medos e ansiedades sejam revelados em solicitude. Esta atitude revela aproximação, possibilitando crescimento para ambos e o surgimento da intercorporeidade, o que representa a superação do em si, ou do para si. Propicia o coexistir da racionalidade e sensibilidade nas práticas do cuidar. Expressa o exercício contínuo de deixar de ser “em si” para se transformar em “nós”. No momento em que o corpo cuidado torna-se sujeito do processo de cuidar, a dimensão subjetiva permite falar da estética, da importância de se estar junto no cuidado com o corpo (POLAK, 1996; SANTANA, JORGE, 2007). Neste sentido, a equipe de saúde, ao sistematizar o cuidado, além de verificar as necessidades para então planejar as suas ações, também possibilita uma maior interação e efetivação do vínculo entre quem cuida, a família e o adolescente hospitalizado, o que valoriza o diálogo e a comunicação entre as partes envolvidas. Segundo Lúcio et al. (2008), o diálogo faz parte do processo de comunicação e é essencial na relação enfermeiro-familiar-adolescente, podendo se manifestar de várias maneiras: exercendo influência direta no cuidado, tornando-se uma relação de aproximação e distanciamento, troca de sentimentos e sensações. Para tanto, tem como suposição o encontro, a relação, presença, chamado e resposta, entre outros fatores. Observa-se que é por meio do diálogo e da comunicação, seja ela verbal ou apenas por expressões, que se criam vínculos, se fortalecem relações de confiança, amizade. Além disso, esses são os meios para formular e reformular ideias e conceitos que servem para os envolvidos se analisarem e proporem ações que realmente atendam suas necessidades. Buscando o conhecimento, o profissional enfermeiro retoma a sua prática, assume um comportamento com iniciativa, vontade e espírito. Os comportamentos criam significações na medida em que o ensinamento é compreendido. Desta forma, adquirem significado de aprendizagem, aptidão de modificar a realidade vivida dos adolescentes com câncer, desenvolvendo a visibilidade de seu fazer específico e a construção da autonomia no seu cotidiano. 27 Verifica-se, nas palavras de Albini e Labronici (2007, p. 303), inspiradas em MerleauPonty, que mudar a forma de estar-no-mundo não é fácil, exige primeiramente percepção e consciência de si mesmo, para poder existir um relacionamento com o outro e com o mundo. Tudo aquilo que somos, nós o somos sobre a base de uma situação de fato que fazemos nossa, e que transformamos sem cessar por uma espécie de regulagem que nunca é uma liberdade incondicionada. (ALBINI E LABRONICI, 2007, p. 303) Ou seja, o profissional da saúde, ao ter conhecimento sobre aspectos relacionados ao cuidado, procura se conhecer para poder conhecer o outro e para estar ciente do seu papel como participante do processo de cuidar (GUARESCHI, PINTO, 2007). O profissional enfermeiro é responsável pela educação continuada de sua equipe, ajudando-a a perceber o acompanhante não apenas como um coparticipante, mas como foco, como parte integrante do cuidado de enfermagem, agindo com reforço positivo, por meio das suas próprias atitudes (SOUZA; PANTALEÃO, 2004). Portanto, é importante que o enfermeiro sempre esteja ousando, inovando, transformando e ampliando a maneira de cuidar, pois muitas características e especificidades podem ser descobertas por meio do diálogo, da compreensão e interpretação das expressões não verbais, como um sorriso, um olhar, um aperto de mão. Sinais simples, mas muito significativos no que diz respeito ao cuidado. Proporcionar conhecimentos por meio de atividades lúdicas torna-se um processo prazeroso tanto para o profissional quanto para o adolescente no momento da troca de informações, potencializando o aprendizado e o cuidado. Com a sensibilidade e a criatividade, o indivíduo sente-se mais disposto a expor e verbalizar sua posição frente à determinada situação, neste estudo, a sua sexualidade, permitindo ao profissional estabelecer métodos capazes de auxiliá-lo a enfrentar suas dificuldades. Enfim, atuar junto aos adolescentes com câncer é utilizar todos esses artifícios, ou seja, o olhar, os gestos, as expressões. É se sentir parte fundamental na recuperação, pois é no profissional da área da saúde que muitos encontram o apoio que necessitam, o carinho que tanto almejam e, principalmente, é no mundo do hospital que esclarecem suas dúvidas e medos. Unindo todos esses aspectos, atuando em todos esses sentidos, é possível ver de maneira nítida a necessidade da atuação sensível e competente do profissional enfermeiro junto aos adolescentes com câncer, ou seja, de um cuidado integral. 28 4 METODOLOGIA Nesta seção, é apresentada, em sua essência, a forma como foi conduzido o desenrolar desta pesquisa, alicerçada na abordagem qualitativa, com enfoque fenomenológico. 4.1 TIPO DE PESQUISA O estudo caracterizou-se como qualitativo, com enfoque fenomenológico, o qual permitiu abranger a realidade visível e compreender os fenômenos e processos que estão atualizados no cotidiano do adolescente com câncer. Conforme Motta (1998), a fenomenologia procura atingir a profundeza dos fenômenos da existência, da experiência ativa da pessoa no mundo, por meio da observação direta da experiência subjetiva, integrando a consciência e a estrutura cognitivo-emocional-sensorial do nosso eu e do mundo que vemos. Além disso, tal metodologia proporciona a facilidade ao descrever a complexidade de um fenômeno e compreender processos dinâmicos experimentados por grupos sociais, o que contribui para o processo de mudança, criação e formação de opiniões. Dessa forma, permite, em maior grau de complexidade, a interpretação das particularidades, dos comportamentos ou atitudes dos indivíduos (OLIVEIRA, 2004). Enfatiza-se que a pesquisa qualitativa é essencial para o desenvolvimento do conhecimento nas áreas da saúde, sendo que o laboratório da investigação é a própria vida cotidiana (MORSE, 2003). A pesquisa qualitativa caracteriza-se por permitir ao pesquisador um delineamento flexível do estudo, possibilitando um ajuste ao que está sendo captado durante a coleta de informações. Apresenta um caráter holístico, visando à compreensão do todo, permitido o uso de várias estratégias para a coleta. Exige, também, o envolvimento do pesquisador, o qual se torna próprio instrumento da pesquisa, além de uma interpretação contínua para formulação de estratégias e para a finalização do trabalho de campo (POLIT, BECK, HUNGLER, 2001). Frente a isso, a fenomenologia consegue apreender o sentido dos acontecimentos existentes, no entrecruzamento das experiências vividas pelo corpo, na coexistência com os outros, por suas ações histórico-social-políticas, pelos sentimentos e afetos que vivencia, incluindo-se a sexualidade (MERLEAU-PONTY 2006). Portanto, para se conhecer as percepções que os adolescentes com câncer têm frente às questões da sua corporeidade na perspectiva da sexualidade dentro do contexto social que estão inseridos, fez-se fundamental a 29 abordagem fenomenológica na medida em que se buscou perceber a importância dada à questão e ao valor atribuído a ela dentro dos grupos sociais envolvidos no processo proposto. 4.2 CONTEXTO DA PESQUISA Este estudo foi realizado na Unidade de Internação Oncológica Pediátrica do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (3º Leste), no Município de Porto Alegre do Estado do Rio Grande do Sul. Trata-se de uma Empresa Pública de Direito Privado, criada pela Lei 5.604, de 2 de setembro de 1970. Integrante da rede de hospitais universitários do Ministério da Educação e vinculado academicamente à Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). O Hospital de Clínicas de Porto Alegre nasceu com a missão de oferecer serviços assistenciais à comunidade gaúcha, de ser um laboratório na área de ensino para a Universidade e de promover a realização de pesquisas científicas e tecnológicas (HCPA, 2011). A Unidade de Internação Oncológica Pediátrica possui 25 leitos. A faixa etária atendida é de dois meses a 18 anos incompletos. Caracteriza-se como unidade de cuidados semi-intensivos devido à instabilidade peculiar da criança com doença hemato-oncológica. As crianças e os adolescentes são distribuídos em seis enfermarias (três leitos em cada enfermaria), quatro quartos individuais (isolamentos e convênios) e três quartos na área restrita para os pacientes que necessitam de Transplante de Medula Óssea (TMO). A unidade recebe os pacientes que estão realizando exames para diagnóstico e/ou reestadiamento; pacientes com Quimioterapia (QT) prolongada ou de altas doses; pacientes em preparo para TMO autólogo, assim como durante e após a realização do mesmo; pacientes neutropênicos, plaquetopênicos com hemorragias severas; pancitopênicos; sépticos pós-QT; pacientes em pós-operatório de cirurgias oncológicas; pacientes em tratamento paliativo e em fase terminal (HCPA, 2010). A Unidade de Internação Oncológica Pediátrica atende o Sistema Único de Saúde (SUS) e convênios. Sua estrutura física contém: sala de expurgo; sala de nutrição; sala de equipamentos; sala de lanches; sala de prescrição; transplante de TMO; sala de enfermagem; sala de convivência; sala de procedimentos; copa; rouparia; central de ar condicionado;; higienização de materiais; DML depósito de materiais de limpeza; depósito de lixo; recreação e posto de enfermagem. A equipe de profissionais que atua junto a essa Unidade é composta por quatorze enfermeiros, uma residente e quarenta e um técnicos de enfermagem; seis médicos 30 contratados e um residente de R3; uma assistente social e um residente; uma nutricionista e uma residente; uma psicóloga e uma residente; uma farmacêutica e dois residentes; um professor de educação física; uma pedagoga e dois professores. Este local foi escolhido para desenvolver a pesquisa por se tratar de um hospital universitário, sendo de fácil acesso para a pesquisadora, além de ser considerado um local de produção e reprodução do conhecimento, contemplando o objetivo proposto. 4.3 INFORMANTES DA PESQUISA Os informantes foram seis adolescentes internados na Unidade de Internação Oncológica do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, no Estado do Rio Grande do Sul, no período de julho de 2012. A escolha dos participantes ocorreu por meio de informações coletadas junto à equipe de profissionais da área da saúde e pela manifestação de interesse dos adolescentes em participar do estudo. Os critérios para inclusão foram: – ser adolescente com idade entre 14 e 18 anos, o que engloba a adolescência média e tardia, de acordo com a definição da Organização Mundial de Saúde para a faixa etária entre 10 e 20 anos incompletos; – ter diagnóstico de neoplasia maligna. Os critérios de exclusão da pesquisa: – condições físicas e psicológicas que inviabilizassem a participação na coleta de informações; – estar em isolamento e/ou cuidados paliativos. Com a finalidade de manter o anonimato dos informantes do estudo, optou-se por identificar os mesmos pela letra A (adolescentes), seguida de número arábico sequencial – A1, A2, A3, A4, A5,A6. A seguir, apresentam-se algumas características dos adolescentes informantes deste estudo. Dos seis adolescentes, um residia na cidade de Porto Alegre, e os demais no interior do Estado do Rio Grande do Sul. Os informantes tinham de 14 a 18 anos de idade, a maioria, acompanhados por suas mães. No que diz respeito à escolaridade desses adolescentes, 4 encontravam-se cursando o ensino médio – 2° e 3° ano; uma adolescente parou seus estudos 31 na 6ª série devido à doença, e outro já havia concluído o ensino médio, preparando-se para prestar vestibular para Engenharia. O período de internação variou de três a dezessete dias, sendo que os diagnósticos variaram em: Leucemia Linfóide Aguda, acometendo três desses adolescentes; Rabdomiossarcoma, Tumor de Ewing, e Tumor Ósseo, cada uma dessas patologias acometendo um adolescente. Destaca-se que dois desses adolescentes apresentavam recidiva da doença, estando em tratamento entre três e quatro anos, ao passo que os demais apresentaram média de tratamento de quatro, cinco, oito e nove meses. Vale ressaltar que, para este estudo, participaram três adolescentes do sexo masculino e três do sexo feminino. Cada um possuindo características e interpretações próprias a respeito de como lidar com a sua patologia, encontrando no apoio familiar e na fé as respostas para as suas inquietações. Apenas uma das adolescentes demonstrou um pouco de receio/ medo em participar deste estudo, ocasião que fez com que a pesquisadora tenha lhe dedicado uma maior atenção por entender que a mesma encontrava-se em um momento de insegurança e revolta em relação à sua patologia. Frente a isso, esses informantes relataram seus sonhos e suas expectativas de vidas, tais como cursar faculdade e a intenção de ajudar outras pessoas com seus exemplos de como enfrentar esta fase complicada de suas vidas, demonstrando um extraordinário amadurecimento e transformando seus sofrimentos em lições de vida. 4.4 COLETA DAS INFORMAÇÕES A coleta e interpretação das informações consistem em um momento importante e exigem conhecimento e rigor científico. Neste estudo, foi utilizado o Método Criativo Sensível (MCS), que é apontado como um método que favorece a participação ativa dos informantes, sua interação e construção coletiva do conhecimento, bem como aproxima a enfermagem do seu objeto, o cuidado ao ser humano (RESTA, MOTTA, 2007). Este método é uma proposta inovadora de pesquisa em enfermagem e saúde, pois permite que os profissionais de saúde realizem, ao mesmo tempo, trabalho científico e enfoquem a subjetividade, aproximando-se mais dos informantes. Assim sendo, os mesmos são convidados a pensar, manifestar suas concepções e discuti-las. Desse modo, as informações e o conhecimento foram construídos por meio de discussões horizontais, com a interação entre os diversos atores sociais heterogêneos, o que viabilizou uma maior riqueza das informações coletadas, além de despertar a participação crítica-reflexiva nos adolescentes 32 envolvidos, sensibilizando-os para a corresponsabilidade sobre sua saúde e para a possível (re) construção de saberes. A coleta de informações obedeceu às etapas preconizadas pelo MCS e se realizou por meio do enlace da ciência com a arte, pois a principal finalidade foi estimular os adolescentes a expressarem sua subjetividade e criatividade. A ação foi a de criar um ambiente em que as discussões fossem dialógicas e os informantes fossem estimulados a abdicarem de sua condição de objetos e passassem a ser pessoas responsáveis pela produção do seu próprio conhecimento, sendo respeitada a dignidade e o saber que cada ser humano traz consigo. As dinâmicas do MCS são desenvolvidas por meio de uma variedade de técnicas grupais, podendo ser utilizadas as que mais se adéquam ao problema de pesquisa. A produção das informações emergiu das dinâmicas, servindo de embasamento para as reflexões e as discussões coletivas, com a possibilidade de validação das informações, mantendo-se a singularidade de cada informante que coletiviza suas experiências no grupo (RESTA, 2006). Na construção dessas ideias, utilizaram-se as etapas preconizadas pelo MCS, elaboradas por Cabral (2004), que aponta cinco momentos que devem ser desenvolvidos: – preparação do ambiente e acolhimento do grupo; – apresentação dos informantes; – explicação da dinâmica e as atividades individual e coletiva; – elaboração e apresentação das produções; – análise coletiva e validação das informações. Destaca-se que o vivido de cada participante é expresso pelo seu modo de ser, pela maneira como o mesmo se vê no mundo, o que reforça a ideia de Merleau Ponty (2006, p. 477) que diz que o comportamento e as falas “nunca tem exatamente o mesmo sentido para ele e para mim. Para ele, trata-se de situações vividas, para mim de situações apresentadas”. Frente a isso, os materiais produzidos e as observações tornaram-se fonte primária para a análise e interpretação das informações. As falas foram registradas pelo gravador digital e transcritas na íntegra, e as observações foram anotadas no diário de campo (APÊNDICE A), que consiste em uma ficha de anotações, com objetivo de anotar observações, impressões pessoais, resultados das dinâmicas, manifestações, expressões não verbais dos adolescentes, entre outras informações que a pesquisadora julgou necessárias. Para a produção das informações, foi objetivada a execução de quatro dinâmicas de 33 criatividade e sensibilidade, com duração de 60 minutos, em sala da Unidade e junto aos leitos dos adolescentes, além das anotações coletadas em diário de campo. As coletas foram realizadas em grupos – com três adolescentes, os quais realizaram todas as dinâmicas em dois dias. E individualmente, devido alternância dos dias de internação. É importante salientar que estas abordagens não influenciaram no desenvolvimento das atividades, pois ambas possibilitaram a oportunidade de se vivenciarem uma comunicação e entrosamento entre pesquisadora e adolescente, o que veio ao encontro dos objetivos esperados. As dinâmicas de Criatividade e Sensibilidade foram consideradas como adequadas para a produção do conhecimento a respeito da temática desenvolvida. Os horários e os dias das atividades foram marcados de acordo com a disponibilidade dos adolescentes internados na unidade e número de participantes, o que proporcionou uma maior interação e envolvimento entre eles e a pesquisadora. Assim, ressalva-se a organização deste estudo: No primeiro momento, a pesquisadora realizou um período de ambientação na Unidade de Internação Oncológica Pediátrica, com a finalidade de promover a sensibilização, conhecer o funcionamento desta unidade, bem como identificar e conhecer os futuros informantes da pesquisa. Isso se articula com a competência humana na sua dimensão ética e sócia afetiva, do respeito aos direitos e deveres de cada adolescente e família envolvidos nesse processo. Nesse momento, também foram realizados os convites para a participação na pesquisa, esclarecendo-se os objetivos do estudo, sua importância e entendimento por parte dos envolvidos. Assim, seguiram-se as dinâmicas de Criatividade e Sensibilidade. A primeira Dinâmica de Criatividade e Sensibilidade foi desenvolvida com a apresentação do projeto de pesquisa aos adolescentes e seus responsáveis, ressaltando-se os objetivos e a utilização do MCS. Na oportunidade, foi entregue o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (APÊNDICE B) e realizada a dinâmica denominada Rede para descontração e apresentação dos informantes além do entrosamento do grupo com a pesquisadora e o preenchimento da ficha de identificação dos adolescentes (APÊNDICE C). A seguir, os adolescentes foram convidados a participar da dinâmica do Espelho Mental (LOPES et al., 2001) (ANEXO A), que tem por objetivo fazer com que os participantes tomassem consciência da imagem do seu próprio corpo a partir da questão norteadora: “Quais são os significados e percepções sobre o seu corpo?”. Na segunda etapa, os adolescentes foram convidados a participar da dinâmica de descontração, denominada Mentalização (LOPES et al., 2001), a qual visa a facilitar o 34 processo de autoconhecimento; a seguir, realizou-se a dinâmica de Criatividade e Sensibilidade Texto Coletivo (ANEXO B), por intermédio da questão norteadora: “Quais são as nossas percepções sobre a sexualidade?”. A partir das atividades, os adolescentes construíram coletivamente um texto verbal que representava as percepções dos mesmos sobre como visualizavam a sexualidade nesta fase da vida. Na discussão grupal, tal relação ganhou mais destaque, pois os adolescentes tiveram a oportunidade de dividir com os demais informantes as suas histórias familiares, suas experiências neste campo, bem como o que entendiam sobre a sexualidade. Tal momento foi de muita riqueza para a coleta das informações. Na terceira etapa, os adolescentes interagiram por meio da dinâmica do Telefone Sem Fio (LOPES et al., 2001), a fim de facilitar a comunicação e o relacionamento, de forma respeitosa e responsável. Posteriormente, foram instigados, na Criatividade e Sensibilidade por meio da dinâmica de Adolescer (LOPES et al., 2001) (ANEXO C), a refletir sobre como percebem o processo de adolescência, baseados na questão norteadora: “Quais as visões do ser adolescente com câncer?”. A última Dinâmica de Criatividade e Sensibilidade denominou-se Chuva de Palavras (ANEXO D), em que cada adolescente foi convidado a refletir sobre a frase geradora “Corporeidade do ser adolescente com câncer”; após, deviam apresentar as palavras que surgiram acerca da frase central, escrevendo-as em uma folha de papel e explanando-as, com a finalidade de compartilhar seus conhecimentos sobre a temática com os demais presentes. Assim, constituíram-se as dinâmicas de Criatividade e Sensibilidade durante as quais as informações foram apresentadas ao grande grupo, iniciando-se as discussões, a troca de experiências e a construção coletiva do conhecimento. Esses momentos foram registrados e observados pela pesquisadora com o auxílio do gravador de áudio, da observação e das descrições por escrito. Ao término de cada uma dessas atividades, realizou-se uma avaliação grupal. 4.5 INTERPRETAÇÃO DAS INFORMAÇÕES Para este estudo, optou-se pela utilização da hermenêutica como método de interpretação das informações, o qual visa a compreender o sentido do ser a partir da sua expressão no mundo. A palavra hermenêutica vem do grego e significa “expressar e interpretar”, podendo ser definida como a teoria da interpretação do sentido (MOTTA, 1997). 35 O principal objetivo, ao utilizar-se a hermenêutica, é a expressão e interpretação dos sentimentos, medos e alegrias presentes no decorrer de cada dinâmica, de cada conversa com os adolescentes com câncer, ou seja, apreender a experiência vivida em sua integralidade. Assim, de acordo com Ricoeur (1990), a interpretação pauta-se no sentido e não na análise das significações, objetivando-se ir além da linguagem. Essa abordagem divide-se em cinco fases, na perspectiva de Paul Ricouer, com base em Coelho (2011): 1. Leitura inicial do texto: caracteriza-se pelo primeiro contato com as transcrições das informações coletadas pelo Método Criativo Sensível e Diário de Campo, visando a compreender os significados iniciais referentes aos adolescentes com câncer. 2. Distanciamento: configura condição primordial para interpretação, no qual o pesquisador procura abster-se de suas crenças e/ou preconceitos, com o intuito de deixar a palavra falar. Acredita-se que o pesquisador precisa se tornar reflexivo, a partir da escuta do texto, para aprofundar sua compreensão. Esta etapa configura-se como a mais complexa, pois à medida que o pesquisador se insere no mundo dos informantes, torna-se um desafio ingressar no mundo de suas significações (COELHO, 2011). O distanciamento serve para explicar, não só com o intuito de dizer algo, mas de racionalizar e clarificar algo, mantendo a visão do pesquisador afastada. 3. Interpretação: a (re) leitura profunda e crítica nesta etapa, levando à explicação, à compreensão e à interpretação do que emergiu da leitura inicial, buscando-se o significado do que estava oculto nos discursos – o dito, pelo não dito. A interpretação somente fica viável após o aprofundamento da semântica. A hermenêutica considera a frase uma unidade de análise, passando, a seguir, para o parágrafo, a seção, o capítulo e, finalmente, para o texto como um todo. O significado é representado em unidades de sentença (RICOEUR, 1990). Busca-se, nesta etapa, reavivar, tematizar e compreender os significados que emergirão das dinâmicas a serem realizadas (COELHO, 2011). 4. Identificação da metáfora: esta etapa produziu a interpretação hermenêutica, ou seja, o que está oculto nos discursos. Assim, após se obterem as dimensões e subdimensões, fez-se a compreensão destas, o que recebeu o nome de metáfora. A interpretação hermenêutica é um discurso dialogado entre o texto em sua progressão e o significado e a referência contextual da pesquisa. Portanto, esta fase é definida como contextual, ou seja, criação momentânea da linguagem, gerando novo significado (MOTTA, 1997). 5. Apropriação: última etapa da interpretação hermenêutica, na qual o sentido dos discursos, antes obscuros, passou à frente do texto, tornando-se o sentido mais visível. O termo apropriação significa estar apto para compreensão da metáfora do mundo do texto e do 36 conjunto de imagens projetadas na frente do texto, estando assim o pesquisador apto para compreender e revelar a nova compreensão referente ao estudo realizado (COELHO, 2011). 4.6 ASPECTOS ÉTICOS A pesquisa foi aprovada pela Banca de Qualificação, em janeiro de 2012. Posteriormente, foi encaminhada à COMPESQ – Comissão de Pesquisa da Escola de Enfermagem da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), sendo aprovada (ANEXO E) e a seguir apresentada ao Serviço de Enfermagem Pediátrica e ao Serviço de Oncologia Pediátrica do Hospital das Clínicas de Porto Alegre, que autorizou a sua realização. A mesma foi encaminhada ao Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, onde foi aprovada conforme Resolução do Conselho Nacional de Saúde, sob o número 02051312.3.0000.5327 (ANEXO F). O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido foi assinado pela pesquisadora e pelos informantes do projeto e seus responsáveis, de acordo com as Diretrizes e Normas Internacionais e Nacionais, especialmente as Resoluções 196/96 e complementares do Conselho Nacional de Saúde. Como medida de segurança, as informações serão guardadas pela pesquisadora por cinco anos, quando então serão destruídas, de acordo com a Lei dos Direitos Autorais 9610/98. Assim, será evitado o extravio ou manuseio desses instrumentos que colocam em risco o anonimato das pessoas que aderiram ao estudo, conforme a Diretrizes e Normas Regulamentadoras de Pesquisa envolvendo seres humanos. Os princípios éticos foram assegurados, bem como a privacidade e o anonimato dos informantes envolvidos na pesquisa. Para tanto, o nome dos adolescentes permanecerão em sigilo e passarão a ser identificados como A1, A2, A3, A4, A5, A6 ficando assegurado que os adolescentes poderiam retirar-se a qualquer momento, sem prejudicar o seu tratamento, pois sua participação é livre e suas dúvidas e anseios são levados em consideração. Como benefício, acredita-se que o convívio, assim como a escuta e o diálogo, constituiu-se em momentos de troca de experiência bastante produtivos para os informantes e para a pesquisadora. O risco foi a possibilidade de mobilização de sentimentos. Entretanto, durante a realização do estudo, não foram necessários encaminhamentos à equipe multidisciplinar por motivo de mobilização de sentimentos. Assim, foram respeitados os princípios éticos e legais e os direitos das pessoas envolvidas para posterior divulgação dos resultados em seminários, congressos, artigos e capítulos de livros. 37 5 RESULTADOS “O verdadeiro mestre é você. Você é quem pode decidir entre tudo aquilo que se apresenta diante de você ao longo do caminho.” (J. Roger) Nessa seção, foi abordado os quatro temas emergidos, adentrando-se no mundo do ser adolescente com câncer, na perspectiva da sexualidade. Os temas referentes à existência dos adolescentes com câncer estão demonstrados na figura a seguir: Figura 1 – Riqueza das informações Imagem corporal e modo de ser no mundo Sexualidade: Limites e Possibilidades Da negação ao aceite Lições de vida: a corporeidade existente Fonte: Elaborada pela autora (2013) 5.1 IMAGEM CORPORAL E MODO DE SER-NO-MUNDO Na adolescência, período caracterizado como repleto de transformações, da passagem do corpo infantil para o adulto, mudanças no campo psíquico-social-fisiológico, o adolescente 38 depara-se com inúmeras inquietações e sentimentos contraditórios, surgindo uma construção contínua na busca de consolidar-se como ser-no-mundo. Cabe ressaltar que construir uma identidade própria não é tarefa fácil. O adolescente que antes tinha uma opinião sobre si formada na infância vê-se envolto de transformações quase que completas, acrescentando muitas impressões que formarão um novo sentido e valor mais pessoal (TIERNO, 2007). Na visão dos adolescentes, “amadurecer” é um ato complicado, pois é o momento de desmistificar suas ações, se ver adulto de uma hora para outra, notar-se como uma peça fundamental no quebra cabeça da sociedade. Os adolescentes passam a descobrir valores, antes obscuros aos seus olhares, revelando preferências pessoais, seguindo suas tendências e influências sociais a que estão submetidos, formando a totalidade dos traços emocionais e de comportamento de um indivíduo: o seu “jeitão” de ser, o seu modo de agir ou sentir as suas emoções. Assim, constrói-se o mundo dos adolescentes, ficando notórias algumas características relacionadas com essa etapa do desenvolvimento humano. Essa fase é cheia de riquezas e conquistas, mas também de dificuldades, pois ocorrem mudanças de nível emocional, como a busca de si mesmo e da identidade adulta. Além disso, a autoafirmação e a onipotência – tudo eu sei – se apresentam nessa etapa assim como a tendência grupal e a necessidade de intelectualizar e fantasiar ideias e emoções (VITALLE, MEDEIROS, 2008). Outras características que se apresentam são as crises religiosas e a deslocação temporal: o que mais existe é o “agora”, não se dando importância ao que certos atos podem influenciar no futuro. Adentra-se, assim, na evolução da sexualidade e do autoerotismo até a heterossexualidade, ou seja, conhecer o próprio corpo e o corpo do outro. Sem falarmos das características que interferem na sociedade, como atitude social reivindicatória, contradições sucessivas em todas as manifestações de conduta, a separação progressiva dos pais, e, por final, as constantes flutuações excessivas de humor e estado de ânimo (VITALLE, MEDEIROS, 2008). A todas essas contradições vivenciadas no processo de conhecimento e amadurecimento pessoal e social, agrega-se a transformação da imagem corporal, ou seja, aceitar no campo psíquico as alterações próprias desta fase da vida, ver-se e aceitar-se como homem e mulher, procurando, muitas vezes, inventar uma nova maneira de ver e viver o mundo que se apresenta. Nesse processo, é feita a substituição dos aspectos da identidade familiar para uma identidade individual, o que se acentua quando essas alterações veem acompanhadas de uma patologia, neste estudo, o câncer. 39 Corroborando esta ideia, Barros (2006) diz que a imagem corporal é um conceito amplo, pois abrange processos fisiológicos, psicológicos e sociais, numa troca contínua entre eles. Tratase de uma experiência vivida a cada instante, nunca unilateral, buscando-se a diversidade de seus aspectos e articulando-se às imagens alheias. Há capacidade de modificação pelas relações externas com o mundo. Representa todo o ser humano, apesar de sempre incompleta, escondendo mistérios numa dimensão paradoxal. Assim, trata-se de reconhecer, ver e sentir que a imagem corporal está presente num simples afeto, na história de vida de cada pessoa, especialmente nos adolescentes, no seu olhar e no seu corpo em movimento, em seus valores, no seu cuidado, enfim em viver. Devido à doença, evidenciam-se particularidades, como relata à adolescente A1: Você se olha no espelho e não é mais a mesma pessoa que você era (A1) Nesse olhar, corroboram-se as falas de Valençal e Germano (2009) que dizem que, ao conhecer as transformações entre a imagem corporal percebida pelo adolescente (como ele se vê), possuída (como ele é) e desejada (como ele queria ser), o profissional de saúde – enfermagem – pode intervir de maneira adequada, buscando compreender/atender suas necessidades para além das transformações físicas, promovendo a satisfação da autoimagem corporal numa abordagem integral do adolescente. Deste modo, o cuidado é uma maneira de ser homem, possui significado a partir do próprio homem. Inclui comportamentos, atitudes, valores e princípios que são vividos cotidianamente pelas pessoas em determinadas circunstâncias, porém, antes de tudo, diz respeito ao ser. (WALDOW, BORGES, 2008, p.2) Assim, cabe ao profissional da enfermagem prestar um cuidado que ampare, suporte e conforte, desenvolvendo o olhar holístico e a atenção humanizada, preservando a autonomia dos adolescentes e sua capacidade de autocuidar. Desta forma, adentrar no mundo dos adolescentes com câncer não é uma tarefa fácil, pois requer uma ampla visão da relação imagem corporal e doença, a fim de compreender como um ser-no-mundo doente percebe sua corporeidade, sua sexualidade. A patologia não é somente um fator físico, mas algo que compõe um todo, corpo, emoções e mente, sendo que esta tríade compõe um único sistema, em que quando um se encontra afetado, os demais também sentiram suas consequências. Frente a isso, aprofundar as questões relacionadas à corporeidade, a partir de um olhar particular, articulando as modificações presentes no processo do adoecimento é de extrema valia. 40 Compreender a corporeidade do ser adolescente com câncer remete a Merleau Ponty (2006) quando diz que ser corpo é estar fixado a um determinado mundo, o corpo não está primeiramente no espaço, ele é no espaço. Ou seja, este adolescente, ao vivenciar uma patologia, deve se readaptar ao seu espaço, reaprender com sua atitude emocional e suas crenças, bem como a sua habilidade e capacidade de resolver os seus problemas emocionais, advindo de inúmeras significações, aparências, medos e revoltas, associados à facticidade existencial da doença. Desta maneira, com base nas concepções de Merleau Ponty (2006), devem-se agregar novas possibilidades para se poder viver a totalidade, dentro do conceito da corporeidade. Constata-se, no olhar do adolescente, essa conceituação de corporeidade. [...] a corporeidade não é apenas as suas expressões físicas, é o seu caráter, tipo o que aparenta para as outras pessoas... é teu jeito de ser... teu jeito de pensar. (A1) Aqui, firma-se que cada indivíduo possui sua história de vida, não sendo apenas um ser biológico, e sim uma pessoa com uma vida cronológica a ser considerada, repleta de aspectos culturais, religiosos e sociais que agregam no seu modo de ser e ver o mundo. Fica visível que estes adolescentes são emersos de muita maturidade, conhecimento e reflexão sobre as suas visões de corpo e mundo, entrelaçando ambos em um simples significado de existência. Essa existência, acompanhada de diferentes significados e sentidos à corporeidade, como apresentam Beltrão, Vasconcelos, Araújo (2011), em que o significado da fé aparece como um meio de enfrentar as dificuldades diárias e reabastecer as energias, pela luta da sobrevivência; reconfortando e dando segurança para conviverem com o câncer. Configurando-se para outro adolescente, quando acrescenta esta dimensão para a corporeidade, dizendo: A corporeidade é importante, principalmente a espiritualidade, onde consegue um apoio, uma fé... para continuar, seguir em frente. (A5) Significação da fé restabelece-se muito acesa no “mundo do câncer”, pois onde há fé, há coragem de acreditar, de vencer, sem qualquer desconfiança, tornando-se uma das formas mais seguras e eficazes para se adquirire forças, sustento em seguir em frente. É nela que se encontra o conforto para as horas difíceis, o alívio nos resultados positivos e a consolação nas dificuldades. 41 Denota-se que a corporeidade é sentida de diferentes maneiras, mas que, por fim, direciona-se a um único ponto: a existência do seu corpo no mundo. Assim, o ser adolescente, longe de seu corpo, não é visto apenas como um fragmento de espaço, mas uma afirmação. Considerando que sem espaço ele não teria corpo (MERLEAU PONTY, 2006), trata-se de pertencer, além dos limites da física e da biologia, de ser compreendido dentro de um processo evolutivo, consciente e transcendente no espaço vivido. Assim, a aparência física e a ampliação do ser corpo no mundo defrontam-se com o mistério do ser, do processo de desabrochamento pessoal, de se tornar compreensível a sua própria experiência, do procurar-se e encontrar-se, formando, assim, o seu autoconhecimento e autoaceitação. Essas transformações foram vivenciadas pelas adolescentes deste estudo: Antes eu me achava feia pra falar bem a verdade, só que assim, depois que eu fiquei doente, como eu era boba, idiota mesmo, como eu me achava feia, agora eu olho as minhas fotos e vejo que eu não era feia, eu não tinha porque me sentir assim, tipo acho que depois de tudo isso eu vou me dar muito mais valor pra mim mesma. (A1) O que eu mais gostava era meu cabelo, só que agora eu não tenho mais, era tudo o que eu tinha, quando começou a cair quase entrei em depressão, só ficava trancada dentro de casa, deitada no quarto, só assistindo TV e chorando. (A3) Nota-se a relação entre mundo e corpo, espaço e tempo, ou seja, a impecável relação entre o mundo imaginável e o vivido, além de perceber a sincronia e a nitidez existente entre os adolescentes e a sua aparência de ser. A partir deste alicerce, aceita-se que cada personalidade tem o seu mundo privado de significações, o que suscita a sua própria história, mesmo quando não se dispõem de subsídios para se explicar as razões de ser de cada um. Assim, ser-no-mundo, conforme as ideias de Merleau Ponty referidas por Matthews (2010) é estar envolvido com o mundo, agindo sobre a própria situação para modificá-la, não apenas como permitir o caráter não escolhido da situação. [...] as ações para modificá-la serão concluídas no futuro; e a sucessão de passado, presente e futuro que dá unidade e direção à vida de alguém. (MATTHEWS, 2010, p.129) Direção essa, que aos olhos dos adolescentes com câncer, subsidia o fato do mascarar, disfarçar as imperfeições provocadas pelo processo do adoecimento e, consequentemente, do tratamento. Assim, o corpo encontra-se engajado em um mundo como um projeto que se 42 desenvolve à medida que o executa, tendo a capacidade de improvisações, adaptação, criatividade, transferindo-se ao mesmo tempo sujeito e objeto (GUIMARÃES; TEIXEIRA, 2010). Fato este relatado pela adolescente A1: Teve uma época que eu estava bem inchada, daí até encontrar uma roupa que eu não ficava com aquela barrigona, aquela coisa inchada, era bem complicado, daí tive que comprar umas roupas, assim, comprar vestido e tal pra não ficar aquela coisa... o meu corpo estava todo deformado. (A1) Nesse sentido, a vulnerabilidade ali existente significa o seu entorno, as mudanças e transformações, considerando suas intervenções diretas ao meio em que está vivenciando, no ser e na concretização da sua liberdade (WALDOW, BORGES, 2008). Em concordância, é a união do corpo e o universo em um processo único. Essa ação transformadora emerge das transformações internas do ser, que acontecem a partir da sua relação com o mundo (TAVARES, 2003). A imagem corporal ampara de modo essencial a individualidade, ou seja, a formação da identidade da pessoa. Parte da continência e consciência que validam a originalidade corporal e o sentido de identidade que são aspectos essenciais (TAVARES, 2003). São as sensações internas e externas da vivência do sujeito combinadas com as significações dessas vivências para esse ser. Estando em constante alteração, pois sofre influência dos estados emocionais, conflitos psíquicos e interação com os outros seres (FREITAS, 2004). Na mesma direção, o câncer pode ocasionar mudanças bastante significativas, entre elas: A implantação de dispositivos invasivos como sondagens, cateteres totalmente implantados ou semi-implantados; alopecia (queda do cabelo); mutilações; a perda de alguns sentidos (p. ex. visão); cicatrizes, dentre outras. Essas mudanças envolvem alterações na imagem, por conseguinte, nos aspectos orgânicos e psicossociais. (OLIVEIRA et al., 2009, p. 285) Nessa mesma perspectiva, Freitas (2004) afirma que a imagem corporal reflete a história de uma vida, o percurso de um corpo cuja percepção se integra e marca a existência do ser-no-mundo a cada instante. Utiliza-se sempre das novas experiências, sendo o resultado do diálogo do homem com o universo. É a vitalidade dos processos inconscientes, a sua experiência do qual marca a sua presença no mundo. Presença esta, que advinda com o processo do adoecimento, é enfrentada de diferentes formas, uma vez que esses adolescentes já possuem um poder de compreensão e uma 43 maturidade. Porém, não esquecendo que os mesmos se encontram nessa fase da vida, em que a imagem corporal por eles percebida, possuída e desejada, transfere-se ao processo “normal” do adolescer. Assim, as alterações ocasionadas por essa patologia não são bem vistas aos olhares desses adolescentes: . [...] é ruim porque tem gurias que já estão acostumadas em cair o cabelo, e eu também já vejo que tem piá que também é acostumado, que eles caem e não ficam assim, tipo triste, abalada, porque eles já foram acostumados, a terem cabelo curto, mas pra mim é diferente, é complicado, né? Eu não gosto muito, porque a minha mãe fala que eu tinha um cabelo bonito, que cabelo cresce, só que demora muito e agora eu vou fazer a quimio vai cair tudo de novo, é complicado. (A3) ...depois que fiz a cirurgia para colocar o cateter, os pontos puxavam, daí eu andava assim sabe (retraída), pois não foi uma cirurgia plástica, era uma cirurgia normal, daí eles cortam, costuram... (A1) Expressões estas, que levam a verificar que o ser adolescente com câncer se vê envolto de um luto ascendente, o qual, com o passar dos dias, a sua imagem corporal vai se distorcendo, fazendo que o mesmo sinta a “perda” de mais um corpo, ou seja, primeiramente o corpo infantil para o adulto, e com a presença da doença oncológica, o detrimento do corpo adulto, devido às alterações presentes e inevitáveis do tratamento. Confirma-se em Souza e Erdmann (2006), embasados em Merleau Ponty, a existência entre a dicotomia do físico e o psíquico, a existência única, no ser humano, de corpo e alma, como situação e necessidade de manter contato com a realidade, e definir suas percepções e subjetividades, contribuindo para a noção de corporeidade e existência do ser humano, pois é na existência que ambos se encontram integrado. Deste modo, o adolescente, por articular sobre seus aspectos corporais, modificações e sentimentos existentes neste processo, demonstra essa relação, associação, passando muitas vezes despercebidos aos seus olhares, mas existente nos seus sentimentos e percepções. Como traz o adolescente A2, ao retratar a impetuosa alteração em seu corpo, em um breve período de tempo. O meu corpo. Antes eu achava melhor, legal, fazia musculação, lutava muay thai, fazia coisa e agora não posso mais, até eu era bem maior do que eu estou agora, daí perdi 14 quilos desde a primeira internação, ou seja, dois meses e meio. (A2) Complementa-se esta fala do adolescente com os ensinamentos de Santin (1993, p. 47), ao retratar que o ser humano sustenta-se nesse “abismo abertos entre dois mundos, 44 aparentemente inconciliáveis e irredutíveis”, sendo que seu corpo lhe garante o apoio ao mundo concreto, e a alma no mundo da espiritualidade. Surge um redimensionamento do olhar ao corpo, na visão e compreensão como ser-no-mundo, dentro de um sistema de produção e relações. Assim, convém enfatizar que cada adolescente em seu processo de viver constrói um mundo de símbolos, valores, práticas e saberes, sendo que a troca mútua e constante de sentimentos, realizada no círculo familiar e na sociedade, condiciona a ideia de que sempre têm-se alguém que possa suavizar o sofrimento e estimular quando não for possível desenvolver atividades, tornando-se um porto seguro nos momentos difíceis. Ao refletir sobre a importância deste cuidado e do seu processo de autoconhecimento e ajuda, encontra-se em Vianna e Crossetti (2004) o seguinte pensamento: repensar os valores, crenças, formas de ver e agir no mundo leva-se a preencher os vazios deixados, o que contribui para que tornemos pessoas felizes, irmanados, integrados e solidários. Com o pensamento destes autores, percebe-se que esses adolescentes, com o passar dos dias de seu tratamento, tornam-se mais responsáveis pela sua recuperação, integrados somente no objetivo de manterem o seu bem-estar. Além disso, há a conscientização de que podem fazer muito mais nesse processo de hospitalização, como relata a adolescente A1: Tem gente que vem falar com a gente, mas ai eles não passaram por o que a gente passou, daí assim não tem o que me falar. Daí assim, eu posso ajudar outras pessoas que começam o tratamento, conversar, explicar o que irá mudar. (A1) Paralelamente a isso, a hospitalização é um processo complicado para qualquer indivíduo, pois provoca o seu afastamento das suas relações sociais, seu estilo de viver a vida. Frente a isso, a estrutura, a organização e a dinâmica do mundo do hospital, está voltada para a manutenção da vida é o centro gerador de toda a ação da equipe de saúde, cuja ação permeada de valores e de conhecimentos técnicocientificos, por vezes, superespecializados, confere-lhe subsídios para diagnosticar, planejar e executar o tratamento ao ser doente. A valorização da vida e o significado do trabalho são os elos que unem os elementos da equipe. Estes aspectos emergem, de forma vigorosa, dos conteúdos vivenciais, revelando a maneira de ser da equipe, no mundo do hospital. (MOTTA, 1997, p.81) A partir daí, os adolescentes são incitados a vivenciarem este mundo totalmente voltado à doença e à cura, (re) construindo esse processo com significativas alterações, dentre 45 elas: alterações em seus aspectos psicológicos e sociais, na sua imagem, emoções, sentimentos, e nos elevados e baixos níveis de ânimo. Beltrão, Vasconcelos, Araújo (2011, p.26) ressalvam que o ambiente hospitalar é um “local assustador [...] determinando o distanciamento de seu ambiente familiar (pais, irmãos, objetos pessoais), a realização de procedimentos dolorosos e a aproximação constante de pessoas estranhas e agentes estressores”. Tal fato confere a necessidade de um olhar sensível por parte dos profissionais da área da saúde para que os mesmos estejam sensibilizados, para entenderem esse momento, além de conhecê-lo a fim de atuar a favor da minimização desse sofrimento. Outro fator que deve ser considerado frente à hospitalização é seu significado de morte. A intensidade do mesmo depende de variáveis como as características da doença e a sua conotação social, a fase do desenvolvimento, as relações com os profissionais, dentre outras (BELTRÃO, VASCONCELOS, ARAÚJO, 2011). Tornar-se imanado que o corpo, neste processo de hospitalização, é produtor de conhecimento, razão, emoção, imaginação e capacidade de (re) criar sua imagem, notando-se que o ser adolescente e sua família se veem num elo de início ao descobrir a doença, mas que não tem um fim determinado, pois tudo se torna novo e assustador. Por meio de meios como a internet, passam a pesquisar, conhecer, esclarecer as suas dúvidas, cooperando em seu tratamento, pois assim já sabem aonde agem, quais os tratamentos possíveis, seus efeitos colaterais, enfim, os adolescentes e seus familiares se veem envoltos nesse elo iniciado, como relatado pelo A1: Quando começou aparecer os sintomas, a minha mãe me falou que tinha pesquisado na internet e tinha dado leucemia, daí eu nem dei bola sabe, que idiotice ficar pesquisando não é nada... mas daí igual eu fui fazer o exame, e confirmou... Daí bah foi um choque, meu Deus, no início eu não sabia nada, era bem ignorante, essa coisa de quimioterapia, tratamento, hoje em dia eu já entendo, porque sou bem metida sabe. (A1) Nesse território, conhecer o íntimo de todos os adolescentes, principalmente os acometidos pela doença oncológica, incluiu não apenas conhecer as suas interações, mas seus medos, anseios e problemas, bem como, as suas crenças e superstições, fatores estes que ajudam o profissional da área da saúde a desenvolver estratégias adequadas para proporcionar um cuidado mais eficaz e humanizado, especialmente no que diz respeito ao processo saúdedoença. Similarmente a isso, o medo é um dos sentimentos que acompanham esses adolescentes no decorrer da sua patologia, como relatam: 46 Daí até hoje a minha mãe briga comigo, ah vamos sair, vamos passear, mas eu tenho medo de passar mal, e isso mudou muito. (A1) Tô batalhando, me vejo um pouco como eu disse meio trancado assim de tudo, ate podia sair mais, mas acabo me privando pra cuidar mais. (A5) No entanto, definir o processo saúde-doença é algo complexo, pois não sabe-se até onde vai a saúde para começar a doença, uma vez que o nosso organismo está sujeito a sofrer inúmeras mudanças decorrentes do dia-a-dia, como nosso estilo de vida, estresse, exercícios físico, entre outros fatores. Segundo Brasil (2001, p.163), “[...] o processo saúde doença é considerado resultante de determinada organização social e influenciado por diversos aspectos que caracterizam a inserção social dos indivíduos e grupos em busca de melhor qualidade de vida”. Nesse sentido, os adolescentes deixam de serem vistos e considerados portadores de uma doença e assim recebem um atendimento humanizado, o qual visa a considerar os determinantes do adoecimento, que podem ser de origem biológica, psicossocial, cultural, socioeconômica ou ambiental. Assim, podem promover a prevenção de doenças e a promoção da saúde. Os olhares desses adolescentes passam a produzir diferentes significações: Hum... deixa ver... sei lá mais acho que tem que ter uma alimentação saudável para tu ter um dia mais produtivo, e mais disposição. (A4) Todavia, pode-se afirmar que o processo saúde-doença gera um grande impacto, manifestando-se de maneira mais evidente quando se trata da sua própria hospitalização, situação essa ainda mais delicada quando o diagnóstico é o câncer devido ao fato de essa patologia apresentar características peculiares, com sintomas de estresse, ansiedade e depressão, além de estar relacionada com a morte, uma das razões para o estresse entre os adolescentes com câncer. Ao mesmo tempo, a aparência, a alteração na função parenteral, os sons do alarme e dos batimentos cardíacos presentes nos monitores também são geradores de estresse. Essa afirmação pode ser visualizada nas falas da adolescente A6: É chato ter isso, não queria ter mais eu tenho. Tudo o que eu fazia, não faço mais nada, agora só casa e hospital, às vezes é meio chato, irrita também, me deixa bastante nervosa. (A6) Frente a tais questões, Merleau Ponty (2006) coloca que o doente tem consciência do espaço corporal como local de sua ação habitual, mas não como ambiente objetivo, seu corpo 47 está à sua disposição como meio de inserção em uma circunvizinhança familiar, mas não como meio de expressão de um pensamento espacial gratuito e livre. Esse fato é percebido nas falas da adolescente A1: Agora com essa doença, pelo menos eu vejo, eu tinha saúde [...], eu tenho que me cuidar, fazer o tratamento, e tudo vai voltar ao normal, eu acho isso, claro que tem um monte de mudanças no corpo, as estrias, por exemplo. (A1) É interessante observar que a doença, assim como a infância e o estado de “primitivo”, é uma forma de existência completa, assim como os procedimentos que ela emprega para substituir as funções normais destruídas por fenômenos patológicos. Não se pode deduzir o normal do patológico, as carências das suplências, por uma simples mudança de sinal (MERLEAU PONTY, 2006). Tais mudanças e alterações nos adolescentes devem ser respeitadas, desde o seu tempo para aceitar as transformações até o entendimento da nova situação em que se encontram. Para isso, necessitam de apoio, orientação, atenção e um cuidado especial, sendo que tais atribuições devem ser realizadas, principalmente, pela equipe de enfermagem, que, por permanecer mais tempo em contato, tem maior possibilidade de estabelecer uma relação que ultrapasse o cuidado físico, proporcionando estratégias de cuidado que favorecem o processo de recuperação. Além disso, o adoecimento do adolescente afeta a família como um todo, trazendo consigo seus anseios, dúvidas, entre outros fatores, pois, principalmente os pais, como cita Franco e Aguillar (2007), acostumados a desempenhar as funções de educadores, protetores e responsáveis, passam por uma mudança significativa de suas funções, já que a partir do momento da hospitalização é a instituição que se detém de tais cuidados. Aos pais, resta-lhes se adaptarem a essa nova rotina, repleta de normas, aguardando orientações sobre procedimentos, prognóstico e de como poderão participar do tratamento e o que se espera deles em relação ao adolescente. A partir de um novo olhar em que para a equipe de saúde cada família é única, possui a sua própria história, o profissional a reconstrói a todo o instante, oferecendo um cuidado individualizado, compreendendo, apoiando, subsidiando ações biopsicossociais que amenizam o sofrimento em um momento crucial da vida desses sujeitos, a fim de alcançar a sua excelência (BELTRÃO, VASCONCELOS, ARAÚJO, 2011). Neste sentido, pode-se perceber a importância do ser adolescente no processo de cuidar e principalmente a sua 48 valorização pela equipe de saúde, pois, há a necessidade de uma interação não só entre a equipe e o adolescente hospitalizado, mas entre todos os envolvidos, ou seja, família/adolescente; família/equipe de saúde; família/instituição hospitalar; equipe de saúde/instituição hospitalar; equipe de saúde/adolescente. Desta forma, intensifica-se a expectativa quanto aos papéis, deveres, responsabilidades para o tratamento e recuperação do ser adolescente hospitalizado, consolidando seu corpo e saúde. Em síntese, por detrás de cada decisão, de cada comportamento, de cada ato de vontade, de cada sonho e conduta de um ser adolescente, encontra-se a sua convicção interior, suas preferências, ou seja, esses jovens denotam importância ao que é realmente importante. 5.2 SEXUALIDADE: LIMITES E POSSIBILIDADES Adentra-se, no mundo da sexualidade deste ser-no-mundo, com embasamento em Merleau Ponty (2006), que diz que esse aparato sexual percorre a corrente geral da vida. Ou seja, a sexualidade deve ser notada, sentida e trabalhada, saindo da invisibilidade dentre os adolescentes com câncer, transferindo para ali uma acepção especial. Isto acontece no sentido de trazerem reflexões que induzam à transferência da invisibilidade para uma prática diária, aberta e transparente, entre adolescentes e profissionais da área da saúde. A sexualidade dos adolescentes acometidos pela doença oncológica, muitas vezes, os coloca em situações que exigem uma nova ressignificação das maneiras de viver, sendo, ao mesmo tempo, um grande desafio atender as questões relacionadas a essa temática por conta dos duelos entre a razão e a emoção, a vontade e o medo, a capacidade de recriar um novo mundo, uma nova imagem. Paralelamente a isso, desenvolver um trabalho junto aos adolescentes com câncer remete-se a um desafio: por muitos estarem cada vez mais desinformados sobre seu corpo, suas mudanças físicas e psicológicas e também devido à sua personalidade, surgem dificuldades no exercer de uma sexualidade tranquila, o que pode originar consequências desagradáveis no decorrer da existência. Tal situação remete aos ensinamentos de Merleau Ponty (2006) quando se refere à sexualidade como centro da existência humana, porque é na experiência sexual que se encontra a oportunidade de familiarizar-se com o ser, em seus aspectos gerais de autonomia e dependência. A sexualidade é de fundamental importância para o desenvolvimento da personalidade do adolescente, ou seja, é algo que se constrói, podendo, assim, interferir no seu processo de aprendizagem, na saúde mental e psicológica. É essencial reconhecer que os adolescentes são um grupo em si, constituindo cidadãos com direitos específicos, que vivem 49 uma fase de desenvolvimento extraordinária, que determina suas vidas adultas (UNICEF 2011). Observar-se que os adolescentes precisam de uma orientação sexual adequada, que os ensine a respeitar a si próprios para posteriormente respeitar o outro ser semelhante. Nesse aspecto, é preciso trabalhar de forma a fazer com que se entenda e que seja transmitido de modo correto e esclarecedor todo e qualquer assunto que diz respeito à sexualidade, em todos os sentidos. Assim, os adolescentes se sentirão valorizados em sua plenitude, notando que, apesar da patologia – câncer – existe um ser que pode e deve sonhar, viver e sentir a sua sexualidade, o que visualiza-se nas falas do A4: ... é uma pergunta meio sei lá, tranquilo, sou muito convencido, vaidoso, mas não chego a ser tanto para virar para o outro lado (risos), sou um homem moderno, uso creme nos cabelos, desodorante perfumado, homem moderno, uma aparência legal. (A4) Nota-se nessa fala que a sexualidade é apenas uma parte da personalidade deste ser, em que o toque, as carícias e sua autoimagem, juntamente com uma comunicação aberta e a intimidade de si próprio revelada. Isso demonstra essa maturidade da combinação de sentimentos, atitudes e comportamentos que expressam o fato de ser a plenitude de sua corporeidade. A educação sexual livre de preconceitos, mitos e tabus é imprescindível. Porém, apesar do inquestionável avanço nas ideias, ainda há alguns conceitos retrógrados. O principal objetivo é não apenas a informação, mas também a formação integral do adolescente, capaz de transformar os valores sociais e culturais ligados à sexualidade de forma construtiva. Observa-se que isto ocorre pelo fato de que a sexualidade continua a ser tratada de um modo errôneo, em virtude dos preconceitos que ainda existem em nosso meio social, sejam eles religiosos, educativos, culturais, políticos ou sociais. Em outras palavras, a sexualidade muitas vezes é tratada somente pelos fatores biológicos, esquecendo-se de todos os outros fatores influentes. A sociedade impõe às pessoas que vivam sua sexualidade segundo normas, valores e regras construídas ao longo do processo histórico-cultural (JESUS, 2000). Esta definição também é visualizada por uma das adolescentes, a qual define esse autoconceito: A sexualidade vai muito da criação, assim a minha mãe sempre se guardou sabe, e a minha tia desde 12 anos, pulava a janela, para ir dormir na casa de homem, era bem complicada, e as filhas delas são bem assim, começaram a namorar com 15 anos, e a mãe delas deixa fazer de tudo, explica aquelas coisas sem vergonha (risos), bem assim sabe... (A1) 50 Frente a tais questões, percebe-se que os adolescentes vivem e recriam conceitos e histórias, formulando atuações planejadas, sistemáticas e transformadoras sobre o que é a sua sexualidade, visando ao seu bem-estar sexual a partir de valores baseados nas suas crenças familiares e seus estilos de vida. Paralelamente a isso, nas suas representações sociais, a sexualidade é uma parte integrante da originalidade de cada pessoa, é uma característica dessa identidade e está unificada no autoconceito, portanto na imagem corporal. Autoconceito implica em se discutir a respeito da saúde sexual do indivíduo no que diz respeito à qualidade das relações sexuais de homens e mulheres. Essas relações estão presentes nas trocas corporais, no prazer, erotismo e nas sensações vindas do corpo, experiências afetivas e as práticas sexuais, lembrando-se que a sexualidade é um processo construído e reconstruído na infância e na adolescência e durante toda a existência (RAMOS et al., 2001). Não existe uma definição para sexualidade que abranja todas as práticas sexuais das pessoas e nem uma diferenciação existente, uma verdade absoluta sobre o que é certo ou errado a respeito de sexo e sexualidade (BRASIL, 2006). Neste sentido, quando se aborda sexualidade com os adolescentes, neste caso, os acometidos com câncer observam-se uma infinidade de ideias, perturbações, inquietações, expectativas e dúvidas manifestadas ao longo da vida. As ideias da adolescente A1 revelam que, para vivenciar a sua sexualidade, ela encontrou mecanismos para suavizar os efeitos gerados pela doença e, assim, sentir-se igual às outras adolescentes da sua idade: Quando eu coloco a minha peruca não me sinto assim tão diferente, me sinto mais igual [...], saio, me divirto, tomo sorvete e ninguém me incomoda. (A1) A constante preocupação das pessoas com a própria imagem é notória, o que pode gerar frustração, caso essa imagem não corresponda aos padrões considerados ideais (OLIVEIRA et al., 2010). Assim, a imagem corporal é o ponto principal para o seu autoconhecimento e está intimamente ligada ao seu senso de valorização, de sentir-se bem e ser aceita perante a sociedade, influenciando, deste modo, na sua sexualidade. Assim, família e equipe de saúde, ao compreenderem e apoiarem esses adolescentes, subsidiam ações biopsicossociais que amenizam o sofrimento, fazendo com que esses adolescentes reformulem razões para viverem seus sentimentos e suas emoções, sem medo ou privações. 51 Ao refletir sobre o assunto, Heilborn (2012) diz que a sexualidade deve ser entendida como um dos principais domínios que incitam os adolescentes a criarem uma esfera de autonomia individual, o que ocorre, sobretudo, pela passagem à sexualidade com parceiro. Na mesma direção, os adolescentes devem ser tratados como seres holísticos, com seus múltiplos processos interdependentes, com pensamentos e atitudes próprias. Sonhos e desejos, guardados muitas vezes, a sete chaves, como expõe a adolescente A1: Não sei se você vai achar estranho, mas eu penso de me guardar pro meu casamento, eu não sei se isso vai acontecer e tal, mas é um sonho meu, sabe, eu acho lindo, eu quero que seja assim. (A1) A sexualidade deve ser abordada com sinceridade, naturalidade e veracidade para que possa ser separada dos caminhos errôneos e, principalmente, dar ênfase às necessidades de cada adolescente, sendo elas curiosidade, ansiedade, medo, entre outras. É preciso considerar também que junto com todas as transformações próprias dessa fase da vida, existe uma patologia, que se reveste de alterações próprias e infinitas de sentimentos. Como a identidade e a imagem corporal estão intimamente ligadas à sexualidade, esta também pode ser extinta nos olhares dos adolescentes, como narra a adolescente A3, ao não sentir a sua sexualidade: Eu não me sinto muito atraente. (A3) Com base nessa consideração, verifica-se que, além das alterações físicas, a doença – neste caso, o câncer – impõe sentimentos e mudanças, sendo necessário que a imagem corporal seja reconstruída, para que o sujeito se sinta bem consigo mesmo, resgatando o seu gosto por viver, sua capacidade de se sentir atraente e pleno na sua sexualidade. Porém, sabese que esses não são elementos fáceis de serem trabalhados dentro de “si”, deste ser-no-mundo, pois há uma doença por trás de todas essas transformações, anulando este “ser” a sua sexualidade, como expõe a A6: Não sei, nem penso nisso, não tenho sexualidade. (A6) Nesse aspecto, Merleau Ponty (2006), ao abordar a questão da doença e sexualidade, contemporiza o desaparecimento no ser doente do poder de desenhar diante de si um mundo sexual, de colocar-se em condição erótica ou, uma vez esquematizada a situação, de mantê-la 52 ou de dar-lhe uma sequência até a satisfação. Num sentido mais genérico, é perceptível que os adolescentes acometidos pelo câncer lidam com uma propensão na sua autoestima, na valorização da sua imagem corporal, subestimando a sua sexualidade em virtude dos julgamentos dos outros e do seu autojulgamento, por não visualizarem um mundo ou alternativas melhores a sua frente. Deste modo, as orientações relacionadas com a sexualidade devem emergir num mar de confiança e respeito, pois as mesmas interferem significativamente na vida desses adolescentes por estarem imersos na luz da estruturação e da história particular de cada família, dentro de um pano de fundo que a realidade social constitui. Esse fato apresenta-se nas falas dos adolescentes A1 e A5, ao perderem em algum período do tratamento a ostentação de serem adolescentes: No início do tratamento eu fiquei bem jogada sabe, não queria me arrumar sabe, pois ninguém vai querer me ver, ninguém vai se importar se eu me arrumar daí eu ficava só deitada, e não me cuidava mais... daí, com o tempo, voltou a minha vaidade. (A1) Agora, por causa do tratamento, fico mais em casa, não saio tanto... conhecer meninas, daí isso tá meio ruim, meio trancado, isolado. (A5) Paralelamente a isso, Hughes (2000) e Gilbert, Ussher, Perz (2010) dizem que os adolescentes, ao vivenciarem uma doença oncológica em suas vidas, interrompem sua frequência sexual, diminuem o contato físico, afeto, advindo nos parceiros sentimentos de ansiedade, depressão, ou mesmo o distanciamento do emocional. Mas não se pode deixar de citar que a sexualidade/intimidade pode vir ao encontro de tornar esse processo patológico mais suportável e proporcionar uma recuperação mais bem assistida: ... agora eu tô ficando por enquanto, ele sabe que eu tenho, ele me entende, se eu não quero aquelas coisas ele entende, ele não força, pra mim é muito bom, um companheiro, sendo que faz apenas dois meses. (A3) Acredita-se que o segredo para expressar adequados sentimentos em relação a si mesmo está em focalizar os movimentos de caráter prático e minimizar as consequências do câncer na sua vida – aparência, bem-estar, imagem corporal, energia para viver – construindo um elo de pontos atraentes e criando uma imagem que evidencia a sua recuperação e saúde. Todavia, é necessário devolver a esses adolescentes a vontade de viver a sua sexualidade plena na construção da sua corporeidade, enfocando o enfrentamento das mudanças na sua aparência física, combatendo sentimentos de negativismo, enfrentando os efeitos colaterais 53 que os tratamentos provocam, reconstruindo a sua imagem corporal, enfim, recuperando o interesse em viver. Tipo eu nunca quis namorar, já fiquei, já conheci outras pessoas, mas namorar sério, eu nunca quis, pois eu penso em outras coisas, tipo estudar, não ficar dependendo de homem, sabe?! (A1) Assim, no processo de cuidar, é necessário focalizar para o adolescente e sua família as transformações que ocorrem em seu corpo, as sensações sexuais, o caráter normal da masturbação, da curiosidade sexual, do tamanho dos órgãos genitais e sobre o ato sexual propriamente dito e suas consequências. É preciso enfatizar que o ato sexual envolve duas pessoas de caráter íntimo e privado e que ambas têm que estar de acordo com o que está sendo feito e, portanto, prontas para assumir as responsabilidades advindas deste. No caso de adolescentes que já tenham atividade sexual genital, ou estejam prestes a iniciá-la, deve-se orientá-los quanto à anticoncepção e prevenção de doenças sexualmente transmissíveis. Embora alguns adolescentes apontem seus limites e medos, eles reconhecem que existem possibilidades de serem felizes, de sonharem, superando os desafios impostos diariamente para viverem da melhor forma possível. Trata-se de enfrentar essa doença – o câncer – de cabeça erguida, conforme mostra o trecho a seguir: Eu me sinto feliz quando coloco a minha peruca, me sinto bonita. (A1) Assim, pode-se dizer, com base em Rodrigues et al. (2011), que a sexualidade na fase da adolescência e juventude depende, inexoravelmente, da forma com que os adolescentes enfrentam a vivência de sua patologia, de como conseguem lidar com os limites impostos, e da capacidade de percepção das possibilidades que os mesmos podem desenvolver-se com a adaptação à nova realidade de saúde imposta na sua vida. Frente a tais questões, ações planejadas, sistemáticas e transformadoras, visando à promoção do bem-estar sexual, a partir de valores baseados nos direitos humanos e relacionamentos de igualdade e respeito entre as pessoas, são estruturas bases para se desenvolver um cuidado junto aos adolescentes com câncer. 5.3 DA NEGAÇÃO AO ACEITE Na vida dos adolescentes acometidos pelo câncer, sentimentos de impotência e sofrimento estão intimamente relacionados ao processo do adoecimento, passando por 54 momentos de negação, revolta – preconceito, negociação consigo mesmo – se autoaceitar e aceitação. Os adolescentes, ao não passarem por essas fases de maneira linear, podem ir e vir, estacionar em uma delas, ou superar todas as fases de maneira rápida até a aceitação. Enfim, para nada há uma regra, tudo depende do histórico de experiências desse adolescente, suas crenças e sua maneira de ver esse novo mundo que se apresenta, como demonstra a adolescente A6: Isso é uma experiência, mas que pra mim já está enchendo o saco, não considero mais experiência, porque eu não aguento mais, sendo que já faz quatro meses que estou em tratamento, e tô cansada. A minha vida já não tem sentido. (A6) Nota-se que esta fase tão tumultuada da vida dos adolescentes representa conhecer, descobrir e desvendar o mundo em que eles estão inseridos, buscando compreender o que se passa em cada “mundo individual”, as diferentes formas que encontram para superar seus limites, resgatar as forças e buscar soluções. Assim, não é possível falar de doença sem compreender o “processo do adoecimento como resultado do desequilíbrio entre as influências ambientais, os modos de vida e os diversos componentes da natureza humana’’ (FIGUEIREDO et al., 2009, p. 5). Os corpos, embora silenciosos, emitem mensagens acerca de seus valores, emoções, sentimentos, preconceitos, agrados e desagrados, expectativas, medos e inseguranças. Eles revelam uma vivência singular que, ao se entregar aos cuidados dos profissionais da área da saúde, muitas vezes, perdem sua identidade única, porque os generalizamos, condenando- os a uma passividade nas relações, reduzindo- os a um número, a um caso clínico, a uma ferida, a uma lesão (RESSEL, SILVA, 2001). Estes elementos despertam ansiedades e, ao mesmo tempo, sentimentos de aflição e dúvida, pois, devido à situação a que estão expostos, com o afastamento de seu círculo de amigos pelos diferentes motivos de neoplasias, os adolescentes esperam respostas, muitas vezes, irrespondíveis, adentrando-se ali no mundo da revolta, como visualizados nas falas a seguir: Eu sempre perguntava pra Deus porque eu? (A1) Eu fiquei meio abalado no começo, mas depois eu aceitei... no início não aceitei muito bem, mas depois, tipo agora que deu a recidiva fiquei mais abalado. Eu comecei a lutar – esporte – daí ia começar a treinar para torneio, daí veio à doença e acabou. (A2) 55 Nessas oportunidades, percebe-se, de acordo Ressel e Silva (2001), que o corpo é um centro de informações e assim como ele comunica informações específicas dos indivíduos (como crenças, valores, personalidade...), ele permite uma autoavaliação constante e um autoconhecimento dinâmico e contínuo. Ademais, adentra-se nesse mundo de negação e aceitação, o preconceito, como ratifica o A4: Pela cicatriz... eu vejo que as pessoas tem assim aquele olhar de preconceito, não sei, de insegurança, que não conhecem, assim do tipo tem medo do desconhecido, tipo como fobia, tipo assim, daí eu me sinto assim eu pouco ah sei lá, parece preconceito, as pessoas te olham diferente, mas eu aprendi meio que deixar de lado, não do muita bola, as pessoas não conhecem, fazer o quê? (A4) Nesse aspecto, os sinais do corpo são, muitas vezes, carregados de preconceitos e preocupações. Na fala do adolescente acima, constata-se, que ele era desprezado, causandolhe desagrado e desconforto por atravessar situações que fugiam do seu alcance pessoal por conta de isso estar contra os seus princípios. Cabe salientar que os sinais do corpo falam muito da essência de cada ser humano, numa linguagem silenciosa, cheia de mensagens. Estes sinais permitem um autoconhecimento e uma reavaliação constante do significado de viver e, através da revisão dos gestos, expressões, postura, olhar e características pessoais, as pessoas podem reaprender continuamente a ver, a sentir, a ouvir e a expressar, melhorando seu modo de viver (RESSEL, SILVA, 2001). O que acontece é que muitos adolescentes se veem perdidos no seu modo de existir ao vivenciarem o preconceito, como relata A1: As pessoas têm pena, sabe, e poucos são preocupados contigo, o resto são tudo curiosos, eu acho isso, não sei, são poucas as pessoas que vem mesmo pra te ajudar, pra conversar, assim eu perdi muitos amigos sabe, pessoas que hoje nem falam, nem perguntam como eu tô e tal, e o resto quando perguntam é só curioso, sabe? (A1) Em consonância, temos a fala do A2: Hum... no primeiro tratamento meus amigos se afastaram, não tenho mais contato com nenhum. Mas agora no segundo não, tenho contato com todos, eles vão lá em casa. (A2) 56 Sendo assim, ações de cuidado para além da técnica favorecem o aspecto afetivo, proporcionam um bem-estar maior, o qual alcança todos os envolvidos. Sua construção é moldada no saber, no acolher, fazendo parte deste cuidado sensível, encorajando os adolescentes a também participarem desta nova fórmula de cuidar e demonstrar esse carinho para consigo mesmos e com os outros. Em vista disso e com base em Merleau Ponty, verifica-se que os seres humanos são sujeitos incorporados, nos quais a corporeidade estabelece raízes com o mundo material. Assim, percebem o mundo de algum ponto e momento, cujo entendimento racional é limitado por circunstâncias vivenciais (MATTHEWS, 2010). Tal abordagem favorece o entendimento do adolescente que, em sua singularidade, torna-se um ser complexo e, por isso, deve ser compreendido como um ser que integra o universo e interage com todos os elementos que o compõe. Além disso, sinaliza-se uma atuação eficaz do profissional da saúde – enfermagem – a partir de estratégias que favoreçam a integração, aproximação, a fim de identificarem as reais necessidades e ajudar os adolescentes a descobrir as suas potencialidades para superar o adoecimento (FIGUEIREDO, et al., 2009). Nessa acepção, os adolescentes redescobrem o sentido de viver, de se sentirem corpos nesse mundo em transformação, reencontrando-se em alternativas que lhe tragam felicidade e bem-estar, passando a adotar novas condutas, como se vê na fala do adolescente A1: Daí agora eu pergunto pra quê? Pra que serviu tudo isso, eu penso que deva ser pra ajudar outras pessoas. Não adianta eu querer ajudar outras pessoas, sem saber o que se passa, senti o que ela sentiu... daí assim eu posso ajudar outras pessoas que começam o tratamento, conversar, explicar o que irá mudar. (A1) O afeto, a paciência, a dedicação, o amor, a tranquilidade, o carinho e a proteção são instrumentos que os profissionais da área da saúde podem fazer uso, como processo de cuidar ou de aperfeiçoar o cuidado, tornando-se mais efetivo e participativo, pois, de acordo com Vianna e Crossetti (2004), quanto mais alta a frequência de vibração dos pensamentos e emoções for gerada, maior bem-estar as pessoas que ali estão perceberão. De acordo com Lourenço e Neves (2008), o profissional da saúde, ao ter consciência dos sentimentos que envolvem as suas ações, age responsabilidade pelo próprio crescimento pessoal e profissional. Assim, conhecer e valorizar a autoestima implica em cuidar, o que segundo esses autores significa compreensão, amor, entrega: é o sorriso, o toque com carinho, 57 é o abraço na hora certa, a palavra dita no momento mais necessário, é despir-se de preconceitos, ter paciência e respeito pelo outro. Assim, Merleau Ponty (2006) nos mostra que no próprio instante que vivo no mundo, em que me dedico aos meus projetos, a minhas ocupações, a meus amigos, a minhas recordações, posso fechar os olhos, estirar-me, escutar meu sangue que pulsa em meus ouvidos, fundir-me a um prazer ou a uma dor, encerrar-me nesta vida anônima que subtende minha vida pessoal. (MERLEAU PONTY, 2006, p. 227) Em consonância, os profissionais da área da saúde devem proporcionar um ambiente acolhedor, visando, sempre que possível, a um espaço de valorização pessoal, de carinho, respeito, ajuda, de se autovalorizarem e perceberem que são importantes e fundamentais para o sucesso do processo do cuidado e recuperação. Nessa interface, os sinais não verbais do corpo ampliam canais de percepção e proporcionam uma rede de interação, facultando uma vivência mais saudável e, portanto, mais feliz (RESSEL, SILVA, 2001). Assim, um ambiente de cuidado é aquele espaço profissional onde se estabelecem relações profundas e significativas de um ser com o outro; ambiente este onde existe uma atmosfera rica em segurança, respeito, zelo, conhecimento, carinho, afeição, compreensão, tolerância e amor pelas pessoas e pela profissão (LOURENÇO, NEVES, 2008). Favorecer os adolescentes a prestar atenção às mensagens transmitidas pelo seu corpo, estimulando o tocar, olhar para enxergar uma beleza escondida, ouvir com o coração e exercitar uma escuta sensível é desafiar-se diariamente, é achar graça aonde não existe, é se autonegociar para trilhar caminhos diferentes e reaprender a viver. Assim, expõe o A4: Quando eu ia para o colégio careca, desconfiavam o pessoal, ai, daí só uns guris, depois que eu falei, falaram que pensaram que eu estava fazendo moda, raspando a cabeça, e assim a gente vai levando. (A4) Nas entrelinhas dessa fala, é possível perceber que o adolescente deixa passar um sentimento de aceitação, “um propósito de manter a vida e, melhor que isso, libertar-se das suas amarras [...], das condições adversas em que vivia” (TREZZA, SOARES, LEITE, 2009, p.445). Diante disso, ao longo deste processo do adoecimento, atravessando os períodos de negação, revolta, negociação e aceitação, o adolescente acaba percebendo que há possibilidades de cura e recuperação. Porém, para outros, a recidiva da doença desperta novamente este processo do adoecimento, passando-se pelos mesmos momentos, despertando 58 velhas sensações. Porém, a única certeza é de que há possibilidades novamente de sonhar e prosseguir com a vida, pois se pode perder uma batalha, mas não a guerra. 5.4 LIÇÕES DE VIDA: A CORPOREIDADE EXISTENTE A consciência da própria corporeidade, introduzida a sexualidade, constitui elementos essenciais para adentrar no mundo vivido por esses adolescentes, repleto de lições e ensinamentos. O processo de adoecimento e transformação da adolescência requer a superação das condições impostas e a compreensão da sua patologia, para que assim se componha a liberdade desse sujeito, extraindo lições de vida. Dessa forma, traça-se um aprofundamento na compreensão de ser-no-mundo, das experiências e vivências, atraindo esse adolescente para um mundo de ensinamentos. Nessa interface, continuar a vida a partir da experiência faz com que o indivíduo compreenda a doença oncológica, com cautela para que se redimensione o seu modo de serno-mundo sob essa nova perspectiva, buscando-se melhores formas de conviver com as limitações e fortalecendo a sua fé. Desta forma, o adolescente pode compartilhar suas informações e realidades, contando os episódios que aprendeu, relatando a sua história, ajudando a quem passa por experiências semelhantes (TREZZA, SOARES, LEITE, 2009). Ao refletir sobre o assunto, Salci, Marcon (2011) complementa tais ideias, atribuindo um novo significado caracterizado pela inserção de hábitos antes pouco praticados e/ou valorizados em seu cotidiano. Algumas dessas modificações ou pensamentos começam a ter sentido logo após a descoberta da doença, como relata a adolescente A1: Aí eu sempre falei pra Deus, “Ai eu não quero ter uma vida como todo mundo têm”, tipo nasce, cresce, estuda, mal se forma, arruma namorado, casa, tem um monte de filho e fica aquela vidinha. Sabe aquela vidinha, sempre a mesma coisa, que tu enjoa, que tu não é nada na vida, que você está ali só para cuidar daquelas pessoas, crianças, casa, tem um emprego ruim e eu não quero ser uma pessoa assim, eu quero ser diferente, eu sempre converso com Deus... (A1) Nesse depoimento, percebe-se a conexão entre todos os temas anteriormente discutidos – imagem corporal, modo de ser do mundo, sexualidade, negação e aceite da patologia – denotando-se o amadurecimento, a tomada de decisões e, principalmente, o seu papel na sociedade. Assim, constrói-se uma nova maneira de estar no mundo, de pensar, valorizar pequenas coisas – gestos, palavras, expressões – que passavam despercebidas em seus 59 cotidianos, passando a acreditar que tudo isso – patologia – tem um sentido, uma referência, uma causa, uma percepção. Tal percepção, aos olhos de Merleau Ponty (2006, p.6), “é o fundo sobre o qual todos os atos se destacam e ela é pressuposta por eles”. Ou seja, tudo que se vive e se sabe do mundo, é a partir da sua própria visão e experiência como um ser corpóreo, construindo-se, assim, um novo olhar perante as suas vidas, conforme relatos a seguir: ... eu estou passando por isso pra ser mais forte. E se não fosse Ele, eu nem estaria aqui, eu vejo a mão de Deus sempre comigo, muito clara a presença Dele, pois quando eu tô mal, meu, sabe, acontece milagres. (A1) Eu me vejo um pouco mais diferente, não sei se não me senti um pouco mais maduro, com o tratamento... Vida (risos), isso é a vida, é uma lição de vida, um capítulo da minha vida isso aqui, que eu tenho passado cada vez mais. (A4) Ao longo deste processo, a corporeidade existente transforma-se em lições, em propósito de viver, de se conhecer, de enfrentar os conflitos entre razão e emoção, da imaginação à realidade, extraindo disso tudo mais um capítulo da vida, mais uma história escrita sob os olhares da experiência, dos sentimentos e da fé. Diante deste cenário, Merleau Ponty (2006) traça uma reflexão, afirmando que o ser conhece a sua própria existência não por constatação, ou por dedução a partir de uma ideia de si mesmo, mas por um contato direto com ela. O adolescente, ao vivenciar essa fase como um capítulo, uma lição, demonstra a certeza de que isso irá passar, tornando-se um símbolo de determinação para consigo mesmo. Paralelamente a isso, ao refletir sobre a busca incessante pela paz interior e melhor qualidade de vida, o adolescente A5 traz como lição a espiritualidade e a luta, como se pode observar: Na espiritualidade é que se consegue um apoio, uma fé e um apoio nos amigos, nas pessoas que a gente conhece para seguir em frente, acho que seria isso, uma luta, por tudo que eu vivo e pelos meus familiares. (A5) Luta é uma palavra simples, mas com um significado enorme atribuído pelos adolescentes com câncer, como combate corpo a corpo, tornando-se uma disputa consigo mesmo na qual o adolescente se esforça para vencer cada obstáculo, objetivando sonhar e realizar a sua recuperação. Essas afirmações vão ao encontro da literatura, trazida por Trezza, Soares, Leite (2009), em que o processo de vivenciar o câncer é uma resposta à determinada circunstância, sendo desencadeada pela vida que está sendo vivida. Neste processo, os 60 adolescentes necessitam de um respaldo, tanto da equipe de saúde e familiares, como de si próprios ao se posicionarem diante desta facticidade existencial. Deste modo, as interações entre equipe, familiares e adolescentes devem existir para amenizar os efeitos da doença, dos resultados produzidos pela interação entre as corporeidades e a tecnologias inerentes ao cuidado. Assim, o adolescente se vê diante de um novo propósito que é o de manter a vida, libertar-se das amarras, de situações adversas que vivencia. História que o A4 relata sobre um dos efeitos causados pelo tratamento: Eu perdi muitos amigos aqui dentro (hospital), uma hora eu pensava será que está em volta de mim, será que eu sou o centro, será que eu não sou, uma hora você pensa mil e uma coisas e outras horas você não pensa em nada, fica uma mente vazia... vai pensando será que é meu destino ou será que você faz o seu destino. (A4) Diante de tais questões, adentra-se no mundo da corporeidade, ou seja, o modo de ser do homem, reafirmado por Merleau Ponty (2006) que diz que ver-se é ingressar no universo dos seres, é olhar os objetos, é habitá-lo sob o olhar de quem vivencia este universo. Percebe-se que, embora vivenciando uma mesma patologia – câncer – esses adolescentes são marcados pelas diferenças no seu modo de ser-no-mundo, no como retomam suas atividades diárias, no planejamento de um futuro com esperança, e na certeza da cura. Além de reorganizarem suas vidas com novas estratégias, valores, esses jovens atribuem significados aos eventos e suas percepções. Como expõe a A3, ao se considerar uma vencedora nesse mar de incertezas: Sou uma adolescente feliz, já grandinha, com bastante cabeça como dizem, agora penso no tratamento, que eu comecei esse ano... pois sei que eu vou vencer e vou sair dessa, sou uma vencedora. (A3) Desvela-se nessas falas a complexidade e os diferentes momentos vividos pelo adolescente no transcorrer do inevitável tratamento do câncer e da fase da adolescência. Considerando que este processo é marcado por eventos tristes, pelo medo da morte, ressaltase que há também momentos alegres, constantes de energia, força de vontade de tornarem-se vencedores nessa história da vida, o que desperta de um novo ser-no-mundo. Contata-se nessa acepção que muitos adolescentes buscam estratégias que os ajudem nessa nova condição a perceber e sentir a vida. Desta forma, torna-se possível refletir sobre este intrigante processo saúde-doença, na relação entre doença-transformações-adolescência, a qual traz repercussões inesperadas assim como lições de vida no sentido da cumplicidade, 61 da generosidade, e de se pensar nessa corporeidade quando vivenciam a doença e suas interfaces com o cuidado a saúde. 62 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao iniciar essa caminhada, em 2011, não se imaginava o quanto esse tema fosse traduzir de forma tão profunda e sensível o modo de ser do adolescente com câncer. Esse caminho foi traçado com a busca constante por informações sobre a patologia em estudo (o câncer); o processo de adolescer e o eixo principal desta pesquisa: a sexualidade, o que fez deste estudo uma proposta desafiadora. Alguns pontos são importantes de se lembrar, entre eles, o início desse processo, o objetivo que trilhou essa caminhada: conhecer as percepções do ser adolescente com câncer sobre a corporeidade na perspectiva da sexualidade. E, ao final, acredita-se que esse objetivo foi alcançado, pois independentemente do câncer pelo qual esses adolescentes foram acometidos, a sensibilidade, o prazer de ser acariciado e amado estão sempre presentes. Ao perceberem sua autoestima diminuída, os adolescentes encontram apoio e ânimo junto de seus familiares e amigos, os quais transmitem um novo sentido para as suas vidas, conjugado na força, coragem e confiança através de cada experiência. Assim, encaram o medo de frente. Enfatiza-se a utilização do humor para enfrentarem certas situações, principalmente quando se referem à aparência física, cultivando valores mais profundos, com naturalidade e disposição de espírito. Assim, vivenciam a corporeidade como um conjunto de elementos que dá sentido à vida, conforme conceito de Merleau Ponty, demonstrando crescimento pessoal ao conseguirem dar este significado ao conceito da filosofia dirigida neste estudo. Desvela-se a sua sexualidade, por meio, da corporeidade, mesmo frente aos sinais e sintomas da doença, podendo isso ser observado em diferentes situações e expressões, o que comprova que os adolescentes com câncer mantêm dentro de si a essência de serem adolescentes no mundo. Assim, a experiência de ser adolescente com câncer marca um momento importante no ciclo de sua vida, uma vez que este período é repleto de fortes emoções, conflitos e sentimentos, os quais envolvem os caminhos no mundo da vida de diferentes adolescentes, tão similares entre si. Frente a isso, compreender o mundo vivido por esses adolescentes com câncer faz alçar vôos e comprovar que singularidade e cumplicidade andam juntas. Ficando visível ao olhar que o processo de adolescer é um contínuo nascer, transpira o viver, possibilitando as escolhas, as possibilidades de ver, viver e sentir cada etapa dessa transformação, dessa nova realidade que se apresenta. Com base nisso, as relações iniciais são consideradas como sendo o alicerce de todas as relações sociais futuras, sendo que a 63 aproximação com os adolescentes e seus familiares foi significativa e segura, traduzindo-se em momentos de reflexão sobre o seu modo de ver e ser-no-mundo, desafiando a facticidade da doença e elaborando suas próprias conclusões à respeito da sua corporeidade e sexualidade. Assim, a sexualidade pode se camuflar em momentos de revolta e negação, mas nas entre linhas da vida, a mesma está presente, mostra-se na comunicação, na imagem corporal, na vontade de reiniciar a vida, perto de seus amigos e familiares, numa atitude do (a) adolescente em que ele (a) explora mais seus próprios sentimentos e transformações no que tange às suas relações, percebendo a sensibilidade de seu próprio corpo, seus limites e possibilidades. Em outro sentido, os adolescentes participantes da pesquisa estavam vivenciando momentos de recidiva e conhecimento da doença, juntamente com o andamento da sua adolescência. A história de vida de cada um foi repassada em detalhes, por meio da coleta de informações, de maneira criativa e lúdica, utilizando-se como ferramenta as dinâmicas, que propuseram uma reflexão sensível e profunda sobre as suas vidas e a sua sexualidade, o que forneceu elementos concretos para a elaboração da discussão e obtenção dos resultados. As dinâmicas de criatividade e sensibilidade permitiram com que os adolescentes pensassem, imaginassem, conversassem e aprendessem uma nova maneira de ver e viver as suas vidas. Dessa forma, foi possível observar que muitos adolescentes começaram a perder o medo de tocar, conversar, transmitir suas expressões além da relação que criaram, manifestando características, atitudes compreensíveis e aceitáveis para essa fase da vida e da sua sexualidade. Compreender o vivido dos adolescentes com câncer demonstrou a importância que se deve dar aos mesmos por se encontrarem em uma fase com alterações psicológica, sentindose, em alguns momentos, angustiados, não aceitando a realidade. A realização desta pesquisa fez perceber que muitos adolescentes compartilham dos mesmos anseios e dúvidas, independentemente dos locais, culturas e crenças aos quais estavam acostumados. Ao mesmo tempo, a força de vontade e as lições de vida são elementos presentes e essenciais no mundo da vida do ser adolescente com câncer, demonstrando que, mesmo necessitando de independência, os mesmos sentem-se capazes de se autovalorizarem, perfazendo com que se sintam com solicitude e força para ajudar os demais. Desafiam as adversidades impostas pela patologia, valorizando a sua corporeidade e a sua sexualidade, sentindo-se parte do mundo vivido da adolescência. Assim, pode se alcançar uma concepção sobre a corporeidade do ser adolescente com câncer na perspectiva da sua sexualidade, 64 seguindo em frente na busca da sua recuperação, dando estímulos para que se sintam capazes de enfrentar e vencer esta patologia, revivendo as falas e expressões do seu corpo. Teve-se a oportunidade de visualizar como os adolescentes têm de redimensionaremse como seres no mundo,adaptando-se diariamente às transformações existentes e próprias da doença e da fase pela qual estão passando – a adolescência. Dessa forma, foi possível mergulhar nesse mundo, o que desperta para a qualificação do cuidado a esses adolescentes com câncer. Ficando evidente a importância do profissional da área da saúde em abordar o adolescente, como ele é, ou seja, conhecer a etapa do desenvolvimento humano que é o processo de adolescer e utilizando-se dos sentidos para se estabelecer um vínculo de confiança e acolhimento. Frente a isso, valorizar a história de vida e a experiência que cada adolescente traz, sem julgamentos prévios, torna a relação mais segura e eficaz, quando o profissional destina uma atenção especial aos familiares, considerando-se, que muitas vezes, estes são alvos das revoltas e ressentimentos dos adolescentes. Enfim, trata-se de promover o acolhimento, valorizando o modo de ser adolescente. Assim, os profissionais da área da saúde podem estar instrumentalizados para compreender outras maneiras de ver o ser humano, sentir a sua corporeidade. Aliam-se e consolidam-se os objetivos propostos, formando uma grande teia de conhecimento, de troca de experiências, auxiliando no processo de cuidar em relação às informações a respeito de possíveis complicações que esses adolescentes possam vir a sofrer com o tratamento, além de amenizar suas ansiedades e medos. Neste sentido, é possível constatar a importância da presença do profissional enfermeiro na execução dessas atividades, pois, além de proporcionar uma vivência positiva a esses pacientes, incentivando-os a perceberem os benefícios, em relação aos sentimentos, da diminuição da ansiedade, do medo e valorização do ser adolescente, fazem com que os mesmos se sintam mais agregados e reflexivos sobre a sua corporeidade e sexualidade, construindo sonhos e esperanças em que, muitas vezes, apenas o medo predominava. Assim, espera-se ter lançado uma pequena luz para que se descubra como viver a sexualidade, juntamente com a corporeidade nos adolescentes com câncer, na tentativa que resgatem sua vontade de viver, de transformar os obstáculos em degraus na escada da vida, de ultrapassar as barreiras impostas e questionar os tabus impostos pela sociedade. Acredita-se que as informações aqui apresentadas possam trazer contribuições para o aconselhamento, o cuidado e o acolhimento desses adolescentes por parte da equipe de saúde e familiares. Além disso, podem expandir as lições de vida proferidas por esses adolescentes, 65 nas quais a idade pouco ou nada significa perto do amadurecimento, do comprometimento e da vontade de viver e ser feliz. Cabe ressaltar que os adolescentes participantes o fizeram de coração, sem pressão, comparecendo, aceitando e entendendo o principal objetivo, que era, através deste estudo, o de transportar os mesmos para outro mundo, revelando-se como um processo espontâneo e alegre sobre a compreensão existente do seu mundo vivido com câncer. É importante salientar as lacunas existentes em nossa formação profissional como ensinamentos sobre a adolescência e suas intercorrências, o que, muitas vezes, passam desapercebidas nos planos de ensino das universidades, mas que servem como indicativos para novas pesquisas. O aprofundamento desta temática poderia se dar por meio de cursos/projetos de extensão – como, por exemplo, de recreação, informática, acompanhamento pedagógico, equipes que promovam a experiência da alegria como fator potencializador de ações de cuidado –, pois ainda há muito para ser descoberto sobre a adolescência e a sua sexualidade por conta da escassez de estudos a respeito da corporeidade do ser adolescente com câncer. Recomenda-se, assim, outros estudos com foco na adolescência, na sexualidade sob o olhar da corporeidade, considerando-se sua grande abrangência, além de se apresentarem como uma proposta de cuidado voltada para as necessidades peculiares do adolescente. Trata-se de um mundo a ser descoberto, que reserva muitos ensinamentos, questionamentos e aprendizagem nessa fase marcada por transformações corporais, hormonais e comportamentais. Não se pode esquecer de que, na adolescência, ocorrem explosões de emoções, sentimentos e contradições, quando, então, surge a necessidade de se receber e expressar afeto e contato por meio do toque, do abraço, do gesto, da palavra que transmite prazer entre as pessoas. Enfim, chegar até aqui é apropriar-se de um processo entrelaçado, entre a facticidade existencial da doença e o modo de ser do adolescente no mundo, possibilitando tornar visíveis as percepções do ser adolescente com câncer sobre a corporeidade na perspectiva da sexualidade. Isso contribui para a construção de um cuidado sob outros olhares, valorizando a singularidade do modo de ser adolescente com câncer, que a partir de então pode vivenciar um cuidado acolhedor e significativo. E é esta diferença que os adolescentes merecem. 66 REFERÊNCIAS ABRAMOVAY, M.; CASTRO, M.G.; SILVA, L.B da. Juventude e sexualidade. Brasília: UNESCO Brasil, 2004. ALBINI, L.; ABRONICI, L.M. A exploração e alienação do corpo da enfermeira: um estudo fenomenológico. Acta Paulista de Enfermagem, São Paulo, v. 20, n. 3, p. 299-304, 2007. ALMEIDA, A.C.C.H; CENTA, M.L. A família e a educação sexual dos filhos: implicações para a enfermagem. Acta paul. enferm. [online]. 2009, vol.22, n.1, pp. 71-76 AYRES, J.R.C.M. et al. O conceito de vulnerabilidade e as práticas de saúde: novas perspectivas e desafios. In: Czerina, Dina & Freitas, Carlos Machado. Promoção da saúde: conceitos, reflexões tendências. Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 2003. AZEVEDO, C.M.C.; FENTANES, M.R.C.; PEREIRA, N.P.F. O adolescente com câncer estigma social. In: X Congresso Brasileiro de Oncologia Pediátrica. Anais, Salvador, SOBOPE, 2006, p.147. BARROS, D.D. Imagem corporal: a descoberta de si mesmo. Hist Ciênc Saúde 2006;12(2):547-54. BELTRÃO, M.R.L.R.; VASCONCELOS, M.G.L.; ARAUJO, E.C. de. A criança com câncer e a família: contexto, descoberta e ação. In: MALAGUTTI,W. Oncologia Pediátrica; uma abordagem multiprofissional. São Paulo: Martinari, 2011. p. 21-34. BRASIL. Ministério da Saúde. Particularidades do Câncer Infantil. Rio de Janeiro: Instituto Nacional do CâncerINCA. Disponível em: . Acesso em 23 de abril de 2011. BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Política Nacional de promoção da saúde. Textos básicos de saúde. Brasília: Ministério da Saúde, 2006. BRASIL. Gestão Municipal de saúde: textos básicos. Rio de Janeiro. Brasil: Ministério da Saúde, 2001. BRÊTAS, J.R.S.; OHARA, C.V.S.; JARDIM, D; JUNIOR, W.A; OLIVEIRA, JR. Aspectos da sexualidade na adolescência, Ciência & Saúde Coletiva, 2011, 16(7):3221-3228. 67 BRÊTAS, J.R.S. A mudança corporal na adolescência: a grande metamorfose. Temas sobre Desenvolvimento 2004; 12(72):29-38. CABRAL, I. E. Uma abordagem Criativo-Sensível de pesquisar a família. In: ALTHOFF, C. R.; ELSEN, I.; NIETSCHKE, R. G. (organizadores). Pesquisando a família: olhares contemporaneous. Florianópolis: Papa-Livros, 2004. CAMARGO, B. de; KURASHIMA, A.Y. Considerações especiais em oncologia pediátrica. In: CAMARGO, B. de; KURASHIMA, A.Y. (editores). Cuidados paliativos em oncologia pediátrica o cuidar além do curar. São Paulo: Lemar, 2007. p. 25-37. COELHO, D.F. Histórias de Mulheres: encontros e desencontros na Prevenção da Transmissão Vertical.2011. Tese (Doutorado em Enfermagem) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre. 2011. DE VITA, V.; HELLMAM, S.; ROSENBERG, S. (Ed.). Cancer: principles and practice of oncology. 6. ed. Philadelphia: Lippincott – Raven, 2002. FABBRO, M.R.C; MONTRONE, A.V.G, SANTOS. Percepções, conhecimentos e vivências de mulheres com câncer de mama. Rev. enfermagem UERJ, Rio de Janeiro, 16(4):532-7, out/dez, 2008. FRANCO, S.M.C.M; AGUILLAR, O.M. Criança Hospitalizada: compreendendo as necessidades de mães durante a hospitalização. Rev Nursing, São Paulo,v 107,n9, p 1166170, abril 2007. FREITAS, G.G. O Esquema Corporal, a Imagem Corporal, a Consciência Corporal e a Corporeidade. Ijuí: Unijuí, 2004. FIGUEIREDO, N.M.A.; MOREIRA, M.C; MACHADO,W.C.A; SANTOS, I.; CAMARGO, T.C; BRAUNE, M. O corpo sadio que adoece por câncer: um “caranguejo” no corpo. In: Enfermagem Oncológica: conceitos e práticas. 1. ed. São Caetano do Sul, SP: Yendis Editora, 2009. GUARESCHI, A.P.D.F.; PINTO, J.P. O enfermeiro como cuidador na perspectiva da enfermagem pediátrica. Revista Nursing, São Paulo, v.108, n.9, p. 234-237, maio de 2007. GUIMARÃES, A.M.C.; TEIXEIRA, M.B. Experiencing body preparation after death: based on Maurice Merleau- Ponty. Online Brasilian Journal of Nursing,v.9,n.2, 2010. 68 GILBERT, E.; USSHER, J.M.; PERZ, J. Renegotiating sexuality and intimacy in the context of cancer: the experiences of carers. Arch Sex Behav. 2010;39(4): 998-1009. HEILBORN, M.L. Entre as tramas da sexualidade brasileira. Rev Estud Fem., v.14, n.1, p.43-59, 2006. HEILBORN, M.L. Por uma agenda positiva dos direitos sexuais da adolescência. Psic Clin, Rio de Janeiro, v 24, n1, p 57-68, 2012. HOSPITAL DE CLINICAS DE PORTO ALEGRE. Institucional/Histórico. Disponível em: . Acesso em 16 de maio de 2011. HOSPITAL DE CLINICAS DE PORTO ALEGRE. Relatório do Serviço de Enfermagem Pediátrica, 2010. HUGHES, M.K. Sexuality and the cancer survivor: a silent coexistence. Cancer Nurs. 2000;23(6):477-82. INCA. Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva. Estimativa 2012: incidência de câncer no Brasil / Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva, Coordenação Geral de Ações Estratégicas, Coordenação de Prevenção e Vigilância. – Rio de Janeiro: Inca, 2011. 118 p. INCA. Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva Estimativa 2010: incidência de câncer no Brasil. Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva. Coordenação Geral de Ações Estratégicas, Coordenação de Prevenção e Vigilância – Rio de Janeiro: INCA, 2009. INCA. Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva. Câncer na criança e no adolescente no Brasil: dados dos registros de base populacional e de mortalidade. Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva. Coordenação Geral de Ações Estratégicas, Coordenação de Prevenção e Vigilância – Rio de Janeiro: INCA, 2008. INCA. Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva. Tipos de Câncer. Disponível, em: . Acesso 2012. 69 ISSI, H.B., SCHENKEL,S.S., LATUADA,V.T.V. Hospitalização da criança e participação da família. In: Programa de Atualização em Enfermagem. Saúde da criança e do adolescente. Porto Alegre/Rio Grande do Sul: Artmed, 2006. p. 31-67. JESUS, M.C.P. Educação sexual e compreensão da sexualidade na perspectiva da enfermagem. In: RAMOS, F.R.S; MONTICELLI, M; NITSCHKE, R.G. Projeto Acolher: encontro da enfermagem com o adolescente brasileiro. ABEN/2000, p. 46-55. KOBAYASHI, S.T. Manual de atenção à saúde do adolescente. Secretaria da Saúde. Coordenação de Desenvolvimento de Programas e Políticas de Saúde-CODEPPS. São Paulo: SMS, 2006. LOPES, E.B. et al. Metodologias para o trabalho educativo com adolescentes. In: ABEN/MS. Adolescer: compreender, atuar, acolher. Brasília: ABEN, 2001. p.141-172. LOURENÇO, E.C.; NEVES, E.P. As necessidades de cuidado e conforto dos visitantes em UTI oncológica: uma proposta fundamentada em dados de pesquisa. Revista Brasileira de Cancerologia, 2008, p. 213- 220. LÚCIO,I.M.L. et al. Diálogo como pressuposto na teoria humanística de enfermagem: relação mãe-enfermeira – recém-nascido. Revista Escola Enfermagem USP. São Paulo, v.42, 2008, p.173-180. MATTHEWS, E. Compreender Merleau-Ponty. Trad. Marcus Penchel. Petrópolis, RJ: Vozes, 2010. MERLEAU- PONTY, M. Fenomenologia da percepção. 3 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2006. MORSE, J.M. Assuntos críticos em los métodos de investigación cualitativa. Bogotá: Contus, 2003. MORETTI,G; GUIMARÃES, R; OLIVEIRA, K.M.; SANJAR, F; VOEGEL, S.R.L. Rhabdomyosarcoma of the head and neck: 24 cases and literature review. Braziliam Journal of Otorhinolaryngology. 76(4) jul/ago.2010,p. 533-37. MOTTA, M.G.C. da. O entrelaçar de mundos: família e hospital. In: ELSEN, I. et al. O viver em família e sua interface com a saúde e a doença. Maringá/ Paraná: Eduem, 2004. p. 153167. 70 MOTTA, M.G.C. da. O ser doente no tríplice mundo da criança, família e hospital. Uma descrição fenomenológica das mudanças existenciais. Tese (Doutorado em Filosofia em Enfermagem). Florianópolis: Programa de Pós-graduação em Enfermagem. Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Ciências da Saúde, 1997. MOTTA, M.G.C. da. O ser doente no tríplice mundo da criança, família e hospital. Uma descrição fenomenológica das mudanças existenciais. Florianópolis: Editora da UFSC, 1998. OLIVEIRA, S.L. Tratado de Metodologia científica: projetos de pesquisas, TGI, TCC, monografias, dissertações e teses. Revisão Maria Aparecida Bessana. São Paulo: Pioneira, 2004, 320p. p. 114-117. OLIVEIRA, C. L.; DE SOUSA, F.P.A.; GARCIA, C.L.; MENDONÇA, M. R. K.; MENEZES, I.R. A.; JUNIOR, F.E.B. Câncer e imagem corporal: perda da identidade feminina. Rev. Rene, vol. 11, Número Especial, 2010. p. 53-60. OLIVEIRA, T.C.; CARVALHO, L.P.; SILVA, M.A. O enfermeiro na atenção à saúde sexual e reprodutiva dos adolescentes. Rev Bras Enferm. 2008;61(3):306-11. OLIVEIRA T; et al. A criança com câncer no hospital. In: Enfermagem Oncológica: conceitos e práticas. 1. ed. São Caetano do Sul, SP: Yendis Editora, 2009. POLAK, Y. N. de S. A corporeidade como resgate do humano na enfermagem. Tese (Doutorado em Enfermagem). Florianópolis: UFSC, 1996. POLIT, D. F.; BECK, C. T.; HUNGLER, B. Essential of nursing research methods, appraisal, and utilization. 5. ed. New York: Lippincott, 2001. RAMOS, F.R.S; PEREIRA, S.M; ROCHA, C.M. Viver e adolescer com qualidade. In: ABEN/Ministério da Saúde. Adolescer: compreender, atuar, acolher. Brasília: ABEN,2001. RESTA, D.G.; MOTTA, M.G.C. da. Compreendendo o Adolescer Empregando o Método Criativo e Sensível: uma possibilidade de pesquisar em enfermagem. Revista Gaúcha de Enfermagem. v.2. nº28, p.283-290, 2007. 71 RESTA, D.G. O adolescer e o cuidado com a saúde: a voz de jovens e familiares. Porto Alegre: UFRGS, 2006.146 f. Dissertação (Mestrado em Enfermagem) – Escola de Enfermagem, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2006. RESSEL, L.B.; SILVA, M.J.P. Reflexões sobre a sexualidade velada no silêncio dos corpos Rev.Esc.Enf. USP, v. 35, n. 2, p. 150-4, jun.2001 RICOUER, P. Interpretações e ideologias. 4. ed. Rio de Janeiro: F. Alves, 1990. RODRIGUES, A.S.; JESUS, M.C.; SILVA, L.S.; OLIVEIRA, J.F.; PAIVA, M.S. Representações sociais de adolescentes e jovens vivendo com HIV acerca da adolescência, sexualidade e AIDS. Rev. Eletr. Enf. [Internet]. 2011 out/dez;13(4):680-7. SALCI, M.A. ; MARCON, S.S. Após o câncer: uma nova maneira de viver a vida. Rev Rene, Fortaleza, 2011 abr/jun; 12(2):374-83. SANTANA, M. T. B. M.; JORGE, M. S. B. Corpo próprio como experiência vivencial da enfermeira no cuidar do outro no processo de morrer. Latino-Americana de Enfermagem, Ribeirão Preto, v.15, n. 3, maio-junho, 2007. SANTIN, S. Corporeidade-Prazer-Jogo: desafio para repensar o projeto antropológico. In: Educação física: da alegria do lúdico à opressão do rendimento. Porto Alegre: EST edições, 2001. SANTIN, S. Em busca da filosofia do corpo. 2. ed. Ver. Ijuí: Ed Unijui, 2003. 168p. Coleção Educação Física. SANTIN, S. Educação Física: uma abordagem filosófica da corporeidade. Porto Alegre: EST 2ª edições, 1993. SCOTT, C. Expressive metaphoras in cancer narratives. Cancer Nurs. 2002 Jun;25(3):230-5 SIQUEIRA, A.B. et al. Relacionamento enfermeiro, paciente e família: fatores comportamentais associados à qualidade da assistência. Arquivo Medicina ABC. São Paulo, 2006. SMELTZER SC, BARE BG. Oncologia: cuidado de enfermagem à pessoa com câncer. In: Smeltzer SC, Bare BG. Tratado de Enfermagem médico-cirúrgico. 9. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2002. p 251-301. 72 SOUSA, D.M; SOARES, E.O; COSTA, K.M.S; PACÍFICO, A.L.C.; PARENTE, A.C.M. A vivência da enfermeira no processo de morte e morrer dos pacientes oncológicos. Rev: Texto & Contexto em Enfermagem, Florianópolis, 2009 jan-mar; 18(1): 41-7. SOUZA, A.B.G.; PANTALEÃO,J. O familiar acompanhante na Unidade de Internação Pediátrica: a opinião do auxiliar de enfermagem. Revista Nursing, São Paulo, v.71, n.7, p. 24-29, abril de 2004. SOUZA, A.I.J.; ERDMANN, A.L. Contribuições para o conhecimento em enfermagem à luz da fenomenologia da percepção de Merleau Ponty. Rev Gaúcha de Enfermagem,v. 27, n.2, junho 2006, p. 166-75. TAVARES, M.C.C. Imagem Corporal: Conceito e Desenvolvimento. Barueri: Manole, 2003. TERRA, M.G.; SILVA, L.C.; CAMPONOGARA, S.; SANTOS, E.K.A.; SOUZA, A.I.J.; ERDMANN, A.L. Na trilha da fenomenologia: um caminho para a pesquisa em enfermagem. Texto &Contexto Enfermagem, 2006, out/dez, 15(4):672-8. TREZZA,M.C.S.F.; SOARES, R.M.S.; LEITE, J.L. A vida antes, durante e depois do câncer. In: Enfermagem Oncológica: conceitos e práticas. 1. ed. São Caetano do Sul, SP: Yendis, 2009. TIERNO, B. A psicologia dos jovens e adolescentes: de 9 a 20 anos. São Paulo: Paulus, 2007. UNICEF. O direito de ser adolescente: oportunidade para reduzir vulnerabilidades e superar desigualdades. Fundo das Nações Unidas para a Infância. Brasília, 2011. VALENÇAL, C.N.; GERMANO, R.M. Percepção da auto-imagem e satisfação corporal em adolescentes: perspectiva do cuidado integral na enfermagem. Rev. Rene. Fortaleza, v. 10, n. 4, p. 173-180, out./dez.2009. VIANNA, A.C.A., CROSSETTI, M.G.O. O movimento entre cuidar e cuidar-se em UTI: uma análise através da Teoria do Cuidado Transpessoal de Watson. Revista Gaúcha de Enfermagem, Porto Alegre, Abril/ 2004, p. 56-69. VITALLE, M.S.S.; MEDEIROS, E.H.G.R. O adolescente. In: PUCCINI, R.F.; HILÁRIO, MOE. Semiologia da criança e do adolescente. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2008. 73 WACHS, F.; MALAVOLTA, M. de A. Pode ser a oficina de corporeidade uma alternativa terapêutica na saúde mental? Boletim da Saúde, Porto Alegre, v. 19, n. 2, jul./dez. 2005. WAGNER, A.; CARPENEDO,C; MELO, L.P; SILVEIRA,P.G. Estratégias de comunicação familiar: a perspectiva dos filhos adolescentes. Psicologia: Reflexão e Critica, 2005;18(2):277-82. WALDOW, V.R. Cuidado Humano: o resgate necessário. 3. ed. Porto Alegre: Sagra Luzzatto, 2001. WALDOW, V.R., BORGES R F. O processo de cuidar sob a perspectiva da vulnerabilidade. Rev Latino-am Enfermagem 2008 julho-agosto; 16(4). 74 APÊNDICE A – DIÁRIO DE CAMPO Ficha de anotações4 Programa de Pós-Graduação em Enfermagem Universidade Federal do Rio Grande do Sul (PPGENF- UFRGS) Oficina nº______ Data:____/_____/2012 Local:______________________________________ Hora início:_______h Término:______h Adolescentes:__________ 1º Momento: preparação do ambiente e acolhimento do grupo ___________________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________ 2º Momento: apresentação dos informantes ___________________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________ __________________________________________________________________________ 3º Momento: explicação da dinâmica e a atividade individual e coletiva ___________________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________ __________________________________________________________________________ 4º Momento: apresentação das produções ___________________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________ __________________________________________________________________________ 5º Momento: análise coletiva e validação das informações ___________________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________ __________________________________________________________________________ Visão da pesquisadora:________________________________________________________ 4 Documento adaptado de RESTA, D.G. O adolescer e o cuidado com a saúde: a voz de jovens e familiares. Porto Alegre: UFRGS, 2006.146 f. Dissertação (Mestrado em Enfermagem) – Escola de Enfermagem, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2006. 75 APÊNDICE B – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO Termo de Consentimento Livre e Esclarecido Programa de Pós-Graduação em Enfermagem Universidade Federal do Rio Grande do Sul (PPGENF – UFRGS) Você está sendo convidado (a) a participar da pesquisa científica do Programa de PósGraduação em Enfermagem, Mestrado Acadêmico da Escola de Enfermagem da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS, intitulada: CORPOREIDADE DO SER ADOLESCENTE COM CÂNCER: NA PERSPECTIVA DA SEXUALIDADE, a qual tem por objetivo conhecer as percepções do ser adolescente com câncer sobre a corporeidade na perspectiva da sexualidade. Assim, firma-se este objetivo pelo mesmo tratar da soma, ou seja, da união de dois conceitos e prol de um objetivo em comum, que é conhecer a visão dos adolescentes sobre seu corpo e a sua sexualidade. O estudo será composto por quatro oficinas, com a utilização do Método Criativo Sensível (MCS), com tempo de aproximadamente 90 minutos, em sala própria. Através de dinâmicas e da sensibilidade, são construídas produções artísticas e discussões sobre o assunto deste estudo que serão registradas em equipamento de áudio (gravador digital) e serão guardadas por 5 anos, sendo destruídas após este período pela pesquisadora. As apresentações artísticas serão registradas em imagem (máquina fotográfica digital) a fim de ilustrar a atividade respeitando os princípios éticos e legais, e os direitos das pessoas envolvidas, para posterior divulgação dos resultados em seminários, congressos, artigos e capítulos de livros. Se você tiver qualquer pergunta antes e/ou durante a pesquisa, sinta-se à vontade para fazê-la. Você poderá solicitar esclarecimentos à pesquisadora, Enfermeira Debora Dalegrave, pelo telefone (55) 96197488 ou pelo endereço eletrônico: debora_dalegrave@yahoo.com.br, sua orientadora, Enfermeira Professora Doutora. Maria Graça Corso da Motta, pelo telefone (51) 3308 5335 endereço eletrônico mottinha@enf.ufrgs.br. Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital de Clinicas de Porto Alegre, (51) 3359 8304. Pelo presente Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, declaro que autorizo a participação de meu filho/paciente sob minha responsabilidade legal nesta pesquisa, pois fui informado, de forma clara e detalhada, sobre o objetivo, justificativa, os procedimentos aos 76 quais serei submetido, os benefícios e possível risco. Fui igualmente informado da garantia de receber esclarecimentos a qualquer dúvida sobre os procedimentos e outros assuntos relacionados à pesquisa; da liberdade de retirar meu consentimento, a qualquer momento, e deixar de participar do estudo, sem que isso traga prejuízo à continuação do cuidado e tratamento do adolescente; da garantia de não haver identificação dos informantes quando da divulgação dos resultados. Após ter sido orientada (o) sobre as etapas da pesquisa, aceito participar da mesma, e declaro estar esclarecida e ter recebido uma cópia deste documento. ______________________________________________________ Nome do Responsável Legal _____________________________________________________ Assinatura do Responsável Legal ______________________________________________________ Nome do Adolescente _______________________________________________________ Assinatura do Adolescente ______________________________________________________ Nome Pesquisadora ______________________________________________________ Assinatura da Pesquisadora . Porto Alegre, ___ de__________ de 2012. 77 APÊNDICE C – IDENTIFICAÇÃO DOS INFORMANTES Programa de Pós-Graduação em Enfermagem Universidade Federal do Rio Grande do Sul (PPGENF- UFRGS) Ficha de identificação Adolescente nº:_________________ Sexo: ( ) Masculino Idade:______ anos Cidade de Origem:___________________________________________________________ Estado:____________________________________________________________________ Escolariedade:______________________________________________________________ Diagnóstico:________________________________________________________________ Motivo da Internação/ Período:_______________________________________________ __________________________________________________________________________ Responsável:_______________________________________________________________ Observação:________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________ __________________________________________________________________________ ( ) Feminino 78 ANEXO A – DINÂMICA DO ESPELHO MENTAL Espelho Mental O coordenador deve organizar os informantes para iniciar a dinâmica, a qual tem por objetivo a tomada de consciência da imagem do seu próprio corpo. Material necessário: folhas de papel, lápis, música. Desenvolvimento: Orientação: 1 – pedir a todos os informantes que andem pela sala ao som da música, seguindo as instruções do coordenador. – andar na ponta dos pés. – andar apoiando o corpo no calcanhar. – andar como se estivesse na chuva. – andar como se estivesse uma superfície quente. – andar como se estivesse passando por uma porta estreita. – andar em câmara lenta. – andar em marcha ré. 2 – Pedir a todos que parem onde estão, fechem os olhos, pensando na parte do seu corpo que acham mais bonita e atrativa e guardando mentalmente essa imagem consigo. 3 – Solicitar a cada participante a se sentar, a pegar sua folha de papel e a procurar esquematizar no papel a imagem captada pelo cérebro. Não colocar o nome. Lembrar que é somente um esquema, e não um desenho artístico. 4 – Pedir para que cada participante vire o esquema para baixo e aguarde. 5 – Quando todos terminarem, pedir para que as folhas circularem, com o esquema para baixo. 6 – Pedir-lhes que parem de passar quando as folhas atingirem a metade do círculo, e que as desvirem. 7 – Cada participante, com uma folha nas mãos, comentará ou mostrará o que a pessoa conseguiu passar de sua imagem mental. Sugestão para reflexão: mudanças físicas da adolescência. Resultados esperados: compreensão dos aspectos anatômicos; possibilidades de avanço no tema com a montagem da história do personagem (quem é, o que faz, o que gostaria que acontecesse na sua vida e família). 79 ANEXO B – DINÂMICA DO TEXTO COLETIVO Dinâmica do Texto Coletivo O coordenador deve organizar os informantes para se sentarem em círculo, distribuir uma folha e um lápis para cada um e orientar como vai ocorrer a dinâmica. Os informantes devem escrever na folha quais as suas percepções a partir de uma questão norteadora que será feita pelo coordenador; então, terão três minutos para realizar a tarefa. Transcorrido o tempo, o coordenador dará um sinal sonoro aos informantes, quando todos deverão passar sua folha para o colega da sua direita e continuar escrevendo até um novo sinal. A brincadeira termina quando cada participante retoma sua folha original. Nesse momento, deverá ser feita a leitura aleatória do material produzido coletivamente. 80 ANEXO C – DINÂMICA DO ADOLESCER Adolescer O coordenador deve organizar os informantes para iniciar a dinâmica, a qual tem por objetivo possibilitar aos jovens uma reflexão sobre como percebem o processo de adolescência. Materiais necessários: aparelho de som, papel, lápis de cor. Desenvolvimento: 1. O coordenador solicitará ao grupo que faça um desenho representando como eles percebem a fase da adolescência. 2. Após a realização dos desenhos, solicitará aos jovens que escrevam sobre: Adolescência é... 3. Cada adolescente irá falar a respeito de seu desenho, relatando como caracterizou a adolescência. Sugestões: – Como o adolescente se percebe? – Como o adolescente é visto pela sociedade? – De que forma o adolescente contribui com as transformações sociais? 81 ANEXO D – DINÂMICA CHUVA DE PALAVRAS Chuva de palavras Inicialmente, os informantes serão convidados a refletir sobre a frase geradora “corporeidade do ser adolescente com câncer”, que será apresentada na forma de cartaz. Posteriormente, serão convidados a apresentar palavras que surgirem acerca da frase central, escrevendo-as em uma folha de papel que será afixada junto ao cartaz. Neste momento, os informantes serão convidados a explanar sobre esta palavra escolhida, com a finalidade de compartilhar seus conhecimentos acerca da temática com os demais presentes. 82 ANEXO E – PARECER DA COMISSÃO DE PESQUISA DA ESCOLA DE ENFERMAGEM DA UFRGS – COMPESQ 83 ANEXO F – PARECER DO COMITE DE ÉTICA DO HOSPITAL DE CLÍNICAS